Em agosto entrou em vigor a nova lei de Saúde Mental: as novidades eram poucas e nem todas eram boas. Tendo sido anunciada “a maior reforma do SNS em 44 anos”, a DECO PROteste espera que não seja mais uma oportunidade perdida para a saúde mental.

A nova Lei da Saúde Mental coloca na equação “uma pessoa de confiança”, transforma o “tratamento compulsivo” em “tratamento involuntário”, limita o internamento do cidadão inimputável e… encerra o capítulo da prevenção e da promoção da saúde.

Esta foi a primeira revisão em 25 anos, e chega-se à conclusão que lei vem, lei vai, mas os cuidados continuam muito aquém do necessário. As novidades da nova lei são poucas e nem todas são boas.

O fim do prolongamento automático do internamento de inimputáveis, por exemplo, seria uma boa medida se, fora da “prisão”, houvesse facilidade em obter apoio social e cuidados de saúde, o que não corresponde à realidade.

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Para onde vão estas pessoas? Que acompanhamento terão? Em teoria, até pode haver respostas. Na prática, existem dúvidas.

Na nova lei, o tratamento compulsivo é substituído por tratamento involuntário e deve ser feito, preferencialmente, em ambulatório. Para além disso, só pode ocorrer nas situações em que o doente representa perigo para si próprio ou para terceiros, e por decisão judicial. Nada contra, desde que, do lado da Justiça, haja capacidade de reação atempada. Acreditamos que haverá?

Ainda assim, importa ressalvar que o tratamento involuntário é uma intervenção de exceção, para os casos em que falhou a assistência psiquiátrica normal.

E é exatamente nesta área que é preciso investir tanto ao nível do tratamento, como da reabilitação e da prevenção.

Os ministros da Saúde vão passando e prometendo, mas o sistema continua carente.

Em Portugal, desespera-se pela generalização das equipas multidisciplinares de saúde mental previstas na reforma dos cuidados – e que deverão incluir um psicólogo e um assistente social.

Estas podem mesmo ser a chave para abrir portas ao tratamento e à prevenção – só é preciso que sejam em número suficiente, bem distribuídas pelo território e ativas na comunidade.

O problema maior desta lei assenta nas suas boas intenções. Infelizmente, todos conhecemos as carências da Saúde e a morosidade da Justiça. A precariedade e intermitência (quando existem) das respostas comunitárias, e as assimetrias do nosso imenso país.

Tememos que o legislador, ainda que bem-intencionado, tenha legislado ‘fora do mundo’, e tenha desenhado uma solução legal com méritos, mas que irá soçobrar quando for submetida ao impiedoso filtro da realidade.

Mental é uma secção do Observador dedicada exclusivamente a temas relacionados com a Saúde Mental. Resulta de uma parceria com a Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD) e com o Hospital da Luz e tem a colaboração do Colégio de Psiquiatria da Ordem dos Médicos e da Ordem dos Psicólogos Portugueses. É um conteúdo editorial completamente independente.

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