Pela terceira vez consecutiva um primeiro-ministro socialista sai do cargo a meio do mandato e deixa o país num caos. Vivemos hoje um dos maiores desafios da nossa história. O terramoto político da última terça-feira e as suspeitas de corrupção, não colocaram em causa apenas o governo, mas a confiança dos cidadãos nos actores políticos. Uma crise que se junta à do Estado, incapaz de cumprir, em condições, as suas funções essenciais e que constam da Constituição; uma crise que se soma à estagnação económica e social e à falta de perspectivas de futuro da parte dos mais novos.

Esta crise política, económica e social não surge por acaso. Não se explica pela incompetência do PS. As razões são mais profundas: residem no próprio socialismo, na concepção errada que o Estado deve interferir nos grandes negócios, proteger as grandes empresas e não apenas certificar-se  são cumpridos os requisitos indispensáveis num Estado de direito. A corrupção não é algo que desapareça por completo e artes mágicas, embora possa ser diminuída se as tentações forem refreadas. Tal como pode ser controlada se existir verdadeira alternância pacífica no exercício do governo, que é a base da democracia. Esta, por si só, não nos dá a certeza que o país se desenvolve (isso depende de boas políticas públicas) mas que o poder é distribuído e que o governo não fica na mão de um só partido, de um grupo restrito de pessoas durante 28 anos.

A crise nasceu da ideia que o Estado deve estar sozinho na saúde e na educação. Esse erro, teimosia, cegueira ideológica, afastou a colaboração dos privados e das instituições sociais nestes dois sectores. E o resultado não foi pôr termo aos privados, porque não há forma de impedir a livre iniciativa, mas de os serviços públicos, hospitais, centros de saúde e escolas, terem perdido em qualidade e em capacidade de resposta. Um Estado social deve garantir que todos tenham direito à educação e a cuidados de saúde, mas não deve determinar que estes tenham de ser prestados pelo sector público. Um Estado social, que não exclui mas integra, não pode combater a iniciativa de cidadãos que se predispõem a prestar esses mesmos serviços. Estamos todos no mesmo barco e nesse caminho comum o Estado não pode ser um entrave, mas um apoio, não necessariamente financeiro, mas de garante que as regras mais elementares são acatadas.

Mas acima de tudo esta crise nasceu porque o combate ideológico que se iniciou nos anos 70 do século passado foi posto de parte com a morte de Francisco Sá Carneiro e adormecido com a entrada na CEE. Qual é o papel do Estado? Quais são as suas funções essenciais? Como é que as hierarquizamos? Quais são os limites do poder político?

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Se quisermos uma economia saudável que capte investimento, crie bons empregos e pague bons salários, o Estado deve garantir contas públicas em ordem, excedentes orçamentais que levem a uma redução efectiva da dívida pública e que permitam uma redução da carga fiscal. Mas também liberdade económica em que o Estado garanta o cumprimento das regras básicas. Com uma Justiça que funcione a tempo e horas e um sistema fiscal estável e previsível, o Estado não tem de interferir nos negócios para que o país seja visto como credível e capte o investimento que tanto precisamos.

A possibilidade de Pedro Nuno Santos vir a liderar o PS é uma oportunidade para que o debate abandonado nos anos 80 tenha finalmente lugar. Se o fizermos, e se a página socialista for definitivamente virada, se a crença inata no socialismo for finalmente derrotada como foi por esse mundo fora, o país recupera a confiança no governo, mas também se permitem as condições para que a economia cresça e as pessoas possam viver melhor.

P.S.: como referi na minha crónica de 29 de Janeiro último sou membro da Comissão Executiva da Iniciativa Liberal. Aproveito para repetir o que então escrevi e que agora se mostra ainda mais necessário: estive afastado da política, pois preferi ter uma vida profissional que me permitisse, com a minha idade, fazer de um partido de forma responsável e como cidadão livre que sou. Sei que na política, além da nossa vontade e entrega, pouco depende de nós. Por isso só posso garantir que farei o que estiver o meu alcance para que no fim entreguemos aos nossos filhos um país melhor, mais livre, mais responsável, mais respeitado, mais digno. Um país onde os Portugueses vivam bem. Que seja causa de admiração e que inspire os demais. E o que mais desejo é que a minha vida passada tenha sido uma preparação para este momento.