Associações de proprietários criticam que as Finanças consultem os consumos de água ou de luz de imóveis para controlarem o arrendamento ilegal, por considerarem a iniciativa inútil e violadora de direitos. O presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), Menezes Leitão, afirma-se contra o acesso aos dados, argumentando ser uma “exigência desproporcionada, violadora do direito à intimidade da vida privada”. No seu entender, “não se vê em que medida é que, através dela, se pode demonstrar a existência de arrendamentos ilegais”. Para o dirigente, a consulta dos consumos não prova se há pagamento de renda ou se a casa é ocupada gratuitamente: “o facto de o imóvel estar ocupado e ter consumos não demonstra por si o seu arrendamento”.

A tutela anunciou que irá reforçar a fiscalização do arrendamento ilegal, a partir de abril, com a Autoridade Tributária e Aduaneira a cruzar informações entre o cadastro predial e os dados dos contratos da luz, água e gás, segundo uma notícia do jornal Diário Económico.

À agência Lusa, o responsável da ALP afirmou que a “esmagadora maioria dos proprietários cumpre as suas obrigações fiscais” e assegurou haver “maneiras menos intrusivas e até mais eficazes de controlar o cumprimento das obrigações fiscais, dever de todos os cidadãos”.

Para a Associação Nacional de Proprietários (ANP), quer o Estado central, quer as autarquias não devem ter acesso aos dados sobre consumo de água, gás e eletricidade para “fins fiscais ou outros, nomeadamente agravamento para o triplo do Imposto Municipal sobre Imóveis”. “Na realidade, enquanto algumas famílias provocam grandes gastos, outras há que, seguindo procedimentos de poupança voluntária ou forçada, pouco ou nada gastam, não podendo por tal ser discriminadas. O uso do locado pode e deve ser provado por outros meios”, afirmou António Frias Marques.

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O dirigente da ANP notou que a “possibilidade do cruzamento automático de dados está a criar uma erosão dos direitos individuais”, sendo esta uma “situação incontornável e imparável que somente a consciência afirmativa dos cidadãos pode atenuar”.

Em resposta à Lusa, fonte do Ministério das Finanças referiu que o “dever das entidades fornecedoras de água, energia e telecomunicações comunicarem os elementos dos contratos celebrados e as suas alterações à Autoridade Tributária e Aduaneira está há muitos anos previsto na legislação fiscal”. A mesma fonte recordou que o Orçamento do Estado de 2015 introduziu duas alterações, com a comunicação a passar a ser trimestral, quando anteriormente era semestral, e obrigatoriamente por via eletrónica. “Nestes termos não houve qualquer alteração substancial da lei, pelo que este cruzamento de dados continua a estar fundamentado na lei que se encontra em vigor há mais de 10 anos”, acrescentou fonte.

A consulta de consumos domésticos para facilitar os despejos de habitações sociais, como constava do projeto de diploma do regime de renda apoiada, foi criticada pela Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD). Em meados de setembro, no parlamento, o ministro do Ordenamento do Território, Jorge Moreira da Silva, rejeitou que a proposta de consulta fosse uma “perseguição dos consumos dos cidadãos”, mas antes de assegurar “pela via da não existência de fraude”. Na sua avaliação ao projeto de diploma, a CPND indicava que a informação sobre consumo se enquadrava no conceito de vida privada.