Em terras moçambicanas, o Papa Francisco invocou esta quinta-feira o nome de uma lenda daquele país: Eusébio da Silva Ferreira, o “Pantera Negra”. Num discurso perante jovens de diferentes comunidades e religiões, no Pavilhão Maxaquene, em Maputo, o líder católico usou o exemplo do jogador de futebol do Benfica e da Seleção Nacional para mostrar que o sonho e a paixão devem ser uma constante ao longo da vida. Eusébio, lembra o Papa, não se resignou” e nem mesmo “as graves dificuldades económicas da família ou a morte prematura do pai” impediram os seus sonhos.

A sua paixão pelo futebol fê-lo perseverar, sonhar e continuar. Não faltavam razões para se resignar e não se resignou. O seu sonho e vontade de jogar lançaram-no para diante”, declarou o pontífice da igreja.

E, como qualquer jogador de futebol, também Eusébio teve de “encontrar uma equipa para jogar”: “Bem sabeis que, numa equipa, não são todos iguais nem fazem as mesmas coisas ou pensam da mesma maneira”. E foi mesmo essa a mensagem que Francisco tentou passar àqueles jovens: a ideia de que, apesar de sermos todos diferentes, é sempre possível “encontrarmo-nos”.

Vós juntos, assim como estais, sois o palpitar deste povo, onde cada um desempenha um papel fundamental, num único projeto criador, para escrever uma nova página da História, cheia de esperança, paz e reconciliação”, acrescentou Francisco.

O Papa assinalou ainda o exemplo da moçambicana Lurdes Mutola, ex-campeã olímpica e mundial dos 800 metros em atletismo. “Tendes diante dos olhos aquele belo testemunho dado por Mutola, que aprendeu a perseverar, continuar a tentar, pensar em cumprir o sonho de uma medalha de ouro nos jogos olímpicos”, disse. “É preciso não se deixar bloquear pela insegurança. Não se deve ter medo de arriscar e cometer erros. É normal, as coisas mais belas formam-se com o tempo”, concluiu Francisco.

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Os jovens que ouviam o líder católico aplaudiram o discurso e gritaram “Reconciliação!”, a pedido do Papa, no fim do discurso.

“O sacerdote é uma pessoa muito pequena, o servo mais inútil”

Num outro discurso, desta feita frente a bispos, sacerdotes, seminaristas, catequistas e animadores, na Catedral da Imaculada Conceição, em Maputo, o Papa defendeu que “a crise de identidade sacerdotal” deve ser ultrapassada com a propagação de uma prática religiosa mais próxima das pessoas e com compaixão pelos que mais sofrem. “Perante a crise da identidade sacerdotal, temos que voltar aos lugares para onde fomos chamados” pela vocação de servir, afirmou Francisco esta quinta-feira.

O chefe da Igreja Católica, retratando uma realidade muito comum em Moçambique e em África, declarou que a comunidade se entristece “com os que choram a perda de um querido, o menino que ficou órfão, aquela mãe que morreu de Sida e com a avó encarregada de tantos netos”.

A comunidade católica, prosseguiu, deve também estar atenta ao desemprego nas cidades, que levam ao desespero jovens migrados do campo. “Para nós, sacerdotes, as histórias do nosso povo não são o noticiário [para mediatização]”, porque, salientou, “conhecemos a nossa gente, podemos adivinhar o que se passa nos seus corações, sofrendo com eles”.

O catolicismo, prosseguiu, deve evitar sucumbir ao mundanismo material estimulado pelo consumo excessivo, seguindo a austeridade.

Ninguém de nós é chamado para um lugar importante, o sacerdote é uma pessoa muito pequena, o mais pobre dos homens, o servo mais inútil”, insistiu o Papa.

O Papa elogiou a inserção da Igreja Católica nas comunidades moçambicanas, enfatizando a necessidade de compreensão das dificuldades que as populações enfrentam. “Obrigado pelos vossos testemunhos que falam das horas difíceis que se vive, mas admirando a misericórdia de Deus”, agradeceu.

O Papa Francisco cumpre esta quinta-feira o primeiro de dois dias da visita a Moçambique, depois te ter chegado na quarta-feira a Maputo, no âmbito de um périplo por África, que o levará também a Madagáscar e às Maurícias.

Francisco é o segundo chefe máximo da Igreja Católica a deslocar-se a Moçambique, depois de João Paulo II ter visitado o país em 1988.