O advogado da TAP na negociação que conduziu a um acordo de saída de Alexandra Reis comunicou à presidente executiva Christine Ourmières-Widener que uma das opções legais possíveis era a de recusar a proposta inicial de compensação, sem apresentar uma contra-proposta e pedir-lhe que revisse os termos do proposto. Se não, o próximo passo seria o fim unilateral do vínculo através de uma deliberação do acionista — o Estado — que a iria afastar do seu cargo como membro da administração.

Esta foi uma das três opções comunicadas pelo advogado da SRS que assessorou a TAP neste processo quando Alexandra Reis fez a sua proposta inicial na qual reclamava montantes próximos de 1,5 milhões de euros para sair da empresa, um valor que César Sá Esteves reconhecer ser “financeiramente e politicamente inaceitável”. Por isso, disse: “Temos de decidir como vamos fazer”. Esta expressão consta de um dos e-mails que faz parte dos anexos ao relatório da auditoria da Inspeção-Geral de Finanças, enviados por César Sá Esteves, advogado da SRS, a Christine.

Neste e-mail de 28 de janeiro de 2022, o jurista elenca três opções:

  • Apresentar uma contraproposta na qual a TAP aceitaria as condições propostas para o fim do vínculo laboral com o grupo, mas na parte que toca ao fim antecipado do mandato de gestora seria considerada uma compensação mais reduzida entre os 175,5 mil euros e os 331,6 mil euros, dependendo do referencial usado para calcular a remuneração do membro da administração.
  • Recusar a proposta, nos termos já referidos, e mandar a bola para o lado de Alexandra Reis, ameaçando-a com um cenário de demissão pelo acionista, sem referir se tal demissão seria feita ao abrigo do estatuto do gestor público com eventual direito a indemnização.
  • Ou iniciar uma abordagem diferente desta negociação, na qual a TAP ponderava pagar agora uma compensação inferior pelo final antecipado do mandato, continuando a pagar uma percentagem da remuneração a Alexandra Reis, por exemplo, 50% a 75% de 25 mil euros por um período máximo a ser definido com a hipótese de 12 a 18 meses. Esta solução permitiria à então gestora da TAP receber remuneração durante um período de transição para um novo emprego, para além de reduzir o impacto financeiro imediato para a TAP.

O tema foi discutido numa reunião realizada logo no dia seguinte e num dos mails que foi analisado na auditoria, e que é de 31 de janeiro, três dias após o anterior, surgia já o número mágico do meio milhão de euros, descrito como a “oferta final de Alexandra Reis”. A partir deste valor, o jurista avançava com condições de saída em linha com o programa de rescisões voluntárias, RMA, em vigor na TAP, mais um prémio de cinco mil euros, acrescentando ainda férias não gozadas e outros benefícios que vieram a ser consagrados no acordo final como o seguro de saúde durante 24 meses e facilidades de passagem por 60 meses, entre outros.

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Da documentação incluída nestes anexos, não é claro se a ameaça de demissão pelo acionista — a modalidade estabelecida no estatuto do gestor público (o enquadramento jurídico que segundo a IGF deveria ter sido usado) para estes casos, a par com a renúncia que não daria direito a qualquer compensação — chegou a ser apresentada à ex-administradora.

Informação entretanto vinda a pública pelos documentos recebidos na comissão de inquérito indicam que a própria Alexandra Reis colocou o cargo à disposição poucos dias antes da presidente executiva da TAP ter pedido a Pedro Nuno Santos para a afastar da administração empresa.

Alexandra Reis pôs cargo à disposição de Pedro Nuno dias antes de este dar luz verde à TAP para negociar a sua saída

Segundo a ata da reunião realizada pelos inspetores da IGF, Alexandra Reis testemunhou que a negociação entre os seus advogados (Morais Leitão ) e a TAP iniciou-se a 27 de janeiro e que a 29 de janeiro (o mail citado enviado pelo advogado da TAP à CEO está entre este período temporal).

E que foi no dia 29 do mesmo mês que a TAP “fez uma proposta global de 500 mil euros para todas as componentes, proposta que decidiu aceitar, tendo sido apresentada pela TAP a minuta do acordo final, que foi sujeita a ajustes de pormenor entre ambos”. Alexandra Reis referiu ainda desconhecer a repartição de valores que foi divulgada pela TAP em dezembro do ano passado, na resposta que a empresa deu ao Governo em dezembro e que resultou na sua demissão do cargo de secretária de Estado do Tesouro. Isto porque o acordo que aceitou “apenas descriminava duas componentes, enquanto trabalhadora e enquanto administradora”.

As explicações da TAP que fizeram cair a secretária de Estado do Tesouro

A gestora insiste que nunca foi informada pelos advogados de uma eventual desconformidade face ao estatuto do gestor público. Tal como sempre afirmou a presidente executiva da TAP.

Sobre o detalhe do processo negocial, Christine Ourmières-Widener refere que recebeu instruções do Ministério das Infraestruturas para baixar o valor inicialmente pedido por Alexandra Reis, dadas por Hugo Mendes que referiu ser esta a posição do ministro Pedro Nuno Santos. E indica que o consultor da TAP, a SRS, lhe referiu que a redução do valor inicial reclamado para um terço seria uma boa solução. A CEO acrescente que a proposta final foi aceite por Alexandra Reis no dia 2 de fevereiro e depois de uma reunião realizada via Teams no dia 1 do mesmo mês.

Nos esclarecimentos dados sobre o acompanhamento do processo, Pedro Nuno Santos e Hugo Mendes nunca afirmam ter ponderado o cenário de ser o Estado a demitir a gestora, o inevitavelmente levaria o tema para o Ministério das Finanças que não foi informado sobre esta negociação.