A biografia de Natália Correia que será publicada em março pela Contraponto tem 700 páginas e levou seis anos a ser escrita, foi revelado ao final da tarde desta sexta-feira no Correntes d’Escritas, o festival literário da Póvoa de Varzim, onde decorreu o pré-lançamento de O Dever de Deslumbrar, de Filipa Martins.

O jornalista João Gobern, que conversou na Póvoa de Varzim com Filipa Martins, começou por assinalar que “uma das biografias que mais falta fazia [em Portugal] era a de Natália Correia”, destacando a vida cheia da escritora “hiperativa, que nunca parava”.

Sobre a biografia O Dever de Deslumbrar, Gobern disse tratar-se de uma obra que, “partindo de uma figura central [da cultura portuguesa], acaba por ser um retrato nosso”, “quase um dicionário histórico em múltiplos capítulos do que foi a história de Portugal entre o nascimento e morte de Natália Correia”, cujos 30 anos da morte e 100 do nascimento se assinalam este ano, em setembro e março, respetivamente.

Filipa Martins lembrou que  Natália Correia foi mais censurada do que qualquer outro escritor português, por ter atacado “uma especificidade da nossa sociedade do Estado Novo, os bons costumes”, “não em todas as obras, mas de alguma maneira em todas as obras”.

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A autora salientou também a “capacidade de premonição” que a escritora mostrou ter em “vários momentos da história” portuguesa, por exemplo, em relação ao final do regime salazarista e sobre a entrada de Portugal na antiga CEE (Correia foi uma das mais duras críticas da adesão portuguesa à comunidade europeia).

Filipa Martins revelou ainda que Natália Correia começou por trabalhar como cançonetista, cantando slows na rádio açoriana sob o pseudónimo Célia Navarro. Foi também na rádio que divulgou pela primeira vez a sua poesia, lendo os poemas que escrevia ao microfone. “E de tal maneira impressionou que a convidaram para ser locutora de continuidade” nos Açores, onde a escritor nasceu, contou.

Abordando o lado mais “irascível” de Natália Correia, Gobern recordou a viagem da escritora a Moscovo para participar num encontro de autores. “Quando souberam que ia a Natália Correia, pediram que a Nélida Piñon a fosse buscar ao aeroporto para saberem que se ia correr bem”, relatou.

“Até os russos tinham medo de Natália Correia. Os parlamentares tinham medo de Natália Correia. Era absolutamente indomável. Não foi a Natália Correia que se adaptou aos parlamentares, foram os parlamentares que se adaptaram a Natália Correia”, afirmou Martins, referindo-se ao período em que a escritora foi deputada na Assembleia da República, entre 1980 e 1991. Sempre contracorrente, continuou a fumar no hemiciclo “mesmo depois de ser proibido fumar”.

A biografia de Natália Correia, de Filipa Martins, será publicada a 16 de março, quando se assinalam os 30 anos da morte da escritora, que nasceu a 13 de setembro de 1923.

O Observador viajou até à Póvoa de Varzim a convite do Correntes d’Escritas