O advogado de um dos 44 arguidos do processo sobre a invasão à Academia de Alcochete pediu, esta quarta-feira, a nulidade da principal prova do caso: os registos telefónicos. Carlos Melo Alves pediu a palavra logo no início da sessão, antes de se avançar para as alegações dos seis arguidos que pediram esta fase facultativa do processo, e que pretendem que o caso não vá para julgamento. Já da parte da tarde foi a procuradora do Ministério Público, Cândida Vilar, quem pediu para acrescentar provas novas ao processo, ao mesmo tempo que pediu que as medidas de coação de alguns dos seis arguidos que pediram a instrução fossem alteradas de preventiva para domiciliária.

Logo pela manhã, com cerca de 30 arguidos na sala, entre eles o ex-presidente do Sporting, Bruno de Carvalho, Melo Alves pediu a palavra ainda antes de arrancarem as alegações. No pedido que fez ao juiz,em que basicamente fundamentou a nulidade as provas, lembrou que o Ministério Público pediu à MEO, à Altice e à Vodafone uma listagem de todos os telemóveis que foram usados naquele dia 15 de maio de 2018 na zona da Academia de Alcochete. Ou seja, todos os que ativaram as antenas das operadoras naquela zona. O que significa que ficou na posse de todos os registos telefónicos das pessoas que ali estavam, incluindo jogadores e pessoal da equipa técnica. “É nulo porque viola a Constituição da República Portuguesa”, justificou o advogado, explicando que esta recolha de prova viola direitos tão básicos como o da privacidade de pessoas que nada tinham a ver com o caso.

Todos foram considerados suspeitos, mesmo jogadores e equipa técnica por causa deste despacho”, acrescentou.

O advogado disse mesmo ter havido “total ausência de controlo jurisdicional sobre dados comunicacionais colhidos”. Dando o exemplo de que os dados recolhidos pela Meo foram entregues a um analista, enquanto os da Vodafone foram remetidos para a polícia “que teve a possibilidade de escancarar a vida de todos aqueles que estavam no local”, em vez de mandar ao juiz.

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O advogado do arguido Emanuel Calças foi mais longe ainda. E lembrou que, mesmo depois de escrutinadas as listas telefónicas e de se perceber quais os telefones que deviam inspecionar, investigou-se material ao qual não era suposto aceder. “Segundo a lei do Cibercrime, a pesquisa deve ser limitada. O legislador não passou uma carta branca ao tribunal para pesquisar todo o telemóvel”, revelou, explicando que hoje em dia o telemóvel funciona hoje como uma “extensão da personalidade” com registos pessoais.

Além destas provas, fundamentais para o Ministério Público perceber quem combinou o ataque à Academia e quem compareceu no local, o advogado pediu também o que já outros advogados do processo tinham tentado: declarar nulas algumas das diligências feitas pela GNR, por não ter havido despacho de delegação de competência naquela policia, uma vez que o crime de terrorismo é da competência da Polícia Judiciaria.

“Se a PJ não compareceu no local foi porque não quis. O ataque à Academia foi transmitido nas televisões (…) não compete ao Ministério Público chamar polícias”, respondeu, na sua vez, a procuradora que conduziu a investigação.

Cândida Vilar admitiu que, de facto, não houve despacho de delegação de competências até os arguidos serem apresentados ao juiz, mas que esteve sempre presente nas inquirições de testemunhas feitas pela GNR — até porque alguns jogadores não falavam bem português, como era o caso de Bas Dost. A procuradora referiu que, em relação a outras diligências, como a recolha de prova no local, não era necessária essa delegação. E que autorizou fazê-las como autorizaria a qualquer outra polícia.

Já quanto ao facto de se tratar de um crime de terrorismo, a procuradora socorreu-se da mesma lei que o advogado para lembrar precisamente a excecionalidade deste caso. “Era só o que faltava perante um caso de terrorismo estarmos à espera de reuniões para definir o que fazer. Todas as forças e serviços de segurança têm obrigação de aparecerem no local do crime”, disse. Lembrando que, na altura, o nível de ameaça já era elevado por causa do que aconteceu na Madeira e no aeroporto nos dias anteriores.

“A PSP contactou mesmo Bruno de Jacinto. Compete às Forças e Serviços de Segurança definir o nível de ameaça, se as polícias não comparecem, não sei o que dizer”, disse Cândida Vilar.

Quanto aos registos telefónicos, a procuradora continua sem encontrar “qualquer falha”. “As listagens visaram numa primeira fase saber quem esteve no local, não há nada que imponha que tenha que ser em 15 dias, e o juiz validou. Aquilo é dado num CD e compete ao avalista, neste caso com a colaboração da PSP”analisar. A magistrada sustentou que, durante a investigação. se procuraram informação específicas, como conversas via WhatsApp, e que o sistema que as autoridades usam para estas perícias nem sequer lhes permite verem tudo o que está nos aparelhos.

