Antes da final marcada para este domingo, já croatas e franceses se conheciam de ginjeira. Muito antes. Séculos antes. E de outras andanças. Ainda Napoleão andava por aí a brincar aos conquistadores e a querer toda a Europa sob a alçada dos gauleses, e já os croatas lhe batiam o pé. Mais tarde, já depois da derrota final, terá dito: “Com 100 mil soldados croatas teria dominado o mundo”.

Ora, o episódio foi recordado por Igor Stimac, antigo central e mais tarde selecionador croata, numa entrevista publicada no El País, na véspera do grande duelo – este já dentro de um retângulo de relva.

O croata é o melhor lutador do mundo. Por isso sobrevivemos tantos anos. Quando todos se vão abaixo, nós vamos para cima. Morrer, nunca. Dizer que chega, nunca. Somos assim, é a nossa tradição. Quando um croata veste a camisola da sua seleção, o mundo muda. Sabe o que disse Napoleão? ‘Dá-me 100 mil croatas e conquisto o mundo‘”, referiu Stimac ao jornal espanhol.

Igor Stimac sabe o que diz quando refere a sensação de vestir a camisola croata. O antigo central (hoje com 50 anos) foi, ao lado de Slaven Bilic, o esteio do eixo defensivo da seleção balcânica no França 1998, onde obteve o terceiro lugar, a melhor classificação de sempre num Mundial até esta edição. Como jogador de clubes, teve longa experiência por Inglaterra, onde alinhou pelo West Ham e pelo Derby County. Hoje é treinador, mas o último emblema que orientou foi em 2016/17, o Al-Shahaniya do Qatar. Foi também selecionador croata entre 2011 e 2013, a convite de Davor Suker, presidente da Federação croata e antigo companheiro de equipa nesse Mundial.

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Stimac num duelo com Clarence Seedorf: Croácia venceu Holanda e ficou em terceiro no Mundial de 1998 (Shaun Botterill /Allsport)

Não temos lugar para treinar, a seleção não tem estádio. Mas 90% das receitas dos nossos clubes provêm da venda de jogadores. Não há patrocinadores, não há dinheiro da televisão, não há nada. Há talento e treinadores. Nada mais”, continua Stimac. Mas isso não é uma coisa má, pelo contrário. “As grandes potências investem milhões em campos, em analistas… O futebol é um jogo. De onde vêm os melhores jogadores? Dos ricos?”, questiona para depois responder. “Vêm dos lugares onde não há nada, é aí que está o talento. Nas grandes cidades, onde os miúdos jogam Playstation e brincam com computadores, não há futebol. E a Croácia, graças a Deus, não tem nada”, resume.

Inglaterra foi “arrogante” e França é “a equipa mais forte do Mundial”

A Inglaterra, país que Stimac conhece a fundo, sofreu de um mal antigo neste Mundial. “Eles motivaram-nos muito com a sua arrogância, com as suas declarações. É o que sempre fizeram… Há uns meses não acreditavam na equipa, riam-se dos jogadores e do treinador, e depois começaram com a conversa de que o futebol estava de regresso a casa. Há que respeitar a Croácia. Agora é a oportunidade para lhes dizer: ‘Obrigado, amigos'”. O antigo internacional croata acredita que a seleção balcânica era mais forte. “Éramos superiores em todos os aspetos do futebol. A Inglaterra tinha uma equipa jovem, sem experiência, que estava numa meia final de um Mundial. Os onze que começaram a partida frente à Croácia têm 19 títulos; os onze da Croácia, 86, entre eles nove Champions“, sublinha.

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A França é o rival que se segue e, no entender de Stimac, é “uma equipa diferente” da britânica. “É a formação mais forte do campeonato. Têm 23 jogadores muito bons. Têm juventude, experiência, velocidade, técnica. Temos de estar tranquilos e fazer o nosso jogo”, resume o antigo selecionador, que acredita que no Mundial de 98 as equipas tinham mais qualidade “técnica e física” do que têm hoje. “O futebol mudou muito. Todas as equipas eram muito fortes naquele tempo. A nossa geração também era muito boa: Suker, Boban, Prosinecki, Jarni, Stanic, Bilic, eu… Creio que as equipas do nosso Mundial, o de França, eram melhores do que hoje”.

“Modric? Que a Bola de Ouro termine nas suas mãos”

Luka Modric tem sido o destaque maior de um equipa que está, ela própria, em grande destaque no Mundial. Quando questionado sobre se o médio do Real Madrid é o melhor jogador de sempre da Croácia, a resposta sai pronta: “Claro que sim, sem dúvida”. “Pergunte a Suker, Boban, a quem queira. Todos dizem o mesmo. Esperamos que a Bola de Ouro termine nas suas mãos“, remata.