É uma das dúvidas práticas mais comuns nos últimos dias: com a vacinação contra a Covid-19 dos idosos acima dos 80 anos a arrancar durante esta semana em vários pontos do país, o sistema de agendamento através de SMS tem levantado sérias questões relativamente à quantidade de idosos que poderão ficar por contactar por não terem telemóvel — ou por não terem conhecimentos que lhes permitam ler e responder a mensagens de texto.

É nestes casos que vão entrar em cena as unidades de cuidados de saúde primários e as juntas de freguesia, de modo a que ninguém fique de fora, segundo explicou esta quarta-feira, na SIC Notícias, o diretor-executivo do Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) do Baixo Mondego, José Luís Biscaia, dando o exemplo prático do que acontecerá naquela região, que abrange 10 concelhos do distrito de Coimbra.

Idosos sem telemóvel? Autarquias vão ajudar a contactar todos

“Se 70% das pessoas com mais de 80 anos tiverem telemóvel, resolvemos um problema. Os outros 30%, como é que vão fazer? Numa lógica de proximidade”, explicou José Luís Biscaia. “As unidades de saúde, os cuidados de saúde primários, têm um registo e sabem, se não completo, pelo menos a grande maioria das pessoas que estão isoladas, em casa, dependentes, e às quais prestam cuidados de saúde.”

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Consequentemente, as autoridades de saúde vão cruzar as suas listas de cidadãos a vacinar com as listas das juntas de freguesia, de modo a que seja possível identificar quem são as pessoas que não é possível contactar pela vida do SMS.

Vacinação a idosos arranca esta quarta-feira, mas só em Lisboa

“Posso dar o meu exemplo concreto, do ACES do Baixo Mondego. Já entrei em contacto, já falei com todas as autarquias. As autarquias, neste momento, são uma peça fundamental neste processo — e todas elas têm sido de uma disponibilidade, de uma colaboração inexcedível”, explicou José Luís Biscaia. “Têm as suas redes de ação social, que têm identificado — como se verificou durante a pandemia — os idosos isolados, os idosos dependentes, os idosos que não têm mecanismo de subsistência.”

“Vamos utilizar essa rede para qualificar a lista dessas pessoas de mais de 80 anos, que sabemos que ou não têm telemóvel, ou que estão em situações de isolamento, para agendá-las, com o apoio das autarquias. Quer com os circuitos de mobilidade, com os transportes, para garantir que o fazemos, ou no domicílio, ou nos centros de vacinação que estão a ser definidos”, continuou o responsável.

José Luís Biscaia confirmou que, no caso do ACES do Baixo Mondego, todas as juntas de freguesia já estão alerta para esta colaboração. “Iremos partilhar estas listas dos mais de 80 anos, para criar a identificação de pessoas que precisam de um recurso, de um apoio, de como podemos agendar essas pessoas, para ninguém ficar para trás“, disse. “Penso que vai ser esta parceria virtuosa com as autarquias, com a informação que existe de um lado e do outro, que vai ultrapassar esse problema.”

“Se, em 100 pessoas, 70 receberem um SMS e responderem que ‘sim, quero ser vacinado’, fica o dia agendado; às outras 30, as unidades de saúde vão telefonar”, disse, explicando que os contactos serão feitos “pelos centros de saúde, pelas Unidades de Saúde Familiar, pelas Unidades de Cuidados de Saúde Personalizados, etc.”

Na terça-feira, o Ministério da Saúde disse que já tinham sido enviadas, até ao momento, cerca de 850 SMS para marcação das vacinas, tendo cerca de 370 agendamentos sido confirmados. Um SMS não respondido ou com resposta negativa origina novo SMS e, se também isto falhar, será usada outra forma de contacto, como contacto telefónico. O único número fidedigno de origem destas mensagens é o 2424.

Doentes com mais de 50 anos também vão ser identificados e contactados

Outra dúvida prende-se com a identificação dos cidadãos com mais de 50 anos e um conjunto de patologias (doença coronária, insuficiência cardíaca, insuficiência renal e doença pulmonar obstrutiva crónica) associadas aos casos mais graves de Covid-19. Também neste caso, o sistema de saúde deverá ser capaz de identificar as pessoas em questão sem que seja necessário que os cidadãos se dirijam a nenhuma instituição.

“O módulo de agendamento tem uma agenda, onde estão lá todos os cidadãos portugueses que têm o número nacional de saúde. Todos nós temos”, disse José Luís Biscaia. A partir dessa lista, serão aplicados os critérios de idade para obter as listas dos cidadãos acima dos 80 anos e acima dos 50 anos. De seguida, a lista de cidadãos entre os 50 e os 79 anos será sujeita a um novo filtro.

O médico da região Centro deu vários exemplos sobre como isso será feito sem que ninguém fique de fora. Por exemplo: “O utente está inscrito na minha lista, José Luís Biscaia, médico de família na Figueira da Foz, é um utilizador habitual, tem no seu processo clínico a informação de que tem insuficiência cardíaca, teve um enfarte, insuficiência renal. Esse aparece na lista com esta qualificação e subirá no grau de prioridade.”

Por outro lado, imagine-se “um utente que está inscrito na minha lista e não vem normalmente, não tem uma relação comigo, não vai à unidade de saúde, mas é frequentador do hospital, vai aos hospitais públicos, utiliza a urgência, vai à consulta externa de cardiologia”, exemplificou José Luís Biscaia “Essa mesma informação clínica, que está registada informaticamente, também migra desta informação, através do registo de saúde eletrónico. Também qualifica esse utente.”

Por fim, há ainda “a situação do cidadão que não tem médico de família, não está inscrito, é um utilizador exclusivo dos cuidados de saúde primários”, acrescentou. “Da mesma maneira — neste momento já está a funcionar —, pode contactar o seu médico privado, a sua clínica, e esse médico vai ao suporte eletrónico da prescrição de medicamentos e, da mesma maneira que prescreve uma receita sem papel, prescreve uma declaração médica a dizer que aquele doente é portador desta ou daquela morbilidade“, explicou o médico, garantido que “essa informação migra para esta lista” e qualifica o doente.

“As pessoas não precisam de fazer nada. Vão receber o SMS ou vão receber o telefonema em casa”, assinalou José Luís Biscaia, garantindo que as irregularidades que têm ocorrido são estatisticamente pouco significativas e que o processo de vacinação “está a ser um sucesso”.