António Guterres, esperança socialista para as presidenciais de 2016, informou a direção do PS sobre a prorrogação do seu mandato como Alto-Comissário da ONU para os Refugiados (ACNUR), o que torna muito difícil uma candidatura a Belém devido à coincidência entre a campanha eleitoral e o desempenho do seu cargo na organização internacional.

Segundo Eduardo Ferro Rodrigues, líder da bancada parlamentar do PS, que disse ao Observador ter conhecimento desta prorrogação “por quem de direito” antes da notícia desta sexta-feira do semanário Sol, esta situação torna mais difícil uma candidatura presidencial de Guterres. “Talvez” seja boa ideia o partido procurar alternativas viáveis à esquerda para suceder a Cavaco Silva, disse, acrescentando, no entanto, que há “várias”.

Ferro não adiantou se a informação lhe chegou diretamente através do antigo primeiro-ministro ou do secretário-geral do PS, António Costa.

Contactado pelo Observador, o gabinete de comunicação de Guterres preferiu não comentar. “Não temos comentários sobre essa questão neste momento”, respondeu, por escrito, a porta-voz do alto comissariado, Melissa Fleming.

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O Observador apurou ainda que uma prorrogação do mandato parte, em primeiro lugar, da manifestação de vontade do próprio e que os governos nacionais não têm de dar o seu aval a esta prorrogação. A ONU pode, pura e simplesmente, avançar com o prolongamento do mandato de Guterres que terminaria em junho – e segundo o semanário Sol, continuará em funções até dezembro – e notificar os governos nacionais desta alteração.

No entanto, o secretário-geral da ONU está a levar a cabo uma consulta em várias regiões do mundo, incluindo Portugal, e que a decisão final será sempre de Ban Ki-Moon e deverá ser anunciada na Assembleia-Geral da ONU. Cada mandato do Alto-comissário da ONU para os Refugiados é de três anos segundo os estatutos que definem o cargo.

A continuação de Guterres neste cargo leva a crer que o antigo governante português poderá estar mesmo na corrida ao lugar de secretário-geral da ONU, atualmente ocupado por Ban Ki-Moon. O trabalho do português tem tido muita visibilidade nos últimos anos devido às crises de refugiados em palcos de guerra como a Síria e o Iraque.

Contactado pelo Observador, o ex-ministro Jorge Coelho, por exemplo, que é um dos principais entusiastas da candidatura presidencial do ex-primeiro-ministro socialista, disse “não ter sequer uma palavra a dizer sobre isso”. Outros socialistas escusaram-se a pronunciar, alegando ter sabido da notícia esta sexta-feira pela comunicação social.

Nos últimos meses, a incerteza sobre o que Guterres queria fazer no futuro adensava-se. Marcelo Rebelo de Sousa já tinha dito, na TVI no início de novembro, que o mais certo era o socialista querer ficar na ONU. E vários socialistas começaram, numa estratégia de gestão de crise, a desdramatizar uma eventual indisponibilidade de Guterres, dizendo haver vários nomes fortes à esquerda para suceder a Cavaco em Belém, tais como Jaime Gama, defendido por pessoas como Sérgio Sousa Pinto ou Miranda Calha, e António Sampaio da Nóvoa, ex-reitor da Universidade de Lisboa.

Este último foi nomeado em dezembro para um cargo inédito, o de coordenador de um gabinete da Universidade de Lisboa que vai pensar o país e organizar debates durante todo o ano de 2015. Sampaio da Nóvoa, que foi convidado a discursar no congresso do PS em novembro, negou na altura ao Observador que o cargo fosse uma espécie de estágio para uma candidatura presidencial. “Não sou candidato a nada. As notícias que circulam não têm a ver comigo”, disse.

Jaime Gama, por seu lado, já veio a público garantir não estar interessado numa candidatura presidencial e o seu nome já nem sequer é usado nas sondagens que vários órgãos de comunicação social têm feito sobre as eleições presidenciais. No entanto, o deputado Miranda Calha, que afirma ao Observador que no PS já “pairava” alguma incerteza sobre o futuro de Guterres devido à possibilidade do antigo primeiro-ministro ter o caminho aberto para se tornar secretário-geral da ONU, continua a defender que Gama tem “um perfil exemplar” para candidato a Belém.

“É um lutador pela liberdade, fundador do PS, teve atividade política, exerceu cargos de soberania e foi presidente da Assembleia da República. Seria extremamente interessante ter um secretário-geral da ONU português e um Presidente da República como Jaime Gama”, argumenta Miranda Calha.

A última sondagem, do JN, dava Guterres como o vencedor contra qualquer que fosse o candidato apoiado pelos partidos de direita, como Marcelo Rebelo de Sousa, Pedro Santana Lopes ou Rui Rio.