Lucianne Walkowicz, astrónoma da NASA, decidiu demitir-se na terça-feira, depois de a agência arquivar uma petição para que o Telescópio Espacial James Webb não tivesse o nome do diretor da agência nos anos 60. Razão para novo batismo do maior telescópio? James Webb teria políticas homofóbicas, segundo o grupo de astronómos que teve a iniciativa, recorda o El País.

A cientista, que fazia parte da Comissão Consultiva de Astrofísica explicou os seus motivos numa publicação na sua página do Patreon:

Renuncio ao meu posto no dia em que a NASA decidiu enviar, por correio eletrónico, a uns quantos jornalistas escolhidos a dedo, a sua posição patética em relação à mudança do nome do JWST (Telescópio Espacial James Webb). A NASA está a enviar uma mensagem clara quanto à sua postura acerca dos direitos dos astrónomos queer [identidade sexual ou de género que não corresponde ao tradicionalmemte convencionado], o que me diz que não merece, claramente, o meu tempo”.

Em março, Lucciane Walkowicz, que se enquadra como queer, tinha-se juntado aos cientistas Chanda Prescod-Weinstein, Sarah Tuttle e Brian Nord para escrever um artigo na revista Scientific American, em que pediam que a NASA reconsiderasse a sua posição em relação ao nome do telescópio que permitirá ver a luz das primeiras galáxias. Cerca de 1.200 pessoas assinaram a petição que resultou desse texto.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Mas, afinal, por que razão querem estes cientistas a alteração do nome do telescópio? Alguns investigadores alegam que Webb participou no “terror lilás”, campanha homofóbica dos anos 60, em que várias pessoas queer, que ocupavam cargos administrativos, foram perseguidas e despedidas, por serem consideradas “ameaças à segurança nacional”. De acordo com David Johnson, autor do livro “The Lavender scare” (“O terror lilás”, em português), pelo menos 10.000 pessoas foram despedidas por discriminação, neste período.

Os autores da petição dão o exemplo de Cliffer Norton, trabalhador da NASA que foi detido e, consequentemente, despedido, em 1963, devido à sua orientação sexual, que terá sido revelada por Webb, que entregou provas da homossexualidade de Norton.

Os cientistas acusam, também, a NASA de ignorar as provas do envolvimento do antigo diretor por conveniência: “Como cientistas, aprendemos a tirar conclusões das provas, e a NASA decidiu ignorar este princípio científico, porque não é conveniente politicamente.”

A agência norte-americana já garantiu que está a analisar o caso: “A NASA está ciente das preocupações que surgiram acerca de James E. Webb, e estamos a trabalhar com historiadores para avaliar o seu papel no governo.” O atual diretor da NASA, Bill Nelson, disse que não encontraram provas que justifiquem a mudança de nome” a algumas revistas, como a Nature.

O nome do telescópio —  que será posto em órbita a 18 de dezembro —,  foi escolhido por Sean O’Keefe em 2002, administrador, à data, da NASA. Uam decisão que, então, não foi contestada.

Telescópio espacial James Webb conclui testes finais antes de rumar à base de lançamento

O historiador David Johnson desvalorizou o papel de James Webb neste processo de perseguição a pessoas queer, afirmando que o antigo responsável da NASA era apenas cúmplice:

É certo que Webb foi um diretor importante, numa época em que se despediam homossexuais. No entanto, não tenho conhecimento de nenhuma prova de que tenha promovido esta purga. Sim, participou num encontro com a Administração do Presidente Truman para conter a histeria do macartismo [perseguição sistemática a comunistas, promovida pelo senador Joseph McCarthy9) e do terror lilás, mas não sabemos o que disse. E, sobre o caso Cliffer Norton, naquela altura era uma lei, e Webb não podia ter feito nada para o salvar. A triste realidade é que quase ninguém se opunha. Desta forma, os presidentes Kennedy e Johnson também eram cúmplices: e a NASA tem um Kennedy Space Center (Centro Espacial Kennedy, em português) e um Johnson Space Center. Por isso, parece-me errado demonizar Webb.”, disse Johnson, citado pelo El País.

Os cientistas que defendem a mudança do título do telescópio já apresentaram algumas alternativas: Lucianne Walkowicz propôs o nome de Harriet Tubman, escrava e ativista contra a escravatura nos Estados Unidos. Javier Armentia, diretor do Planetário de Pamplona e membro da PRISMA — associação para a diversidade afetivo-sexual e de género na ciência, tecnologia e inovação — sugeriu o nome de Frank Kameny, astrónomo que foi despedido por se recusar a revelar a sua conduta sexual.