Há uma história que ficou para sempre entre Pep Guardiola, Karl-Heinz Rummenigge e o Bayern, quando em novembro de 2015 o técnico espanhol recusou num jantar em Munique renovar o contrato que terminava no verão seguinte e todos os protagonistas acabaram em lágrimas com a decisão. Apesar de ter como grande objetivo aquilo que nunca ganhou pelos bávaros, a Liga dos Campeões, havia a perceção em termos internos que a forma como o clube e a equipa passaram a ser olhados pelo futebol que jogavam naquele tempo. Como resumia o El País, essas equipas entre 2013 e 2016 quebraram o paradigma de que não era possível juntar a estética à eficácia. Só mais tarde, com Hansi Flick, se voltou a falar assim do Bayern. E, de certa forma, com o próprio Julian Nagelsmann, que ainda hoje não consegue dissociar as duas ideias. No entanto, chegados a 2023, uma década depois do início da passagem de Guardiola pela Allianz Arena, tudo mudou.

Haaland, Bernardo e a versão moderna do Twins produzida por Pep Guardiola (a crónica do Manchester City-Bayern)

Apesar da vitória frente ao rival direto B. Dortmund na estreia, Thomas Tuchel não teve propriamente aquele arranque auspicioso que desejava. Talvez seja até mais vítima do que culpado na derrocada do Bayern, mas nos quatro jogos que se seguiram a equipa foi eliminada da Taça da Alemanha pelo Friburgo em casa, perdeu por 3-0 na primeira mão dos quartos da Champions e só não foi apanhada na liderança da Bundesliga este fim de semana após o empate com o Hoffenheim porque o B. Dortmund cedeu uma inesperada igualdade com o Estugarda aos 90+7′. Agora, tinha a missão quase impossível de virar uma desvantagem de três golos contra um dos conjuntos em melhor momento na Europa e o técnico germânico que bateu os citizens na final da Liga dos Campeões de 2021 pelo Chelsea passava ao lado da convulsão interna para falar do “milagre”.

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“Continuamos vivos. Nos quartos da Champions depende do adversário que encontramos e dos muitos detalhes que existem e contam. Estar nos oito melhores da Europa tem que ser um objetivo todos os anos, a partir daí depende de muitos fatores que às vezes não se conseguem depois controlar. Temos de escalar uma montanha muito alta mas acreditamos em nós. Temos de dar as mãos e depende de nós mudar a realidade, um passo de cada vez”, comentara Tuchel perante um Guardiola desconfiado: “Às vezes é preciso um conflito para unir ainda mais a equipa. Não é um ponto fraco para eles, será um ponto forte. Conheço bem o clube e alguns dos jogadores que estão lá. Consigo imaginar a situação, a melhor exibição do Bayern vai ser agora. Temos de jogar com a coragem com que jogámos em casa. Se formos passivos, sofremos”.

Puxando o filme atrás, a primeira mão tinha sido marcante à sua maneira para cada um dos conjuntos. Do lado do Manchester City, com a “ajuda” das escorregadelas do Arsenal à mistura, a garantia de que mantendo o atual momento a equipa pode mesmo aspirar à conquista da Premier League, da Taça de Inglaterra e da Liga dos Campeões. Da parte do Bayern, entre a agressão e o posterior castigo de Sadio Mané a Leroy Sané e os estilhaços ainda no balneário pelo despedimento de Nagelsmann, sobrava a única certeza de que este era o último momento para tentar salvar ainda a temporada. Foi isso que se viu nos germânicos, que deram tudo, criaram várias oportunidades e caíram de tal forma de pé que os adeptos permaneceram até ao fim para saudar os seus jogadores. No entanto, e pelo que tinha feito na primeira mão, passou o Manchester City. Com outro golo do gigante (em todos os sentidos) Haaland, com mais uma escorregadela de Upamecano que valeu mais um recorde, desta vez o jogador da Premier mais goleador em fases a eliminar da Champions.

A primeira parte resumiu-se praticamente ao domínio do Bayern entre duas oportunidades flagrantes para o Manchester City fechar de vez a eliminatória (uma delas anulada). Leroy Sané, num grande passe a explorar as costas da defesa dos ingleses, teve a primeira chance com um remate que saiu a rasar o poste da baliza de Ederson (16′), que defenderia pouco depois para canto um livre direto do esquerdino (21′). Pelo meio, o primeiro susto dos germânicos, com Upamecano a ser expulso por rasteirar Haaland isolado mas a ser salvo pelo fora de jogo do norueguês (18′). Guardiola não gostava de ver a forma como a equipa não tinha saída e era dominada, chamando Bernardo Silva ao banco na tentativa de equilibrar o jogo com aquele que melhor o pensa. Mais uma vez, tudo podia ter acabado numa grande penalidade de Upamecano que Haaland atirou em força por cima (35′) e ainda seria o Bayern a ter mais dois remates travados por Ederson (42′).

No segundo tempo, Pep Guardiola conseguiu equilibrar a equipa sem bola, evitando de novo o sufoco que sofreu durante largos minutos até ao intervalo. No entanto, e quando o Bayern conseguiu a primeira grande oportunidade, foi o Manchester City a marcar… dez segundos depois: Coman rematou na área, Stones tirou a bola para a frente, os alemães não conseguiram matar logo a jogada e Upamecano voltou a escorregar no duelo com Haaland, permitindo que o norueguês se redimisse da grande penalidade falhada (57′). A eliminatória estava de vez resolvida, o jogo ainda teria um pouco mais de história e, entre o apoio incansável da Allianz Arena, Kimmich conseguiria ainda empatar na conversão de uma grande penalidade (83′).