Uma pessoa não tem de aderir aos precários inflexíveis para ter uma resposta para o seu problema de precariedade laboral. É assim que os autores da moção de orientação estratégica “Fazer Melhor – um CDS com ambição” começam por explicar como querem abrir o partido à sociedade civil e acabar de vez com o “receio” e o “tabu” de empunhar bandeiras que são tradicionalmente de esquerda. “Não há, nem deve haver, temas que sejam naturais para a esquerda e tabu para a direita”, dizem.

A moção em causa é subscrita por João Almeida (ex-secretário de Estado da Administração Interna) e Adolfo Mesquita Nunes (ex-secretário de Estado do Turismo), assim como por outros deputados e dirigentes de peso, como Ana Rita Bessa, Cecília Meireles, Diogo Belford, Helena Nogueira Pinto e Maria Graça Silveira. O congresso do CDS realiza-se a 12 e 13 de março, sendo que as moções de orientação estratégica têm de ser entregues até sexta-feira. Assunção Cristas é a única candidata à liderança do partido e terá uma moção em nome próprio.

“Não há qualquer justificação para que o CDS não tome posição em questões como a precariedade, ou não priorize essa questão. O mesmo sucede com outra área, a da cultura, onde o CDS tem estado menos presente. Não mimetizando o discurso da esquerda, mas oferecendo uma nova perspetiva” sobre o assunto, lê-se no texto. A ideia é pôr o partido a falar a toda a gente de forma a chegar a mais eleitorado. “Se queremos crescer, temos de pôr de lado os complexos de que há áreas ou setores em que os outros partidos são donos dos votos, porque se supõe terem o monopólio das soluções”, acrescentam.

Os autores e subscritores da moção afirmam que andaram pelo país a recolher contributos para delinearem a estratégia para o partido e garantem que a ideia de o CDS poder pegar nas bandeiras da esquerda “esteve sempre presente” nas conversas que foram tendo. “Foi como se se tivesse detetado um receio, ou preconceito, de o CDS em dar resposta a problemas concretos das pessoas, apenas porque a esquerda se apropriou desses problemas. Uma das frases que melhor expressa o repto que nos foi lançado foi-nos dita desta forma: ‘não quero ter de aderir aos precários inflexíveis para ter de ter uma resposta ao meu problema de precariedade’. Foi uma frase que nos deixou a pensar”, dizem.

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Sobre a organização interna do partido, os subscritores da moção “Fazer Melhor” admitem a possibilidade de virem a realizar-se primárias para a escolha dos candidatos a deputados, por reconhecerem “a tensão que se cria nos momentos de escolha da apresentação do partido a votos”.

João Almeida e Adolfo Mesquita Nunes propõem ainda a criação de um Conselho Económico e Social dentro do partido mas aberto a personalidades fora do CDS. “Queremos juntar, de uma forma informal mas institucionalizada, aqueles que nas principais questões com que o país e o partido se confrontam podem dar um contributo válido. Não têm que concordar connosco, mas devem ser ouvidos”, afirmam.

Diogo Feio e Paulo Núncio querem CDS pelo seu próprio pé

Outras moções que já foi apresentada, assinada por Diogo Feio (eurodeputado), Paulo Núncio (ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais) e Francisco Mendes da Silva, intitulada “Uma Esperança para um Novo Ciclo”, defende a que o CDS deve apresentar “listas próprias” nas próximas eleições legislativas – quando quer que elas surjam. Mas até haver eleições, os centristas defendem que o CDS ainda está disponível para integrar uma solução governativa no atual quadro parlamentar, caso a solução de Costa com as esquerdas falhe.

“O CDS não deve colocar de parte a possibilidade de aceitar a formação de um novo governo dentro do quadro parlamentar vigente, desde que a solução em causa respeite os resultados eleitorais das últimas eleições e seja a que permita superar mais eficazmente o impasse que vier a ser gerado”, lê-se na moção hoje divulgada.

“No entanto, na eventualidade de eleições legislativas, o CDS deverá, em circunstâncias normais, apresentar listas próprias, como forma de afirmação autónoma do seu projecto para o novo ciclo”, acrescentam.

O objetivo, dizem, é voltar a pôr o centro-direita no governo. Mas como “a maioria absoluta dificilmente será obtida por um só partido”, a estratégia passa por CDS e PSD se apresentarem separados para conquistarem o maior espetro eleitoral possível. A soma das partes é maior do que o todo.

“Este cenário significa que a estratégia mais apropriada é a de cada partido se apresentar de forma independente, com projetos distintos (ainda que possivelmente conciliáveis), de modo a alargar a capacidade de atração de voto”, explicam.

Para estes dirigentes centristas, o CDS não deve, contudo, abusar do discurso em torno da “falta de legitimidade do Governo” de António Costa sob pena de “desvalorizar” a questão. Criticar, mas sem “crispações desnecessárias”, dizem. “É enfrentando e combatendo, sem crispações desnecessárias, a actual solução parlamentar socialista/bloquista/comunista/verdes que sustenta o executivo que o CDS criará as condições para voltar a exercer responsabilidades governativas. A maioria do eleitorado aprecia as posturas de responsabilidade”, dizem.

Para os centristas, a legitimidade do Governo acaba no dia em que o acordo à esquerda se rasgar. E será nessa altura que a direita terá “autoridade” para reclamar sobre a inexistência de uma maioria. “Se o fundamento do actual Governo é uma suposta maioria parlamentar positiva e duradoura, o Governo deixará de ter legitimidade quando se perceber que aquela maioria não existe realmente”, dizem.