Dia um e a campanha de João Ferreira em Lisboa já está em movimento. Literalmente: a manhã começou, para o candidato da CDU, com uma volta de bicicleta pela cidade, a terminar quatro quilómetros depois com um estacionamento sem percalços em Sete Rios. O passeio era um pretexto para falar da mobilidade em Lisboa, mas também serviu para falar de política e explicar os termos em que os comunistas querem ajudar a governar a cidade.
A pergunta tinha a ver com a entrevista que Jerónimo de Sousa deu esta segunda-feira à Renascença, em que afastava a hipótese de o PCP fechar “coligações pós-eleitorais” com o PS em Lisboa, caso Fernando Medina consiga a reeleição. A resposta serviu para explicar que, embora os comunistas não queiram mesmo alinhar em coligações — nem diluir o seu discurso de campanha, que deve servir para “mobilizar o seu eleitorado” –, isso não implica que não queiram assumir pelouros ao lado do PS.
Com a bicicleta estacionada e diante dos jornalistas, Ferreira começou por explicar que o PCP precisa, nesta fase, de se distinguir — “Este é o tempo de cada força apresentar os seus projetos e mobilizar o eleitorado em torno deles”. Mas, confrontado com as declarações de Jerónimo, foi mais longe: “Uma coisa são coligações”, e isso é o acordo que o PCP tem com o PEV, formando a CDU. “Outra” coisa é lembrar que os “executivos municipais são, por natureza, globais”.
Por isso mesmo, o comunista mostra-se interessado em aceitar pelouros na cidade, “sem que isso signifique uma coligação”, se desta vez tiver mais “condições” para isso. Ou seja, na prática, o PCP rejeita acordos para o mandato — na semana passada, Ferreira dizia ao Observador que não aceitaria as condições que o Bloco aceitou há quatro anos para dividir a governação da cidade, nomeadamente aprovar à cabeça os quatro orçamentos municipais. Mas quer assumir pelouros, ou seja, responsabilidades de governação em áreas específicas.
João Ferreira: “Não nos peçam para garantir a aprovação de todos os orçamentos na câmara”
O facto de o Bloco não só ter, em 2017, aceitado um acordo nesses moldes como ter já esclarecido que não quer perder essa influência em Lisboa não tornará os bloquistas parceiros preferenciais para Medina? “Será tanto mais fácil quanto mais força tiver a CDU. Quanto mais força, mais fácil será ter responsabilidades maiores”, explicou Ferreira.
A luta à esquerda passa precisamente por aí: por um lado, conseguir a melhor votação e portanto a maior capacidade de influência, partindo para as negociações pós-eleitorais com vantagem. Por outro, desenhar o equilíbrio entre mostrar essa disponibilidade para negociar e distinguir-se, ao mesmo tempo, do PS, para não se perder no meio do chamado “voto útil”.
Foi o momento político da manhã de Ferreira, que de resto se dedicou às questões da Mobilidade. Depois de chegar de bicicleta com a comitiva — que incluía duas associações — atrás, o candidato explicou que as prioridades da CDU nesta área passam por “abordar as questões da Mobilidade de forma transversal”, ou seja, pensar a cidade de forma a conjugar os vários tipos de transporte e evitar “conflitos”, por exemplo, com carros ou peões.
Para isso, Ferreira lembrou várias das propostas da CDU, da redução de carros e da velocidade na cidade à implementação de um período gratuito para o uso das bicicletas Gira. E lembrou que, na maioria das vezes, os utilizadores não usam apenas um tipo de transporte — “o utilizador que agora é de bicicleta daqui a duas horas é de autocarro e noutro dia usa o carro”, pelo que recusou fazer o que “outras forças” fazem: promover “conflitos” entre os vários tipos de transporte.
O objetivo, por isso, é a articulação. Para já, dos transportes. Se também se poderá falar de articulação entre comunistas e socialistas depois das eleições, sempre sem pronunciar a palavra “coligações”, logo se verá quando os resultados chegarem: até lá, cada um faz caminho por si.