Ainda não se poderá afirmar que Portugal está a entrar numa segunda vaga da pandemia, mas é claro que estamos numa fase de crescimento — a terceira —, no entanto, ainda é possível “inverter ou reduzir o processo de crescimento”, referiu Baltazar Nunes, epidemiologista do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (Insa), durante a conferência de imprensa da Direção-Geral da Saúde, esta sexta-feira.

“Estamos numa terceira fase de crescimento” do número de casos, disse Baltazar Nunes. O epidemiologista explicou que a primeira fase decorreu entre março e abril, no início da pandemia; a segunda fase entre maio e junho, sobretudo na região de Lisboa e Vale do Tejo; e a terceira fase iniciou-se em agosto e teve maior expressão no final do mês de agosto e em setembro.

“A evolução desta terceira fase de crescimento vai depender muito da efetividade das medidas de saúde pública que estão implementadas ou que estão planeadas para ser implementadas, nomeadamente as que estão associadas ao estado de contingência, as que correspondem às medidas em contexto escolar e à efetividade da identificação dos casos, do seu seguimento e do seu isolamento”, disse Baltazar Nunes.

A terceira fase é evidente porque tem havido um crescimento sustentado em todo o país, mas sobretudo nas regiões do Norte, Centro e Lisboa e Vale do Tejo, referiu o epidemiologista. Nestas três regiões, há mais de três semanas que o R é superior a 1,0 — o que significa que a cada geração de novos casos, há um aumento da incidência (cada pessoa infeta mais do que um dos seus contactos próximos). O R é maior do que 1,0 há 50 dias no Norte, 25 dias no Centro e 24 em Lisboa e Vale do Tejo (LVT).

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Para o período de 9 a 13 de setembro, o valor médio de R foi 1,15, estando o Alentejo com o R mais alto, 1,45. Nas restantes regiões o R está próximo da média nacional: 1,10 no Norte, 1,19 no Centro, 1,16 em LVT e 1,20 no Algarve.

O outono que se avizinha vai obrigar a que se mantenha a pandemia de Covid-19 sob controlo, ao mesmo que se evita um surto de gripe que possa comprometer os serviços de saúde. É por isso que a diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, lembrou que “começar a vacinar mais cedo, mas suficientemente próximo da época da gripe para que a vacina ainda produza efeito” é “outra das grandes estratégias”.

350 mil doses na primeira fase da vacina da gripe

As campanhas de vacinação contra a gripe costumam começar em meados de outubro, mas este ano o início da campanha vai ser antecipado para 28 de setembro. Vai contar com mais doses disponíveis — cerca de dois milhões — e incluir mais grupos de risco, por exemplo, as grávidas vão poder aceder à vacina gratuitamente.

Na primeira fase da campanha de vacinação, vão ser usadas 350 mil doses da vacina da gripe, nos “mais prioritários entre os grupos de risco”, explicou Graça Freitas: pessoas residentes em estruturas residenciais para idosos ou em outras estruturas residenciais quando configurem grupos de risco, profissionais de saúde e do setor social que prestam cuidados e grávidas.

Após este período serão recebidas mais doses e, a partir de 19 de outubro, podem começar a vacinar-se os restantes grupos, disse Graça Freitas: pessoas com 65 anos ou mais e pessoas com doenças crónicas. A ideia é que todos possam ser vacinados o mais rapidamente possível, disse a diretora-geral da Saúde. Graça Freitas referia-se, naturalmente, as vacinas disponibilizadas gratuitamente pelo Serviço Nacional de Saúde, outras estarão disponíveis para compra nas farmácias.

Se a gripe e a Covid-19 se encontrarem “pode ser dramático”. O que fazer então? Testar rápido e isolar

Graça Freitas apelou a que “todos aqueles que têm indicação para se vacinar que o façam”. E explicou a importância de evitar uma gripe: “Convém não ter outras infeções respiratórias que se possam confundir com a Covid-19”. A ideia é também que não se assista a um esgotamento da capacidade dos hospitais ou a um aumento da mortalidade.

Gripe, Covid-19 e ondas de calor explicam o aumento da mortalidade

Questionada sobre o aumento da mortalidade em relação ao que era expectável, segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística, Marta Temido citou um estudo do Insa que analisou esse aumentou em três períodos distintos e concluiu que “os resultados não sugerem que a menor utilização de urgências hospitalares e de consultas em cuidados de saúde primário tenha intensificado o efeito do período de temperaturas elevadas observados em junho e agosto sobre a mortalidade”.

Ou seja, não foi encontrada evidência de que tenha sido o receio de procura de ajuda médica ou a falta de capacidade dos serviços de saúde de continuarem a acompanhar os doentes não-covid que justificam este aumento de mortes.

Mortalidade subiu quase 10% desde março face à média registada desde 2015

Baltazar Nunes, epidemiologista do Insa, explicou porquê. “A forma como variou a mortalidade neste período de tempo [de janeiro ao final de julho] apresenta claramente picos, ou seja, aumento do número de óbitos que são concordantes com três períodos”, diz. “Se a principal causa estivesse relaciona com a diminuição do acesso aos cuidados de saúde, o aumento de mortalidade não teria um comportamento de subida e descida.”

Estes três períodos são: em janeiro-fevereiro, ainda compatível com a época da gripe; em março-abril, durante o pico da epidemia de Covid-19; e em junho e agosto durante o período de onda de calor.

