Não, não é pornográfica, é “pornograficamente horrenda”, diz o presidente da Câmara do Porto que diz ter “legitimidade acrescida” para ter esta opinião. Depois da polémica sobre a remoção da estátua de Camilo Castelo Branco abraçado a uma mulher nua na praça Amor de Perdição, na cidade, o autarca vem agora justificar a sua posição num artigo de opinião publicado nesta segunda-feira no jornal Público.

Tetraneta de Camilo Castelo Branco diz que polémica sobre estátua é “aberrante”. Nova petição luta para manter obra

Rui Moreira, que primeiro mandou retirar a estátua atendendo à petição que o assim o pedia, acabaria depois por reverter a sua decisão, não por ter mudado de opinião, não porque houve uma outra petição para que a escultura não fosse removida, mas porque uma decisão anterior do executivo camarário, em 2012, determinava a sua localização.

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Rui Moreira volta atrás: estátua de Camilo Castelo Branco fica onde está

O autarca refere o currículo das 37 pessoas que assinaram o pedido inicial — onde figuram o ex-bancário e presidente da Fundação Calouste Gulbenkian e de Porto Capital da Cultura de 2001 Artur Santos Silva, o jurista e conselheiro de Estado António Lobo Xavier, ou a vereadora da cultura Ilda Figueiredo — referindo que “questão numérica” não é a “única relevante”.

Da lista, o autarca destaca ainda “Miguel Von Hafe e Bernardo Pinto de Almeida, dois reputados especialistas e críticos de arte; Mário Cláudio, que é um dos nossos maiores escritores; pintores como Armando Alves e Carlos Reis; professores universitários como Mário Bismark, Francisco Mangas, presidente da Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto”.

O autarca sublinha que “são pessoas de quadrantes ideológicos muito diversos, em que não faltam apoiantes” do seu antecessor, “que, com toda a legitimidade, decidiu pela colocação da estátua. Ninguém se atreverá a dizer que não têm currículo, ou que são reacionários e moralistas”, escreveu.

Além do mais, Rui Moreira também tem opinião e, frisa, com “legitimidade acrescida” por ser presidente do município e ter a tutela do pelouro da cultura, destaca o autarca.

“Não sou especialista em estatuária, mas não gosto da estátua. Não por pudor ou moralismo. Felizmente, o nu e o erotismo fazem parte da arte, e estão presentes na cidade. Não considero aquela estátua erótica ou pornográfica. Apenas pornograficamente horrenda. E, conhecendo a obra imortal de Camilo, e a história de Ana Plácido, não consigo ver qualquer relação da obra Amor de Perdição com a estátua”.

Rui Moreira, que parece lamentar “o inusitado eco na opinião pública e na comunicação social” que o assunto tevr, ainda lança um farpa ao autor da estátua, Francisco Mangas, que a ofereceu ao Porto, e que esclareceu que não é Ana Plácido que está representada na estátua, mas sim todas as mulheres da obra de Camilo:” Afinal, já sabemos onde houve revisionismo histórico…”

O facto de a peça ter sido doada pelo autor à cidade também não o “comove”. “As câmaras recebem muitas propostas e ofertas e são livres de não as acolher. Veja-se como Moedas foi chacinado ao aceitar a oferta a Lisboa das estátuas dos médicos. Compreendo que haja quem discorde e se mobilize. É legítimo, desde que não se recorram a leituras intolerantes”.

E a terminar, diz que “ao contrário da sabedoria popular, os gostos discutem-se e mudam. É assim no Porto, onde, felizmente, tudo se discute” sem, no entanto, não deixar de aludir à  recolocação da estátua Porto na Sé, lembrando que é também esse um ato seu, “uma reversão” e desafiando: “Veremos se suscita indignação”.