O pedido foi feito em 2014 e é agora revelado pela agência Reuters. Num e-mail enviado para “altos funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros” norte-americano, o embaixador francês Franck Gellet alertou os americanos para a necessidade de “proteger este investimento francês” na Síria e afirmou à época ser “legítimo pedir a Washington que não fizesse nada” que afetasse a fábrica de cimento que a Lafarge tinha na Síria. A empresa começou por ser investigada pelas autoridades francesas por suspeitas de ter financiado grupos terroristas. Em 2017, os responsáveis da Lafarge admitiram que pagaram a grupos armados locais para proteger a fábrica, localizada em território controlado pelo auto-proclamado Estado Islâmico.
Entre os e-mails analisados na investigação — a que a Reuters teve acesso –, estão trocas de correspondência deste embaixador francês com o chefe de segurança da Lafarge, Jean-Claude Veillard e outros “oficiais franceses”. Do lado norte-americano, a resposta ao pedido de Franck Gellet foi a seguinte: “Serve este e-mail para confirmar que o local mencionado pelo seu interlocutor foi referenciado pelo nosso exército aos homólogos norte-americanos e está agora registado na lista de locais apropriados”.
À Reuters, o Ministério dos Negócios Estrangeiros francês preferiu não comentar o pedido feito em 2014 às autoridades norte-americanas e não responder se sabia ou não que a empresa francesa pagava a grupos armados para proteger as suas infra-estruturas na Síria, situadas a 87 quilómetros de Raqqa. Ao juíz que coordena a investigação, o chefe de segurança da empresa, Jean-Claude Veillard, afirmou ter “prestado todas as informações” sobre as operações da Lafarge na Síria. “Não filtrei a informação que ia passando aos serviços secretos, contava-lhes tudo”, disse ainda.
Segundo revelou fonte diplomática francesa à agência noticiosa, vários diplomatas têm sido inquiridos como testemunhas neste processo. As autoridades procuram perceber que influência tiveram e que conhecimento tinham dos pagamentos da empresa a grupos armados sírios. No final do ano passado, representantes de uma organização de direitos humanos (a Sherpa) acusaram a empresa francesa de ter pago quase 13 milhões de euros a grupos armados sírios.
Segundo a associação, a maioria dos pagamentos foram recebidos por militantes e oficiais do ISIS e terão durado até 2015. A confirmar-se, a informação tornaria a justificação dada pela empresa para efetuar estes pagamentos — a proteção da fábrica de cimento existente na Síria — pouco plausível, já que as infra-estruturas da Lafarge no país foram encerradas em setembro de 2014. A Sherpa acusou ainda a Lafarge de obstrução à justiça, reportando-se a alagadas destruição ou “limpeza” de indícios e provas e tentativas de comprar o silêncio de alguns dos funcionários e ex-funcionários ouvidos no processo. As autoridades francesas também não ficaram imune de críticas, tendo sido “complacentes ou cúmplices”, segundo a organização. Em 2015, uma fusão entre a Lafarge e a empresa suíça Holcim deu origem a uma nova empresa, a LafargeHolcim.