Os resultados foram os mesmos mas acabaram por ficar quase num plano secundário. Ou seja, pior do que o 1-2 frente ao Sporting na final da Taça da Liga e do 1-2 diante do Gil Vicente para o Campeonato, foi a forma como o Benfica perdeu esses dois encontros que reativou os alarmes na Luz. E era isso também que iria estar em jogo na deslocação a Tondela, após as vitórias de FC Porto e Sporting: a capacidade que os encarnados tinham para assumir o momento e encontrarem soluções para as dúvidas que levantaram com as últimas exibições. Mais do que isso, a capacidade de interiorizar a mensagem mais contundente que Rui Costa deixou no balneário após a última partida e procurar uma redenção dentro do atual contexto.

“Quando o presidente vai ao balneário manifestar a opinião relativamente ao momento da equipa, todos ouvimos com atenção e temos de ter uma reação a essas palavras. Ele sublinhou o que nós no final do jogo estávamos a sentir, frustração por não termos ganho o jogo em casa frente a Gil Vicente. Transportámos as ideias do presidente, as nossas e as dos jogadores para a semana de trabalho. Sabemos as responsabilidades que temos. Foi uma semana dentro do compromisso dos jogadores mas com o impacto das palavras do presidente no balneário a seguir ao jogo que tivemos em casa”, garantira Nelson Veríssimo antes do encontro diante dos beirões. “Jogadores, treinadores e estrutura sabem a dimensão do clube, que e não é compatível com os últimos dois resultados. A motivação que temos é a de representar o clube e o único caminho é ganhar. É o nosso único objetivo e é nisso que temos trabalhado”, acrescentou de seguida.

Mesmo sabendo da convulsão que o clube atravessa numa esfera mais institucional, mesmo sabendo que é uma opção a prazo até ao final da temporada (assim os resultados “permitam”), mesmo sabendo que existe ainda um processo de adaptação a uma nova ideia de jogo com modelos táticos diferentes, o técnico tinha bem presente a necessidade de haver uma resposta quase pavloviana às palavras de Rui Costa sem a qual seria complicado pensar nos passos seguintes de estabilizar a equipa em termos coletivos, voltar a ganhar a consistência defensiva que se perdeu na nova solução do 4x3x3 e potenciar o talento individual que se foi eclipsando ao ritmo das exibições menos conseguidas das últimas semanas independentemente das críticas às arbitragens que todos reconheciam no clube não poderem “servir de justificação para tudo”.

“A garantia que podemos deixar é que reconhecemos a fase que estamos a atravessar mas sabemos o que estamos a fazer. O que temos de corrigir, o que temos de melhorar a nível de dinâmicas da equipa, temos grande motivação. Este foco estende-se à equipa, à equipa técnica e a toda a estrutura. Esperemos que isso se traduza em vitórias. Em momento algum vamos abdicar dos ideais deste clube, que é lutar pela vitória. Contamos com a ajuda dos adeptos. É natural que haja manifestações de desagrado, os resultados não estão a ser positivos e aceitamos as críticas, mas trabalhamos dia a dia com empenho para reverter a situação”, afiançou Veríssimo numa antecâmara do jogo muito marcada pelo resgate de uma identidade.

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Era neste contexto que o Benfica enfrentava o Tondela, “uma equipa que tem uma ideia de jogo bem definida com jogadores na frente que podem causar desequilíbrios”. Era neste contexto que tinha de haver quase uma viragem de paradigma a nível de coletivo e individual na fronteira entre jogar “para o clube” e “pelo clube”. E foi neste contexto que a equipa deu a melhor resposta possível, no encontro mais afirmativo de 2022 que não deu qualquer margem aos beirões num registo histórico que já era 100% vitorioso para os encarnados que saiu mais reforçado nas sete partidas no João Cardoso (e 20-3 nos golos).

O regresso de Darwin Núñez à equipa foi primordial para melhorar a qualidade ofensiva e só o golo que conseguiu marcar valeu o bilhete e o prémio de MVP. E Everton fez uma das exibições mais completas da época, com um golo e duas assistências entre várias jogadas de desequilíbrios individuais ou combinações com Grimaldo. No entanto, e mesmo não tendo o mesmo brilho do que os outros, Gonçalo Ramos teve o seu espaço de destaque que tinha começado no jogo com o Gil Vicente, onde nunca desistiu até ao último minuto para evitar a derrota, e que se prolongou em Tondela com movimentos entre linhas importantes para a equipa desbloquear depois as unidades mais virtuosas que tiveram também um golo como prémio. Hoje e sempre que entra em campo, o avançado joga pelo Benfica e não para o Benfica. E foi isso que fez a diferença num dos triunfos mais folgados na Liga que travou a série de resultados negativos.

