Os Estados Unidos retiraram a Etiópia da lista de países “atualmente implicados em graves violações dos direitos humanos”, com o objetivo de facilitar a ajuda económica ao país africano assolado por uma guerra devastadora, mas com críticas das ONG.

A Amnistia Internacional (AI) e a Human Rights Watch (HRW) criticaram a decisão, afirmando que as atrocidades no país continuam a existir, ainda que o porta-voz para a Segurança Nacional da Casa Branca, John Kirby, tenha justificado na sexta-feira o levantamento das sanções com os alegados progressos em termos de direitos humanos na Etiópia.

A retirada da Etiópia da lista, confirmada numa notificação do Departamento do Tesouro dos EUA, foi também confirmada por fontes próximas da decisão quer à revista ‘Foreign Policy’, quer à radiotelevisão pública etíope FANABC, segundo a agência Europa Press.

De acordo com o memorando, o departamento liderado por Janet Yellen recomenda às instituições financeiras norte-americanas e internacionais que “deixem de rejeitar empréstimos ou assistência técnica” ao país africano.

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A AI e a HRW condenaram inequivocamente a decisão, apesar da paz que avança no país depois do acordo de novembro de 2022, assinado em Pretória (África do Sul) que pôs fim a dois anos de conflito entre o exército etíope e do seu aliado, a Eritreia, contra a Frente de Libertação Popular do Tigray, um dos conflitos mais violentos da história recente do continente, que fez centenas de milhares de mortos, de acordo com dados oficiais.

As ONG afirmam que as partes em conflito continuam a cometer crimes contra os direitos humanos apesar do cessar-fogo de Pretória, em particular em zonas como o oeste do Tigray (região no norte da Etiópia), cenário de uma limpeza étnica ainda em curso, de acordo com o que avançou a HRW em junho.

O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, reconheceu em março que todas as partes envolvidas no conflito cometeram crimes contra a humanidade, “incluindo assassinatos, violações e outras formas de violência sexual e perseguição”.

Para a diretora da HRW Sarah Yager, a decisão do Tesouro norte-americano acarreta um retrocesso para os sobreviventes do conflito: “A decisão não só ignora a realidade de que continuam as graves violações dos direitos humanos em todo o país, como envia um sinal desastroso de que a determinação dos EUA para perseguir as atrocidades, na verdade tem poucas consequências”.

“A administração Biden pretende por os direitos humanos no centro da sua política externa, mas esta decisão não cumpre essa promessa”, disse, por seu lado, Amanda Klassing, da AI, criticando ainda que “desde o cessar das hostilidades, as autoridades etíopes não deram passos significativos em direção à justiça e à prestação de contas pelos crimes cometidos durante o conflito”.

Para Klassing, a decisão foi adotada “antes de se ter podido ver um compromisso com a justiça, enquanto continuam os relatórios de violações de direitos humanos”, sendo “uma decisão politicamente conveniente às custas dos sobreviventes e das vítimas”.

O governo federal da Etiópia, liderado pelo vencedor do Prémio Nobel da Paz de 2019, Abiy Ahmed, entrou em guerra contra a Frente de Libertação do Povo do Tigray (TPLF, na sigla em inglês) no norte do país.

A guerra entre os rebeldes da região etíope do Tigray e o executivo central da Etiópia começou em 04 de novembro de 2020, quando o primeiro-ministro etíope ordenou uma ofensiva contra a TPLF como retaliação por um ataque a uma base militar federal e na sequência de uma escalada de tensões políticas.

O balanço do conflito ascende a milhares de mortos, a dois milhões de pessoas deslocadas internamente e a, pelo menos, 75.000 refugiados no vizinho Sudão, de acordo com números oficiais.