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Até ao anúncio do “Melhor Filme”, na reta final da 90ª cerimónia dos Óscares, a noite tinha corrido mais ou menos como previsto. Gary Oldman tinha ganho na categoria de “Melhor Ator”, Frances McDormand na de “Melhor Atriz” e Guillermo del Toro na de “Melhor Realizador”. Olhando para o que tinha acontecido nos Globos de Ouro e nos BAFTA, tudo indicava que “Three Billboards Outside Ebbing, Missouri” (“Três Cartazes à Beira da Estrada”) seria o grande vencedor. Mas não foi isso que aconteceu: contra todas as expectativas, del Toro voltou a subir ao palco do Dolby Theatre, em Hollywood, para receber o prémio de “Melhor Filme” por “The Shape of Water” (“A Forma da Água”), o conto estranho de uma empregada de limpeza muda que se apaixona por uma criatura aquática, meio-homem, meio peixe, que vive num aquário num laboratório secreto do Governo norte-americano. O galardão foi o quarto recebido pelo realizador mexicano que estava nomeado, ao todo, para 13 categorias. Também contra todas as expectativas, “The Shape of Water” acabou por ser o filme que arrecadou mais estatuetas douradas.

Durante o segundo discurso de agradecimento, del Toro lembrou a infância passada no México, onde se tornou “grande fã de filmes estrangeiros”. “Há umas semanas, o Steven Spielberg disse-me: ‘Se subires ao palco, lembra-te que fazes parte de um legado, de um mundo de realizadores, e sente-te orgulhoso’. Sinto-me orgulhoso”, começou por dizer o realizador, que se inspirou no filme “Monstro da Lagoa Negra”, de 1954, para escrever “The Shape of Water”. “Quero às pessoas que sonham em usar a fantasia para contar as histórias do mundo de hoje que vocês conseguem. Esta é uma porta. Mantenham-na aberta e entrem”, concluiu del Toro que já tinha comentado, depois de receber o Óscar de “Melhor Realizador”, que as “linhas na areia” estão a ser apagadas. Para garantir que não havia erros, o realizador confirmou que era mesmo o nome do seu filme que estava no envelope.

Além das categorias de “Melhor Filme” e “Melhor Realizador”, “The Shape of Water” arrecadou ainda os Óscares de “Melhor Direção de Arte” e “Melhor Banda Sonora”, esta última da responsabilidade de Alexandre Desplat, que venceu na mesma categoria em 2015, pelo filme “The Grand Budapest Hotel”, de Wes Anderson. No curto discurso que fez, o compositor francês agradeceu sobretudo a del Toro e aos seus monstros. “Guillermo, obrigado. Obrigado por deixares que a música fosse o som das tuas personagens”, afirmou Desplat que, ao todo, já foi nomeado nove vezes para os prémios da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos da América. Já “Dunkirk”, que estava nomeado para oito categorias, arrecadou três Óscares. Foi o filme mais premiado, a seguir a “The Shape of Water”. Contudo, a longa-metragem de Christopher Nolan sobre a evacuação das tropas aliadas da costa francesa venceu apenas categorias técnicas: “Melhor Montagem”, “Melhor Edição Sonora” e “Melhor Mistura de Som”.

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Depois dos Globos de Ouro e dos BAFTA, o Óscar

Pouco surpreendentes foram as atribuições dos prémios de “Melhor Ator” e “Melhor Atriz”. Gary Oldman, que já tinha ganho nos Globos de Ouro e nos BAFTA, voltou a vencer pela sua interpretação de Winston Churchill em “Darkest Hour” (“A Hora Mais Negra”). Oldman, muito emocionado no seu discurso de agradecimento, chamou ao Óscar “este prémio glorioso” e agradeceu à América, onde vive há vários anos, por tudo o que lhe deu de bom: “as amizades, a casa, a família e agora o Óscar”. “Os filmes, o seu poder, cativaram um jovem do sul de Londres e deram-lhe um sonho”, disse o ator, que agradeceu também a Churchill, “uma ótima companhia”. O ator inglês só tinha sido nomeado anteriormente uma única vez, pelo filme “Tinker Tailor Soldier Spy”, de 2011. Frances McDormand, protagonista de “Three Billboards Outside Ebbing, Missouri”, protagonizou um dos melhores momentos da noite: depois de pousar a estatueta dourada no chão, pediu a todas as nomeadas para se levantarem com ela. Um gesto simbólico que pretendeu chamar a atenção para a importância das mulheres na indústria cinematográfica.