Ficha de jogo

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Tondela-Benfica, 1-3

21.ª jornada da Primeira Liga

Estádio João Cardoso, em Tondela

Árbitro: João Pinheiro (AF Braga)

Tondela: Pedro Trigueira; Tiago Almeida (Bebeto, 81′), Eduardo Quaresma, Ricardo Alves, Neto Borges; Undabarrena (Manu Hernando, 73′), João Pedro; Avilés (D’Almeida, 46′), Boselli (Arcanjo, 73′), Salvador Agra e Daniel dos Anjos (Dadashov, 73′)

Suplentes não utilizados: Niasse, Khacef, Marcelo Alves e Lacava

Treinador: Pako Ayestarán

Benfica: Vlachodimos; Lázaro, Otamendi, Vertonghen, Grimaldo; Weigl, Paulo Bernardo (Meïté, 73′); Rafa (Radonjic, 81′), Everton (Diogo Gonçalves, 62′); Gonçalo Ramos (Henrique Araújo, 81′) e Darwin Núñez (Taarabt, 73′)

Suplentes não utilizados: Helton Leite, Gil Dias, André Almeida e Morato

Treinador: Nelson Veríssimo

Golos: Everton (23′), Darwin Núñez (34′), Gonçalo Ramos (53′) e Eduardo Quaresma (88′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Marco Pimenta (adjunto de Veríssimo, 9′) Neto Borges (38′ e 65′) e Everton (65′); cartão vermelho por acumulação a Neto Borges (65′)

Com Lázaro, Rafa e Darwin Núñez de regresso à equipa na recuperação do 4x4x2 por parte dos encarnados, o Benfica ainda viu o Tondela ter a primeira chegada à área com um canto ganho mas demorou pouco mais de dois minutos para criar a primeira oportunidade flagrante do jogo pelo inevitável Darwin, a receber nas costas da defesa contrária depois de um bom movimento entre linhas de Gonçalo Ramos e a rematara para defesa atenta de Pedro Trigueira (3′). Os lisboetas ganhavam cantos, mostravam uma outra agressividade sem bola e conseguiam empurrar os beirões para o seu meio-campo, faltando depois mais ligação na zona do último terço para materializar esse domínio numa fase em que o Tondela ia recuando em demasiado as linhas. Quando conseguiu sair, criou logo perigo. E Boselli marcou mesmo, num lance que seria depois anulado pelo VAR pela posição irregular de Salvador Agra quando recebeu nas costas de Lázaro (20′).

Os encarnados tentavam atacar rápido e a dar largura ao seu jogo ofensivo, procurando muitas vezes as combinações curtas que conseguissem desequilibrar a organização defensiva do Tondela. E foi assim que conseguiram mesmo inaugurar o marcado, numa jogada em que Gonçalo Ramos voltou a descer bem para o espaço entre linhas, Grimaldo foi à zona central fazer o apoio e Everton, recebendo nas costas da defesa contrária a assistência do lateral espanhol, rematou cruzado para o 1-0 (23′). Estava desbloqueado o jogo, estava aberto o caminho para mais golos do Benfica frente a um Tondela a deixar demasiado espaços no corredor central e nas transições que só não provocaram mais estragos porque a segunda bola na área após cruzamento na direita de Darwin Núñez teve um remate fraco de Paulo Bernardo na área (27′).

Mais do que o caminho da baliza, o Benfica tinha encontrar o caminho preferencial para o ataque vendo o espaço que ficava no espaço entre defesa e meio-campo do Tondela e nas transições. Foi assim que Everton, em mais uma arrancada beneficiando de uma avenida sem unidades a pressionar o portador, acertou na trave ainda com Trigueira a tocar na bola (32′). E foi assim que Darwin Núñez foi protagonista do grande momento da noite, com um fabuloso remate descaído sobre a esquerda em arco que terminou no ângulo da baliza dos beirões (34′). Salvador Agra, mesmo em cima do intervalo, ainda apareceu na área em posição frontal a rematar ao lado mas eram os encarnados que tinham o domínio completo da partida com Everton e Darwin Núñez endiabrados e um Paulo Bernardo a tomar conta de todo o jogo da equipa.

O segundo tempo começou com Sessi D’Almeida no meio-campo do Tondela, que passou para um 4x1x4x1 que desse outra estabilidade à equipa no corredor central e outra segurança na posse. E até foi isso que se viu no arranque após o intervalo, com os beirões a conseguirem circulações maiores e com outra qualidade. No entanto, o mínimo abanão bastou para toda a estratégia cair e o Benfica chegou cedo ao 3-0: passe longo de Otamendi para Grimaldo a mudar o centro de jogo, toque para Everton ao meio, assistência para Gonçalo Ramos na área e bom trabalho do jovem avançado para o remate de pé direito sem hipóteses (53′). A própria reação dos jogadores da casa dizia tudo e o encontro tinha “acabado” a mais de meia hora do fim.

O Benfica baixou a partir daí o ritmo, Veríssimo aproveitou também para ir mexendo na equipa e o Tondela ficou reduzido a dez unidades depois de Neto Borges ter pisado de forma inadvertido Darwin Núñez na tentativa de proteger a bola e ver o segundo amarelo (65′). O que estava fácil ficou ainda mais fácil, tanto que os encarnados acabaram por facilitar criando apenas uma boa oportunidade a partir dos 65′ e já nos descontos por Otamendi, central argentino que teve de ser assistido após um choque com Vlachodimos, não entrou a tempo antes de um canto dos beirões e alertou sem sucesso para o espaço que com isso ficava por preencher na área, bem aproveitado por Eduardo Quaresma para fazer o golo de honra (88′).