A expectativa é a de uma “decisão pacífica” sobre o convite da Assembleia da República ao presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, para discursar perante os deputados portugueses. A conferência de líderes vai esta quarta-feira tomar uma decisão sobre o pedido do PAN e a maioria dos partidos — entre eles o PS e o PSD – não coloca entraves ao convite para a intervenção do presidente da Ucrânia que, a acontecer, será num formato inédito, tendo em conta que um chefe de Estado nunca interveio na Assembleia da República por videoconferência.

O pedido foi feito na anterior legislatura, mas Ferro Rodrigues decidiu que só um Parlamento em plenitude de funções podia tomar esta decisão, numa postura que foi elogiada por Augusto Santos Silva quando assumiu a liderança da Assembleia da República. Apesar do novo quadro parlamentar ser substancialmente diferente do anterior, a expectativa é de que a decisão seja favorável sem grandes entraves — sendo que o PCP poderá ser o único a opor-se ao convite ou a colocar dificuldades à realização dessa sessão.

Entre os maiores partidos é dito ao Observador que o grupo parlamentar do PS não coloca entraves e o do PSD mostra-se também favorável a esse convite. Entre os vários representantes dos partidos que habitualmente marcam presença na conferência de líderes a expectativa é de que a decisão seja “pacifica”, existindo até unanimidade na questão do timing: primeiro era preciso “arrumar a casa”, com a instalação de Augusto Santos Silva, para depois tomar a decisão.

E agora que a casa a começar a ficar arrumada, há espaço para decidir o formato do convite e da sessão que poderá receber o presidente da Ucrânia. A confirmar-se a presença por videoconferência de Volodymyr Zelensky esta será a primeira vez que um Chefe de Estado discursa por videoconferência no plenário da Assembleia da República, o que coloca dúvidas quanto ao protocolo a seguir.

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Quando um chefe de Estado de um país estrangeiro discursa no Parlamento — o que só acontece em situações muito pontuais –, o Presidente da República é convidado a assistir presencialmente a essa intervenção, mas, a participar, Zelensky discursará através de videoconferência como tem feito noutros parlamentos, não obrigando a essa presença de Marcelo Rebelo de Sousa.

Ainda assim, e por ser um chefe de Estado, Augusto Santos Silva deverá coordenar esse convite com o Presidente da República e também com o primeiro-ministro. Havendo um consenso partidário tão alargado, que representa, no mínimo, mais de dois terços da Assembleia da República, a margem (política) para o presidente da Assembleia da República travar o convite é curta, embora formalmente a decisão seja de Santos Silva.

Em 2018, quando Ferro Rodrigues convidou o presidente de Angola, João Lourenço, a discursar no plenário da Assembleia da República, o convite foi coordenado com Marcelo Rebelo de Sousa e com António Costa e não teve a oposição de nenhum partido representado no Parlamento. Nessa sessão, para além do Chefe de Estado de Angola discursou apenas Eduardo Ferro Rodrigues, mas as altas figuras do Estado marcaram presença na sessão.

A lista de chefes de Estado que discursaram no plenário da Assembleia da República, em democracia, é relativamente curta e tem privilegiado as relações históricas de Portugal. Antes de João Lourenço em 2018 — numa visita oficial depois do “irritante” com Manuel Vicente — o último chefe de Estado a discursar no Parlamento tinha sido o Rei Filipe VI, em 2016. O presidente do Brasil, de França, de Moçambique, de Itália e também Xanana Gusmão — este ainda antes de ser chefe de Estado — também já discursaram na Assembleia da República.

É precisamente por não existir um critério escrito para estas sessões que a decisão final — do convite e do formato –, cabe ao presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, que antes de ocupar este lugar era o chefe da diplomacia portuguesa e um dos pontos de contacto do governo português com a Ucrânia aquando do inicio da guerra. Desde o inicio da guerra na Ucrânia, Marcelo Rebelo de Sousa já falou uma vez por telefone com o presidente ucraniano.