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O primeiro elemento do elenco de “Three Billboards” a subir ao palco do Dolby Theatre este domingo foi, contudo, Sam Rockwell. Rockwell, que nunca tinha sido nomeado para os prémios da Academia, venceu na categoria de “Melhor Ator Secundário”, a primeira a ser revelada. O ator, que interpretou o papel de Dixon em “Three Billboards”, recebeu o prémio das mãos de Viola Davis, vencedora do Óscar de “Melhor Atriz Secundária” no ano passado. Rockwell começou por agradecer à Academia e aos restantes nomeados para a categoria de “Melhor Ator Secundário”, Willem Dafoe, Richard Jenkins e Christopher Plummer. “Vocês são os maiores! Vocês inspiram-me e sempre me inspiraram”, afirmou o ator, que aproveitou a oportunidade para agradecer também aos pais, que lhe transmitiram o amor pelo cinema. “Quando tinha oito anos, fui chamado ao gabinete do diretor [da escola]. ‘É a avó’, disse-me o meu pai. Quando chegámos ao carro, perguntei-lhe o que se passava com a avó. ‘Nada, vamos ao cinema’”, contou Sam Rockwell, que deixou agradecimentos ao elenco de “Three Billboards”, a “toda a gente envolvida” na produção do filme e “a todos os que já olharam para um cartaz”.

Como seria de esperar, Allison Janney arrecadou o Óscar de “Melhor Atriz Secundária” pelo seu desempenho em “I, Tonya” (“Eu, Tonya”). O discurso foi curto e dirigido sobretudo aos colegas de equipa. “Obrigada à Academia, aos meus colegas, que representam tudo o que há de bom e humano nesta profissão, à minha família ‘I, Tonya’”, afirmou a atriz, que começou por dizer, em tom de brincadeira, que tinha feito “tudo sozinha”. Depois de 14 nomeações, Roger Deakins, um dos cinematógrafos mais respeitados de Hollywood, venceu finalmente o Óscar de “Melhor Fotografia” por “Blade Runner 2049”. O prémio foi dedicado a toda a equipa porque foi um esforço conjunto. “Algumas destas pessoas trabalham comigo há 30 anos”, disse Deakins.

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Inclusão, igualdade e liberdade

Ao contrário das cerimónias de entrega de prémios anteriores, que ficaram marcadas pelas mensagens contra o assédio sexual em Hollywood, na 90ª edição dos Óscares falou-se sobretudo de inclusão, de igualdade e de liberdade. Bryan Fogel, realizador de “Icarus”, juntamente com Dan Cogan, disse esperar que o seu documentário fosse uma “chamada de atenção para a Rússia” e, principalmente, “para a importância de dizer a verdade”. Os atores Lupita Nyong’o e Kumail Nunjiani — que apresentaram o Óscar de “Melhor Direção de Arte”, atribuído a “A Forma da Água” — falaram da importância dos sonhadores, enquanto Darla K. Anderson e Lee Unkrich, realizadores de “Coco”, falaram da importância da “representatividade”. “Com ‘Coco’, tentámos dar um passo em frente”, disse Unkrich, com Anderson a defender que é possível “mudar o mundo”. Esse “passo em frente” ganhou forma com “Una Mujer Fantástica” (“Uma Mulher Fantástica”), o primeiro filme a ter uma atriz transexual, Daniela Vega, no papel principal. A longa-metragem chilena, realizada por Sebastián Lelio, venceu na categoria de “Melhor Filme Estrangeiro”. Durante o discurso de agradecimento, Lelio — que considerou o prémio “um presente incrível” –, agradecendo a Daniela Vega pela inspiração.

