Umas das condições para a Conferência do Clima de Paris ser um sucesso é conseguir “chegar a um acordo universal, vinculativo e diferenciado para que cada um tenha de fazer a sua parte e nada mais”, disse ao Observador Jean-François Blarel, embaixador de França em Portugal. Carlos Teixeira, biólogo e investigador no Instituto Superior Técnico, concorda. “O mundo não poderá viver sem acordos vinculativos nesta área.”

Humberto Rosa, ex-secretário de Estado do Ambiente, não considera que o sucesso da conferência esteja dependente de ser vinculativo ou não. “Se um país qualquer assume um acordo internacional, no contexto de uma convenção internacional, não é por haver multas que vai cumprir. Os países que não cumprirem vão sofrer consequências diplomáticas”, disse Humberto Rosa num workshop para jornalistas organizado pelo projeto ClimAdaPT.Local.

O diretor de Adaptação e Tecnologias de Baixo Carbono da Direção Geral de Ação Climática da Comissão Europeia considera mesmo que o acordo não seja vinculativo pode trazer vantagens aos países que têm dificuldade em fazer passar acordos vinculativos internamente.

Embora Barack Obama tenha reforçado que se deve procurar um acordo vinculativo, os Estados Unidos são um dos países onde seria difícil fazer passar esse tipo de acordo. Levar ao Congresso um acordo que obrigasse os Estados Unidos a reduzir a emissão de gases com efeito de estufa poderia significar um chumbo. Mas o presidente tem poder para tomar algumas decisões que não precisam de ser votadas internamente. Em final de mandato, Obama já nada tem a perder, afirmou Carlos Teixeira ao Observador.

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Para a União Europeia (UE) e respetivos Estados-membros a obrigatoriedade não é um problema, nem tão pouco tem algo de novo, disse ao Observador Carlos Pimenta, antigo secretário de Estado do Ambiente. Desde o Protocolo de Quioto que os países da UE estão habituados a cumprir limites obrigatórios de emissões de gases com efeito de estufa. Mesmo os Estados Unidos, com o mandato de Obama, tem tomado medidas de redução, refere Carlos Pimenta, que está em Paris para participar na validação técnica do documento que será assinado.

Voltando a Quioto, Carlos Pimenta diz que neste momento se nota já um avanço. Se no referido Protocolo se discutia a inclusão ou não da palavra “antropogénico”, ou seja, se era o homem a causa das emissões e das alterações climáticas. “Agora já ninguém tem dúvidas.” Neste momento em discussão está a palavra “binding” (ligação), lembra Carlos Pimenta, no sentido de “quantitativo e obrigatório”.

Mas afirmar que o acordo é vinculativo ou não, é demasiado simplista. Na verdade, poderão existir partes do acordo que sejam vinculativas e outras que não. E esse será o cenário mais favorável para Barack Obama, explicou ao Observador Stephen Leahy, jornalista de ambiente. “No entanto, será já um grande compromisso por parte dos Estados Unidos.” Tudo dependerá de como estiver escrito o acordo e serão precisos especialistas para decifrar os significados das palavras dos advogados contratados para o efeito.

“Apoiamos um acordo vinculativo em muitos aspectos, incluindo responsabilização, boa informação, apresentação de relatórios e revisões”, disse esta quarta-feira Todd Stern, negociador pelos Estados Unidos. “Mas os Estados Unidos não vão concordar com um acordo vinculativo para as metas de redução de emissão de dióxido de carbono.”

O jornalista canadiano acrescentou que as partes que exijam obrigatoriedade ou não, condicionarão a entrada de certos países. “A Rússia quer [um acordo vinculativo] e alguns países em desenvolvimento também, mas a China e a Índia não.” Lembramos que a China e a Índia são duas economias emergentes que também têm aumentado exponencialmente as emissões de gases com efeito de estufa.

O que pode ou não ser obrigatório neste acordo? O presidente norte-americano defende que os compromissos que cada país apresentou sejam voluntários, referiu o jornal britânico The Guardian. Já a revisão periódica do acordo deve ser, para Obama, obrigatória. Há quem defenda que além de periódica, a revisão também implique que os países assumam compromissos gradualmente mais arrojados, sem nunca voltarem atrás nas medidas já assumidas.

“Apesar de as metas, em si mesmas, não terem a força de tratados, os processos e os procedimentos que asseguram a transparência e as revisões periódicas, isso precisa ser vinculativo”, disse Barack Obama aos jornalistas em Paris. “E isso vai ser fundamental para mantermos grandes ambições e assegurarmos que cada um é responsável.”

O presidente norte-americano considera que o seu legado em relação ao clima se vai manter mesmo depois de deixar a Casa Branca. Um legado que à partida será assegurado caso Hillary Clinton seja eleita e que dificilmente pode ser anulado por um presidente Republicano. A candidata democrata já avisou os Republicanos que os esforços negacionistas vão falhar. “Não estão apenas do lado errado da ciência e da história, mas estão cada vez mais do lado contrário dos próprios eleitores, já que a maioria dos Republicanos aceita a ciência das alterações climáticas e apoia as soluções, como a energia limpa.”

Mas os Republicanos não desistem de mostrar que são contra a agenda climática de Obama. Na terça-feira, a câmara baixa votou uma legislação que permite bloquear permanentemente as medidas da agenda climática que o presidente norte-americano tem posto em prática, noticiou The Hill. Quem votou a favor sabe, no entanto, que este é um voto simbólico, visto que Obama tem o direito de vetar esta decisão.

Neste momento, os vários grupos de trabalho estão reunidos para discutir os programas nacionais apresentados por cada país para se chegar a um consenso entre todas as propostas que à partida estará pronto na sexta-feira.

Atualizado com as declarações de Todd Stern às 16h00.