Comparar com a média da mortalidade dos últimos cinco anos é um indicador, diz Baltazar Nunes, “mas é um indicador frágil na perspetiva de perceber quais é que são os fatores associados a esse aumento de mortalidade”. Além disso, qualquer estimativa, neste momento, é precoce, porque os dados ainda não estão estabilizados, disse o epidemiologista.

O número de mortos continua a aumentar em Portugal com seis mortes, associadas à Covid-19, nas últimas 24 horas: três de idosos com mais de 80 anos e outras três de pessoas com idades entre os 40 e os 69 anos, com comorbilidades associadas, informa a ministra da Saúde, Marta Temido. Todas as mortes foram registadas na área de Lisboa e Vale do Tejo (LVT).

Segundo a ministra, a taxa global de letalidade situa-se nos 2,8%, sendo que a taxa de letalidade acima dos 70 anos está nos 14,2%.

71% de taxa de ocupação nas unidade de cuidados intensivos de nível 3

Nas últimas 24 horas, Portugal registou 780 novos casos. A área de LVT foi a que registou o maior número de novos casos de infeção — 426, 54,6% —, seguido da região Norte, com 250 casos (32,1%). O Centro registou 46 casos, o Alentejo 36, o Algarve 20 e a Madeira 2. Os Açores foram a única região que não registou casos nas últimas 24 horas.

Marta Temido destacou, no entanto, que se “regista uma menor utilização de serviços de saúde em termos de cuidados hospitalares em internamento”. Concretamente há menos 15 pessoas em internamento desde ontem — agora 465 — e menos duas nos cuidados intensivos — totalizando 57.  A ministra sublinha que Portugal tem “71% de taxa de ocupação nas unidade de cuidados intensivos de nível 3”. Logo, “não estamos com atividade assistencial suspensa”, esclarece a ministra.

“Estamos numa situação em que a rede do Serviço Nacional de Saúde continua a responder”, concluiu a ministra da Saúde.

Os casos de internamento hospitalar representam assim 0,7% dos casos, enquanto 29,4% dos casos estão a recuperar em casa. A ministra da Saúde acrescentou que 67,1% dos infetados já estão recuperados.

Existem, atualmente, 20.229 casos ativos, muitos deles associados a surtos, informou Marta Temido. Define-se como surto sempre que há mais de dois casos com ligação epidemiológica detetada e existem 265 no país: 127 na região Norte, 78 em Lisboa e Vale do Tejo, 26 no Centro, 21 no Algarve e 13 no Alentejo.

Reforçar equipas e detetar os novos casos

Marta Temido destacou ainda a importância da identificação dos casos de infeção e da quebra de cadeias de transmissão, com as equipas multidisciplinares a visitarem os doentes em casa para que se possa “satisfazer as necessidades sociais de forma a melhorar a adesão ao confinamento”.

Além das cinco equipas multidisciplinares que já tinham sido criada na Área Metropolitana de Lisboa (AML), foram criadas outras cinco também nesta região. “O objetivo continua a ser controlar a doença sem fechar”, disse a ministra da Saúde, reforçando as palavras do primeiro-ministro, António Costa.

“A vida é muito mais complexa do que apenas fechar ou confinar — isso foi uma lição que todos aprendemos. E está nas mãos de cada um de nós controlar a evolução da doença”, afirmou a ministra da Saúde.

Marta Temido lembrou, por isso, que “nenhuma medida isolada por si só é suficiente para controlar a doença”. Além do distanciamento físico, uso de máscara, lavagem das mãos e etiqueta respiratória, a ministra da Saúde apelou ao uso da aplicação Stayaway Covid. E deixou uma mensagem para os infetados: “Inserir o código é uma medida de solidariedade”.

Naturalmente, que também é preciso reforçar a capacidade de testagem e esse é um dos compromissos do Ministério da Saúde. No dia 16 de setembro, por exemplo, foi batido o recorde de número de testes de diagnóstico realizados num só dia, 23.289, os quais registaram 4,6% de casos positivos, informou Marta Temido.

DGS reúne com Santuário de Fátima para preparar o 13 de outubro

Entre os assuntos do momento, está a realização das celebrações do 13 de outubro no Santuário de Fátima. Para avaliar a realização do evento, a Direção-Geral da Saúde e o secretário de Estado Adjunto e da Saúde vão reunir-se na próxima segunda-feira com os responsáveis do Santuário.

A diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, está confiante que da reunião sairá “uma solução que não ponha a saúde pública em risco”. “É com toda a serenidade e com toda a confiança que aguardamos esta reunião. Desta reunião surgirá um plano de ação concretamente em relação ao dia 13 de outubro.”

Delegada de Saúde Pública defende 13 de outubro em Fátima sem peregrinos

A questão sobre as celebrações em Fátima levantou-se porque a delegada de Saúde Pública do Médio Tejo, Maria dos Anjos Esperança, defendeu que as cerimónias religiosas do 13 de outubro no Santuário de Fátima, deveriam decorrer “sem a presença de peregrinos”, como aconteceu a 13 de maio. Mas Graça Freitas deixa claro que a questão do Santuário de Fátima é de âmbito nacional e não local: “É uma questão de âmbito nacional e será tratada como tal pela abrangência de peregrinos que lá poderão ir em determinadas datas.”