Menos de 24 horas depois de Pedro Sánchez ter contado com o apoio do partido unionista Ciudadanos para prolongar o estado de emergência, o líder da Esquerda Republicana da Catalunha avisou-o de que ao repetir aquele gesto deixará de contar com o apoio dos independentistas, que viabilizaram a investidura do atual governo em janeiro.

“É evidente que o PSOE tem que se decidir se se atira para os braços do Ciudadanos ou se quer manter as maiorias da investidura”, disse Oriol Junqueras, numa entrevista por escrito à Ràdio 4, divulgada esta quinta-feira de manhã. “Está claro que está nas suas mãos, mas não pode continuar como até aqui. Não se pode impor decisões por medo do Vox.”

Foi quanto bastou para que, no Governo de Espanha, voltassem a soar o alarme perante a periclitante base de apoio que sustenta a atual solução governativa. Formada em maioria pelo PSOE e em minoria pelo Unidas Podemos, contou com o apoio do Partido Nacionalista Basco (PNV, na sigla espanhola) e com a abstenção da ERC, que ao ficar a meio caminho viabilizou a tomada de posse de Pedro Sánchez.

Esta solução foi posta à prova esta quarta-feira quando, na votação da prorrogação do estado de emergência, o Ciudadanos alinhou ao lado do Governo e a ERC, pela primeira vez, votou contra a proposta levada ao Congresso dos Deputados.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Nós somos um governo progressista”

As declarações de Oriol Junqueras foram recebidas com preocupação, a julgar pela reação da vice-Presidente de Governo, Carmen Calvo. Recuperada de um internamento por Covid-19 (esteve presente na sessão parlamentar de quarta-feira, onde passou grande parte do tempo debaixo de uma manta), disse esta quinta-feira à TVE que “não houve nenhuma alteração de parceiros”.

“Nós somos um governo progressista e teríamos gostado que um partido de esquerda como a ERC tivesse continuado a participar [na maioria]”, disse, referindo que o voto daquele partido independentista causou “incompreensão e perplexidade”.

“O nosso compromisso, e que mantemos, é o de dialogar para que a Catalunha tenha um futuro”, disse ainda Carmen Calvo.

Se do lado da ERC sobram razões de preocupação para o PSOE e para o Unidas Podemos, no que toca ao PNV a mensagem é, para já, de apoio.

“Não é bom mudar de cavalo a meio do rio”, disse Andoni Ortuzar, presidente do PNV. Mas compreende: “Ontem o Governo foi obrigado a isso para salvar a votação e foi para o Ciudadanos. Mas a coerência política será concedida pelos [partidos] da investidura. Não creio que um partido como o Ciudadanos, que luta pela sua sobrevivência, lhe possa dar apoio.”

Já ontem, a própria presidente eleita do Ciudadanos, Inés Arrimadas, deu provas de que ter apoiado o prolongamento do estado de emergência não é sinónimo de que vá apoiar o Governo de Pedro Sánchez.

“Hoje não se vota a investidura do senhor Sánchez. E depois desta votação o Governo continuará a ter 155 assentos parlamentares, nem mais nem menos”, disse, aludindo aos 21 que lhes faltam para uma maioria no Congresso dos Deputados.

“Temos sido, somos e continuaremos a ser muito críticos e vamos denunciar firmemente os enormes erros do Governo, mas estendemos a mão para tentar que esses erros não sejam repetidos e para que sejam corrigidos.”

Junqueras insiste em eleições antecipadas na Catalunha

Carmen Calvo fez ainda menção ao clima de pré-campanha que se vivia na Catalunha já antes da pandemia e que, nesta altura, começa a ser retomado. Na Catalunha, o governo regional é dividido entre a ERC e o Juntos Pela Catalunha (JPC), que voltarão a concorrer em listas separadas numa altura de várias discordâncias entre estes dois partidos independentistas.

“Estão muito embrenhados na competição eleitoral, vêm a árvore em vez da floresta”, disse Carmen Calvo.

Na mesma entrevista à Ràdio 4, Oriol Junqueras quis apressar Quim Torra, presidente do governo regional catalão e político do JPC, a chegar a um acordo para marcar eleições.

“Não podemos deixar que os tempos políticos e eleitorais sejam definidos pelo Tribunal Supremo, mas sim pelas forças políticas que dão apoio ao governo catalão”, disse Oriol Junqueras, preso em regime semi-aberto e a cumprir pena de 13 anos pelos crimes de sedição e desvio de fundos públicos para realizar o referendo independentista de 1 de outubro de 2017.