Já o Óscar de “Melhor Curta-Metragem” foi para “The Silent Child”, um filme sobre uma criança que nasceu “num mundo de silêncio”. “Não é um filme exagerado ou sensacionalista, isto acontece”, salientou a realizadora Rachel Shenton, que começou o seu discurso com um pedido de desculpas: “Prometi à nossa protagonista de seis anos que faria este discurso em língua gestual, mas as minhas mãos estão a tremer. Peço desculpa por isso”. Chamando a atenção para todas as crianças que têm de enfrentar, diariamente, um mundo que não está preparada para elas, Shenton, que realizou a curta juntamente com Chris Overton, agradeceu à Academia por os ter deixado “colocar isto em frente a uma grande audiência”. “Milhões de crianças vivem em silêncio e enfrentam barreiras de comunicação e dificuldades de acesso à educação. A surdez é uma deficiência silenciosa. Não coloca a vida em perigo e não conseguimos vê-la”, disse a realizadora.

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A lista final dos vencedores da 90ª edição dos Óscares é a seguinte:

  • Melhor Filme: “The Shape of Water” (“A Forma da Água”);
  • Melhor Ator: Gary Oldman, em “Darkest Hour” (“A Hora Mais Negra”);
  • Melhor Atriz: Frances McDormand, em “Three Billboards Outside Ebbing, Missouri” (“Três Cartazes à Beira da Estrada”);
  • Melhor Ator Secundário: Sam Rockwell, em “Three Billboards Outside Ebbing, Missouri” (“Três Cartazes à Beira da Estrada”);
  • Melhor Atriz Secundária: Allison Janney, em “I, Tonya” (“Eu, Tonya”);
  • Melhor Realizador: Guillermo del Toro, “The Shape of Water” (“A Forma da Água”)
  • Melhor Filme de Animação: “Coco”;
  • Melhor Curta de Animação: “Dear Basketball”;
  • Melhor Curta-Metragem: “The Silent Child”;
  • Melhor Documentário: “Icarus” (Bryan Fogel e Dan Cogan);
  • Melhor Curta Documental: “Heaven is a Traffic Jam on the 405”;
  • Melhor Montagem: Lee Smith, em “Dunkirk”;
  • Melhor Filme Estrangeiro: “Una Mujer Fantástica” (“Uma Mulher Fantástica”), do Chile;
  • Melhor Fotografia: Roger Deakins, em “Blade Runner 2049”;
  • Melhor Guarda-Roupa: Mark Bridges, em “Phantom Thread” (“A Linha Fantasma”);
  • Melhor Caracterização: Kazuhiro Tsuji, David Malinowski e Lucy Sibbick, em ”Darkest Hour” (“A Hora Mais Negra”);
  • Melhor Banda Sonora: Alexandre Desplat, em “The Shape of Water” (“A Forma da Água);
  • Melhor Canção Original: “Remember Me” (Kristen Anderson-Lopez e Robert Lopez), do filme “Coco”;
  • Melhor Direção de Arte: Paul Denham Austerberry, Shane Vieau e Jeff Melvin, em “The Shape of Water” (“A Forma da Água”);
  • Melhor Edição Sonora: Richard King e Alex Gibson, em “Dunkirk”;
  • Melhor Mistura de Som: Mark Weingarten, Gregg Landaker e Gary A. Rizzo, em “Dunkirk”;
  • Melhores Efeitos Visuais: John Nelson, Paul Lambert, Richard R. Hoover e Gerd Nefzer, em “Blade Runner 2049”;
  • Melhor Argumento Original: Jordan Peele, em “Get Out”;
  • Melhor Argumento Adaptado: James Ivory, em “Call Me By Your Name” (“Chama-me Pelo Teu Nome”).