Resolver conflitos empresariais que envolvam mais de três milhões de euros é mais barato num tribunal arbitral do que num judicial, caso se leve em consideração apenas os custos do recurso aos tribunais. A estimativa é de Mariana França Gouveia, coordenadora de um estudo sobre sentenças arbitrais que é apresentado na sexta-feira, 11 de julho, durante o VIII Congresso do centro de arbitragem comercial da câmara de comércio (CAC). No centro do debate, está a resolução de litígios entre empresas.
Exemplo? Um conflito numa empreitada de construção de um condomínio em Lisboa, sugeriu ao Observador a professora da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa. “Surge um litígio entre o dono do empreendimento e o empreiteiro por terem sido necessários trabalhos não previstos no projeto inicial. O empreiteiro afirma que estes tiveram um custo de três milhões de euros e o dono da obra entende que a responsabilidade não é sua, mas do empreiteiro, que executou mal a obra. Se as partes optarem pelos tribunais arbitrais, pagam cerca de 70 mil euros, enquanto nos judiciais as custas podem ser superiores a 100 mil euros”, revela.
Os custos com a arbitragem são apenas uma parte dos encargos que recaem sobre as empresas quando iniciam um processo contencioso por esta via. “Em termos internacionais, calcula-se que esse custo seja cerca de 15% do valor dos custos com o processo. Para além destes encargos, há ainda que contar com os custos dos advogados e peritos, entre outros”, explica Mariana França Gouveia.
No CAC, são resolvidos dezenas de conflitos que excedem 40 milhões de euros. Em média, os processos envolvem litígios na ordem dos 10 milhões de euros.
No CAC, a média do valor dos processos é de cerca de dez milhões de euros e “várias dezenas” excedem os 40 milhões de euros. A resolução dos conflitos não costuma ultrapassar 16 meses, uma duração “incomparavelmente mais reduzida” do que o tempo médio das ações nos tribunais comuns.
Nos tribunais de primeira instância, a duração média de resolução dos processos é de três anos, adianta a professora. “Se acrescentarmos que as sentenças arbitrais não são, por regra, recorríveis, ou seja, a decisão é naquele espaço de tempo definitiva, não nos oferece dúvida que a justiça arbitral é muito mais rápida que a estadual”, acrescenta a professora.
nove meses seriam suficientes
Os tribunais arbitrais são sistemas privados de resolução de litígios. Apesar da celeridade na discussão dos processos, Mariana França Gouveia adianta que é possível “melhorar” a duração da análise dos processos. Quando questionada sobre qual seria o prazo ideal para resolver este tipo de litígio, a professora adiantou que seria “muito difícil” fazê-lo em menos de nove meses.
O facto de terem de ser as empresas a constituir o tribunal, isto é, a escolher os árbitros, contribui para que os processos se arrastem. “Cada uma das partes tem de escolher um árbitro e os outros dois têm de escolher um terceiro. Só isto demora, muitas vezes, cerca de dois meses”, explica a coordenadora do estudo. À constituição do tribunal, soma-se uma reunião inicial para acordar quais são as regras a aplicar no processo e, depois de se marcar julgamento, chamar testemunhas e peritos, há um processo para a sentença.
O centro de arbitragem vai vigiar os adiamentos aos processos para tentar diminuir a duração média das resoluões, 16 meses.
Para acelerar os processos, o CAC está a vigiar “constantemente” os adiamentos que são feitos pelos árbitros ou pelas empresas. “O centro tem de preservar a independência dos árbitros, porque são eles os juízes daqueles processos. Pode ajudá-los a perceber que a celeridade é importante e que não se devem adiar os julgamentos”, diz.
Os processos que mais dão entrada nos tribunais arbitrais estão relacionados com contratos de empreitadas de construção de obras públicas e privadas. “Quanto maiores são as construções, mais provável é que surjam litígios entre as partes”, diz a especialista. Mas não são os únicos. Os litígios relativos a sociedades comerciais também são frequentes e podem envolver acordos entre sócios relativamente a aumentos de capital, a cessões de quotas ou de ações.
Arbitragem comercial em números pela primeira veZ
O estudo do CAC é apresentado na próxima sexta-feira. A duração dos processos, média do valor em causa ou o tipo de objeto mais frequente são algumas das conclusões provisórias da investigação que envolveu cerca de 200 processos. Atualmente, dão entrada no centro cerca de 30 processos por ano. Em 2012, o número foi mais elevado, contabilizaram-se 67 litígios.
A arbitragem comercial tem vindo a crescer, refere Mariana França Gouveia. Começou por envolver um número pequeno de processos ligados, sobretudo, a empresas estrangeiras a operar em Portugal, mas “rapidamente” suscitou o interesse das empresas portuguesas.
“As vantagens geralmente associadas à arbitragem são a sua rapidez, sobretudo se comparada aos tribunais judiciais, e a especialização técnica dos árbitros. Não é raro que em processos ligados a empreitadas de construção, um ou mais árbitros sejam engenheiros, por exemplo”, revela a professora.
Esta é a primeira vez que a arbitragem comercial é estudada em termos estatísticos, em Portugal. Mariana França Gouveia e Rodrigo Caldeira são os coordenadores do estudo. No congresso que começa esta quinta-feira, 10 de julho, o CAC quer lançar o debate sobre a coexistência de duas formas de ministrar a justiça. Um dos objetivos passa por combater aquilo que os organizadores consideram ser mitos como a ideia de a arbitragem ser uma tentativa de privatização da justiça.