O crescimento da economia ultrapassou todas as expectativas, a banca está à espera de melhores dias e as finanças públicas sem resistência para dias piores. Não fosse o último mês, o Governo podia ir para férias satisfeito, com a capacidade de os portugueses responderem ao súbito interesse que o mundo teve em visitar Portugal e à recuperação da economia europeia. Até a Grécia parece estar finalmente a sair da crise.

O ministro das Finanças Mário Centeno é aquele que pode dizer que tem umas merecidas férias, este ano. Começou muito mal, anunciando o fim da austeridade, aqui e em Bruxelas, e num inusitado ataque à CGD. Mas encerra o ano legislativo em grande, com o elogio do comissário francês Pierre Moscovici. Tirou Portugal do seu terceiro Procedimento por Défice Excessivo e fica na história como o ministro que conseguiu obter o mais baixo défice público em democracia, com reposição salarial e redução do horário de trabalho para os funcionários públicos (mais despesa).

O que está por trás da grande vitória de Mário Centeno não se vê (ainda?) e pouco importa (por enquanto?) aos portugueses em geral e aos partidos que apoiam o Governo. A preocupação fica limitada ao universo dos que sabem que o Estado não passou a ter dinheiro de um dia para o outro e que, mais cedo ou mais tarde, este tipo de austeridade apresentará a sua factura. Resta-nos esperar que o custo não seja muito elevado, não seja feito de tragédias, que seja um caso em que “se arriscou e petiscou”.

Mário Centeno pode igualmente reivindicar o crédito do crescimento da economia – a maioria dos portugueses ou não se importa com isso ou facilmente lhe dará esse prémio. Mas quem sabe de economia, incluindo o próprio ministro das Finanças, sabe que o papel do Governo foi o de transmitir confiança no futuro. Necessária, sem dúvida, mas não seria o suficiente. É fundamentalmente no efeito de arrastamento do turismo e na recuperação económica dos nossos parceiros comerciais que temos a principal explicação para o nosso crescimento.

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Na frente financeira, além da ausência de uma solução estrutural para as contas públicas, temos a banca que, todos sabem, está longe de ter resolvido os seus problemas. Terminamos o ano legislativo melhor do que há um ano graças em parte ao Governo. Mas não se pode dizer que não cometeu erros. Não fosse a confiança que os portugueses têm no sistema financeiro, e algumas das declarações do ministro das Finanças sobre a CGD ter-nos-iam criado um enorme problema.

Mas aquilo que é mais interessante no processo da CGD é o facto de nunca ter estado tão perto da fronteira de ser privada – ironia das ironias, crueldade da realidade ser um Governo do PS apoiado pelo PCP e o Bloco de Esquerda a viabilizar que parte da capitalização da Caixa (500 milhões de euros) tivesse sido feita obrigatoriamente por investidores privados institucionais a quem o banco público vai pagar 10,75% ao ano. Mas o importante é que o problema está, pelo menos parcialmente, resolvido.

Com a frente económica e financeira controlada, esta era altura em que o Governo esperaria ir de férias sem problemas, só a pensar na forma de, mais uma vez, fazer um Orçamento austeritário com paladar expansionista, para aprovação do PCP e do Bloco e satisfação dos portugueses em geral. Mais uma vez, a realidade foi cruel, até demasiado cruel, e António Costa vê-se a enfrentar problemas na frente que menos esperava, como se parte do seu passado político regressasse para o atormentar.

O mês “horribilis” de Julho impediu até que se saboreasse devidamente as vitórias obtidas na economia e nas finanças. A horrível tragédia de Pedrogão Grande, a comédia dramática de Tancos, o preço do atrevimento do Galpgate e o mais recente caso da ausência de dois deputados do PS, que impediram a aprovação do relatório da primeira comissão parlamentar de inquérito à CGD, revelaram que os problemas de um Governo podem surgir de onde menos se espera.

Os mais graves, Pedrogão e Tancos, mostraram-nos ainda um primeiro-ministro menos hábil que o habitual, com decisões directas ou indirectas que farão história. Proibir bombeiros de falar aos jornalistas ou colocar as mais altas chefias das Forças Armadas a validarem uma nova história sobre o que se passou em Tancos é histórico, ainda que não seja uma História positiva.

Houve mais vida para além do défice e do crescimento da economia, para infelicidade do País.