A Autoridade de Supervisão dos Seguros e Fundos de Pensões (ASF) passou esta quinta-feira, com a publicação de um despacho governamental, a ser o regulador da atividade da Associação Mutualista Montepio Geral, que vai a eleições no dia 7 de dezembro. Esta mudança pode até vir a implicar regras mais apertadas na avaliação de idoneidade do atual líder da Mutualista e candidato à reeleição, Tomás Correia, mas para já pode ter um alvo mais imediato.

Nazaré Barroso, vogal do agora já regulador da Mutualista, a ASF, integra a lista de um dos candidatos às eleições de 7 de dezembro, neste caso a lista B, encabeçada por Fernando Ribeiro Mendes. A eventual incompatibilidade foi avançada pelo Jornal Económico a 11 de novembro, mas a questão ganhou redobrada premência com a publicação do despacho desta quinta-feira. Lista adversária realça isso mesmo.

Mutualista Montepio passa para a supervisão dos seguros. Tomás Correia fica menos seguro?

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A vogal do regulador dos seguros considera que não há qualquer incompatibilidade, tal como Ribeiro Mendes, que dá a cara pela lista. Numa resposta enviada ao Observador, a lista B assume a defesa de Nazaré Barroso:

“A professora Maria de Nazaré Barroso é administradora da Autoridade Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) e muito nos honra com a sua participação na Lista B. Até à data, a Associação Mutualista Montepio Geral (AMMG) não esteve sujeita a supervisão da ASF. Significa isto que a professora Maria de Nazaré Barroso nunca teve acesso a qualquer informação, muito menos privilegiada, sobre a AMMG. Se, no decurso da próxima semana, a ASF for chamada a deliberar sobre qualquer questão da AMMG, a professora declarar-se-á impedida ou pedirá escusa. Nada lhe pode ser assacado, seja no plano ético, seja no plano jurídico”.

Mas essa justificação pode não cobrir o futuro. A lei-quadro dispõe que “depois da cessação do seu mandato e durante um período de dois anos os membros do conselho de administração não podem estabelecer qualquer vínculo ou relação contratual com as empresas, grupos de empresas ou outras entidades destinatárias da atividade da respetiva entidade reguladora”. Ou seja, caso Ribeiro Mendes vença as eleições de 7 de dezembro, Nazaré Barroso pode ou não entrar para uma das suas reguladas.

A defesa de Nazaré Barroso neste aspeto assenta noutras matérias, como explicou ao Observador uma fonte da lista B. A primeira é de natureza jurídica: a vogal da ASF foi nomeada em 2012, ou seja antes da entrada em vigor da lei-quadro das entidades reguladoras.  Há um entendimento, suportado por especialistas em direito administrativo ouvidos pelo Observador, de que a entrada em vigor da lei-quadro não pode ter efeitos retroativos para quem tenha sido nomeado antes, pois esta pessoa terá entrado em funções com o pressuposto de que, ao terminar a sua função, poderia prosseguir a carreira no seu setor. Mas esse entendimento “não é unânime”, defendem. Ou seja, há juristas que defendem que a incompatibilidade teria mesmo de se aplicar.

A lei-quadro também diz que os reguladores não podem “manter, direta ou indiretamente, qualquer vínculo ou relação contratual, remunerada ou não, com outras entidades cuja atividade possa colidir com as suas atribuições e competências”. Em ambos os casos, a defesa de Nazaré Barroso é a mesma: não teve, na ASF, qualquer relacionamento de supervisão com a Associação Mutualista. Logo, não há incompatibilidade por pertencer a uma lista candidata, nem pode ser impedida de entrar para a Associação Mutualista quando sair da ASF.

A isto junta-se outro elemento: a vogal também está em gestão corrente há mais de um ano e dois meses, uma vez que o mandato da atual administração da ASF terminou sem que tenha sido nomeada uma nova.

Só que o argumento de que a ASF não é o supervisor da Mutualista Montepio terminou. O despacho desta quinta-feira mudou o quadro. Nazaré Barroso já pode, caso a ASF assim o queira, pedir e ter acesso a informação da Associação Mutualista. Por isso mesmo a lista B sublinhou, na resposta ao Observador que, “se a ASF for chamada a deliberar sobre qualquer questão da AMMG, a Senhora Professora declarar-se-á impedida ou pedirá escusa”. Até às eleições de 7 de dezembro, o Conselho de Administração da ASF terá apenas uma reunião para deliberar sobre os temas de supervisão.

Quem não aceita a explicação é a lista C, liderada por António Godinho. Em resposta escrita enviada ao Observador, Godinho considera que o despacho publicado “significa ainda que, a partir de hoje, poderemos estar perante outra eventual incompatibilidade, pois um dos membros da Lista B, encabeçada por Ribeiro Mendes, integra o agora oficialmente órgão regulador da Associação Mutualista, a Autoridade de Supervisão dos Seguros e Fundos de Pensões”. Neste caso Nazaré Barroso, que na lista de Ribeiro Mendes surge apontada para um lugar no conselho de administração.

O Observador contactou a ASF para obter mais esclarecimentos sobre o assunto, mas não obteve resposta do responsável pelos contactos com a imprensa.