Pelo menos doze advogados aderiram ao requerimento de Carlos Melo Alves. O juiz Carlos Delca estava pronto para decidir sobre se havia ou não nulidades, mas o advogado aconselhou-o a tomar a posição só na decisão instrutória “com a devida calma”. E o juiz aceitou.

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Ministério Público traz mais provas em dia de debate instrutório

Segundo o Expresso, logo no arranque da segunda parte da sessão,  a procuradora Cândida Vilar veio pedir ao juiz para juntar mais provas ao processo, que segundo ela terão chegado já depois de proferida a acusação. Trata-se de exames periciais feitos aos telemóveis dos arguidos pela GNR — o que mais uma vez gerou a reação do advogado Carlos Melo Alves. “Porque não os junta na fase de julgamento? Com imensa penas temos de pedir prazos”, disse, explicando que as provas têm que ser vistas pela defesa, sob o risco de serem consideradas nulas.

Estas novas provas incluem informações sobre André Geraldes, antigo braço-direito de Bruno de Carvalho, cujas perícias ao telemóvel tiveram que ser feitas no estrangeiro.  O Correio da Manhã garante que estes exames atingem Bruno de Carvalho e o líder da Juve Leo, Mustafá.

Em alegações, a magistrada falou de cada um dos 44 arguidos e da sua intervenção no processo. Apesar de Bruno de Carvalho ter dito nesta fase que nada fez para motivar o ataque que os adeptos fizeram à academia e de recusar ter  incentivado o aperto aos jogadores, Cândida Vilar mantém que existem provas contra ele e que deve manter-se sob a obrigação de apresentar-se diariamente na esquadra policial da sua área de residência.

Depois pediu que os arguidos Bruno Jacinto (oficial de ligação) e Nuno Torres (condutor do automóvel identificado na Academia) passassem para prisão domiciliária. Tê-lo-á feito em relação a mais alguns arguidos, não todos. Já em relação a Elton Camará, um dos arguidos que pediu a abertura de instrução e que acabou numa azeda troca de palavras com a magistrada e a ser convidado pelo juiz a abandonar a sala. Depois de, a pedido da própria família se ter acalmado, acabou por não suportar a descrição de Cândida Vilar e gritar que tinha oito filhos para criar, mas que a magistrada lhe tinha destruído a vida. Acabou por ser levado pela PSP para fora da sala.

Durante as alegações, Cândida Vilar lembrou que se os arguidos fugiram da Academia quando a GNR chegou foi porque algo tinham feito. “Se tivessem ido lá falar com os jogadores não tinham fugido”, chegou a dizer.

O debate instrutório do processo que envolve 44 arguidos, entre eles o ex-presidente do Sporting, Bruno de Carvalho, acusados de terrorismo por terem invadido a Academia do Sporting começou esta quarta-feira no Campus de Justiça, em Lisboa. Estão mais de 30 arguidos na sala, entre eles Bruno de Carvalho. Os arguidos vão tentando ouvir o que os advogados e os magistrados dizem, ao mesmo tempo que olham para trás na tentativa de verem os seus familiares.

Depois do Ministério Público, já só o assistente do processo teve tempo de alegar. Miguel Coutinho nada pediu em relação aos arguidos, descreveu apenas o que o Sporting passou por causa deste episódio.

Nesta sessão, os advogados dos seis arguidos que pediram a abertura de instrução vão tentar derrubar a tese do Ministério Público para evitar o julgamento. Todos os outros arguidos que não pediram a instrução podem beneficiar desta decisão.

O Ministério Púbico acusa-os,  ao longo de 143 páginas, de terem organizado o ataque aos jogadores do Sporting na Academia de Alcochete, a 15 de maio e 2018. No total, são 4441 crimes de terrorismo, sequestro, ofensa à integridade física qualificada, ameaça agravada (estes classificados como terrorismo e, por isso, com pena mais pesadas do que na sua forma simples), detenção de arma proibida, dano com violência, resistência, entre outros.

Bruno de Carvalho, ex-presidente do Sporting, Nuno Mendes ‘Mustafá’, líder da Juve Leo, e Bruno Jacinto, antigo Oficial de Ligação aos Adeptos, estão acusados, como autores morais, de 98 crimes cada.

A próxima sessão do debate instrutório, em que os advogados dos seis arguidos deverão alegar, está marcada para segunda-feira, pelas 10h00.

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