Pinto da Costa foi conhecendo milhares e milhares de jogadores, treinadores, dirigentes e empresários ao longo de mais de quatro décadas na liderança do FC Porto mas ainda hoje se rege por alguns princípios que sempre foram inalienáveis. Um deles é a gratidão. E se João Moutinho já tinha há muito entrado no goto do líder azul e branco pela forma como assumiu a vontade de deixar o Sporting pelos dragões em 2010 mesmo sabendo o impacto que a mudança teria no plano mediático, a maneira como aceitou ficar mais uma época no verão de 2012 apesar de ter tudo feito para rumar ao Everton (mais uma vez) não mais foi esquecida.

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“Outra das saídas que mais me custaram foi o João Moutinho. Na altura, o Jorge Mendes tinha negociado a saída dele para o Everton e eu achava que ele era um elemento muito importante. Disse-lhe ‘Olha, eu não quero que tu saias, compreendo que não temos possibilidades de acompanhar essa proposta e tu tens esse direito de sair, mas gostava que tu não saísses, porque amanhã vou ser operado ao coração. Gostava muito que tu estivesses cá quando eu acordar’. Havia pessoas que diziam que eu ia de vela. A questão ficou encerrada ali. ‘Presidente, acabou!’, respondeu-me ele. ‘Vá ser operado tranquilamente porque eu não saio por dinheiro nenhum’. E ficou cá mais um ano”, recordou o presidente dos portistas em entrevista à revista Dragões no ano passado, fazendo uma retrospetiva de vários episódios que foram marcando a sua liderança.

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Moutinho acabaria mesmo por sair para o Mónaco apenas na temporada seguinte, num acordo comum com James Rodríguez que abriu uma guerra com o Sporting pelo valor que teria a receber numa futura saída do médio, e esteve uma década a jogar no estrangeiro entre os cinco anos na Ligue 1 mais cinco de Premier League, pelo Wolverhampton. No entanto, Pinto da Costa nunca deixou de tentar perceber a melhor altura para promover o regresso do jogador ao Dragão, num desejo que começou sobretudo a partir do verão de 2021, quando ainda não era líquido se o Wolves iria ou não acionar a cláusula de opção de Vitinha (como acabaria por não acontecer). Agora, esse desejo parecia ter-se tornado realidade, com Moutinho apenas à espera de saber o dia para ser apresentado após cumprir todos os requisitos. Nos últimos dias, tudo mudou.

“Tive muito orgulho em fazer parte da família Wolverhampton, orgulho dos cinco anos que vesti aquela grande camisola, orgulho de ter tido a oportunidade de jogar o melhor futebol do mundo, orgulho de ser um lobo. Agora é a hora de expressar minha profunda gratidão ao clube, à equipa, aos companheiros e principalmente aos adeptos. Os fãs incríveis são aqueles que nunca nos deixam sentir sozinhos, que nos dão ânimo, força, apoio, alma. Muito obrigado por estes cinco anos mágicos. Eu sou um lobo como vocês, nunca vou esquecer todas as grandes memórias”, tinha escrito o médio na despedida do Wolves, sem anunciar nessa fase que clube passaria a representar mas convicto de que iria para onde afinal já não vai.

Segundo jogador mais internacional de sempre, apenas atrás de Cristiano Ronaldo, João Moutinho recebeu outras propostas financeiras mais vantajosas de outras ligas mas colocou a vontade de regressar a Portugal em primeiro lugar. O Sp. Braga foi o primeiro clube clubes que abordou o médio, a ponto de no Minho se chegar a pensar que o jogador já não fugiria, mas a intervenção direta de Pinto da Costa fez com que o atleta desse um passo atrás perante o regresso a uma casa que conhece bem. Afinal, foi só uma questão de tempo: perante os bloqueios que a contratação estava a receber em termos internos, e com o passar dos dias sem uma solução, a hipótese de rumar aos minhotos foi reativada e concretizou-se esta sexta-feira.

Após a saída de Otávio, e por entender que havia outras prioridades em termos de equipa para suprir a falta do internacional que rumou ao Al Nassr, Sérgio Conceição não considerou João Moutinho uma prioridade no reforço da equipa e aquilo que estava feito desde o final da última semana acabou mesmo por abortar, o que permitiu que o Sp. Braga, que está a um passo de voltar à fase de grupos da Liga dos Campeões (venceu a primeira mão do playoff com o Panathinaikos), juntasse mais um internacional a um conjunto que já tem nesta fase nos seus quadros jogadores como José Fonte, Bruma, Ricardo Horta, Paulo Oliveira, Pizzi e Rony Lopes, todos portugueses que já foram pelo menos uma vez chamados à Seleção A. Ou seja, os dragões admitiam que Moutinho pudesse ser uma mais valia mas foram ficando “presos” noutros dossiers mais prioritários e o médio voltou atrás, rumando ao conjunto minhoto após dez anos no estrangeiro.

O anúncio oficial chegou ao final do dia, já depois de o médio ter feito o primeiro treino com o plantel que é orientado por Artur Jorge, sendo que o mesmo acabou por coincidir com mais uma mensagem de André Villas-Boas a criticar o FC Porto. “Vergonha alheia”, escreveu o antigo treinador nas redes sociais, com uma imagem onde João Moutinho surge a festejar a conquista da Liga Europa (curiosamente frente ao Sp. Braga) tendo Villas-Boas no comando. Além da prova europeia, a última das sete no currículo dos dragões, o FC Porto ganhou também o Campeonato, a Taça de Portugal e a Supertaça nessa época de 2010/11.

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“Sinto-me feliz, é um prazer enorme poder estar aqui e representar o Sp. Braga. As coisas proporcionaram-se assim, é um prazer enorme para mim, espero ajudar o clube a conseguir os seus objetivos. O Sp. Braga tem mostrado ao longo dos anos a sua grandeza e como tem evoluído e no panorama nacional e mesmo internacional mostrado a capacidade de conseguir competir com todas as outras equipas. E eu vim também para tentar elevar o nível e dar o meu melhor para poder atingir os objetivos, que cada vez mais começam a ser mais ambiciosos. E ambicioso como sou em tudo, espero vir a ajudar a poder conquistar várias coisas aqui”, comentou o médio nas primeiras declarações como jogador dos minhotos aos meios do clube.

“FC Porto? Depois de tomar a decisão, penso que foi o passo certo, ou tenho a certeza que foi o passo certo a dar nesta fase da minha carreira, ajudar o Sp. Braga a ser cada vez maior. Quando soube, quando vieram as notícias, sou sincero, que eu saiba eram só rumores. Reagi de forma normal porque ninguém me tinha contactado, não tinha uma grande verdade, mas não ficou fora de equação. O Sp. Braga sendo dos principais clubes em Portugal, é sempre bom ser associado, mas depois quando se formalizou esse contacto. claro que fiquei satisfeito, porque fizeram-me sentir desejado e é isso que um jogador quer, sentir-se útil, sentir-se querido, onde as pessoas que estão cá sabemos que podemos acreditar naquilo que dizem. Para mim, foi das coisas boas que me fizeram seguir em frente e vir para cá”, acrescentou Moutinho.