Aproxima-se um momento fulcral na vida da Comunidade Europeia – as eleições Europeias no dia 9 de junho. Em território nacional ou no estrangeiro, independentemente do local de recenseamento, os cidadãos portugueses devem exercer o seu direito de voto, desde que munidos de documento de identificação[1]. Desta vez, somos chamados a votar para eleger o Parlamento Europeu, sendo que, entendemos, ser um momento de grande expressão política que deve merecer a maior atenção de todos nós, pelo seu impacto no dia-dia de cada cidadão português europeu. Neste sentido, lembramos os níveis preocupantes de abstenção que estas eleições registam, o que tem vindo a agravar-se cada vez mais.  A título exemplificativo, no ano de 2019, fixaram-se em 69%[2], o que parece ser revelador de um certo sentimento de indiferença perante o funcionamento do PE e até de alheamento perante as consequências que daí advêm. A este propósito, talvez seja oportuno refletirmos, por analogia, nas eleições de âmbito nacional, em que esta postura passiva se tem vindo a acentuar.

Mas, voltemos às eleições europeias em que elegemos 21 eurodeputados de um total de 720. O número de representantes dos cidadãos europeus de cada estado-membro obedece ao critério da dimensão da população de cada um, em consonância com o princípio da proporcionalidade degressiva[3].  Isto significa que   a dimensão populacional de um país não é um critério absoluto e, por isso, existem mecanismos de equilíbrio para que os países com menor população não estejam sub-representados.  Assim o Tratado da União Europeia determina que não possam existir países com menos do que 6 eurodeputados e com mais de 96 eurodeputados.

O PE é eleito por sufrágio direto, ou seja, através do voto dos cidadãos dos estados-membros, o que configura a oportunidade de os eleitores europeus influenciarem diretamente, com base no conhecimento dos candidatos e respetivas agendas, optando por aquela que lhes pareça responder mais eficazmente às suas reais necessidades. A natureza do sistema de votação em causa garante uma forte legitimidade aos eurodeputados para o exercício das suas funções.

Este órgão prossegue uma série de competências conferidas pelos tratados, sendo umas de forma partilhada em matéria orçamental e legislativa, e outras de forma exclusiva, atuando como um fiscalizador político. Das diversas tarefas do PE vamos elencar apenas algumas, atenta a sua pertinência e atualidade, nomeadamente, a aprovação dos vários empréstimos no contexto da guerra da Ucrânia e de medidas para facilitar a receção de refugiados ucranianos, bem como a obtenção de um consenso para criar o mecanismo de recuperação e resiliência que financia o PRR.  O PE tem ainda um papel importante quanto à fixação das regras orçamentais a aplicar aos países que constituem a UE. Neste âmbito, pode decidir flexibilizar as regras, adaptando a disciplina orçamental exigida às necessidades de cada país sem descurar as metas exigidas pela UE (3% de défice e 60% de divida pública[4]), ou optar pela manutenção das normas de uma forma estanque. Se optar pela segunda hipótese, tal poderá contribuir para acentuar a ideia de uma Europa a várias velocidades e, consequentemente das desigualdades no seio da mesma. O caminho a seguir, na política orçamental, poderá conduzir à diferença entre permitir, ou não, a um determinado estado-membro, uma maior almofada financeira para garantir a resposta às suas diversas necessidades.

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Importa clarificar que as leis também aprovadas pelo PE, são hierarquicamente superiores às normas do Direito interno de cada Estado, o que significa que se aplicam em detrimento das últimas. Por exemplo, existem fontes de Direito da UE que se aplicam diretamente (regulamentos) e outras que não e carecem de um ato de transposição do estado-membro (diretivas), que produzirão resultados no nosso ordenamento jurídico.

Pelas razões enumeradas, entre outras de igual relevância, importa ter presente que o PE não é uma entidade distante da nossa realidade como talvez possa parecer, mas um órgão de soberania de grande expressão política, capaz de contribuir para traçar o melhor caminho para o futuro da Europa. Uma Europa que precisa de respostas assertivas e adequadas para os assuntos prementes da atualidade: segurança, economia, política externa, migração e alterações climáticas.

Em suma, não nos podemos desresponsabilizar destas questões, nem acreditar que possam ser resolvidas pela ação individual de cada estado. Do mesmo modo, não podemos continuar a pensar que a UE é uma entidade abstrata e alheia aos nossos interesses e, por conseguinte, distante da nossa realidade interna. A adesão a um projeto desta envergadura não nos retira a identidade, antes, porém reforça-a, pois somos herdeiros da mesma matriz. Exercer este direito é continuar o caminho de convergência que nos propusemos percorrer desde 1985.  É, ainda, honrar a democracia, um valor precioso que a Europa deve sempre defender!

[1] https://www.cne.pt/content/eleicoes-para-o-parlamento-europeu-2024
[2] https://maisliberdade.pt/maisfactos/evolucao-dos-niveis-de-abstencao-eleitoral-em-portugal/
[3] Artigo 14º do Tratado da União Europeia
[4] PROTOCOLO (n.o 12) SOBRE O PROCEDIMENTO RELATIVO AOS DÉFICES EXCESSIVOS