O Tribunal Constitucional (TC) defende que a conservação dos metadados das comunicações, independentemente do prazo, teria de ser limitada e não generalizada, advertindo que a solução encontrada pelo parlamento continua a incluir cidadãos sem suspeição de atividade criminosa.

O TC declarou, esta segunda-feira, inconstitucional uma norma desse decreto que prevê a conservação generalizada de dados de tráfego e localização “pelo período de três meses a contar da data da conclusão da comunicação, considerando-se esse período prorrogado até seis meses, salvo se o seu titular se tiver oposto”.

Tribunal Constitucional chumba parte da lei dos metadados

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No acórdão que fundamenta a decisão, o TC sublinha que os legisladores se “limitaram a restringir, para estas categorias de dados, o prazo de conservação” que estava previsto na lei dos metadados, e que já tinha sido declarada inconstitucional pelo TC em abril de 2022.

Segundo os juízes do TC, tendo em conta que o acórdão de abril de 2022 já tinha indicado que a lei dos metadados ultrapassava “os limites da proporcionalidade no que respeita ao âmbito subjetivo” e que o novo decreto não altera esse âmbito, não havia “como não manter o juízo de inconstitucionalidade então emitido”.

A conservação “continua a ser geral e indiferenciada, e não seletiva, por não se dirigir, de forma direta, objetiva e não discriminatória, a pessoas que tenham uma relação com os objetivos da ação penal, antes atingindo (ou melhor dizendo, continuando a atingir) sujeitos relativamente aos quais não há qualquer suspeita de atividade criminosa”, indica-se.

“O que vale por dizer, como possíveis suspeitos da prática de crimes”, assinalam os juízes.

O TC defende assim que, no decreto do parlamento, “os testes do princípio da proporcionalidade – seja o da necessidade, seja o da proporcionalidade em sentido estrito – não foram superados pelo legislador”.

“Para que tal tivesse acontecido, não se revela suficiente a limitação temporal levada a cabo, impondo-se inelutavelmente que tivesse sido realizada uma limitação do âmbito subjetivo das normas”, sublinha-se.

Os juízes dizem estar cientes de que o direito português já contempla a existência de uma base de dados, designadamente a base das operadoras de telecomunicações utilizada para fins de faturação, que também prevê a conservação de dados de tráfego por um período de seis meses.

No entanto, os juízes ressalvam que, para além da sua finalidade ser “completamente distinta”, essa conservação de dados para efeitos de faturação está “sujeita ao consentimento do titular dos dados”.

Numa alusão à proposta inicial de lei do Governo sobre metadados – que previa precisamente o acesso às bases de dados das operadoras para fins de investigação criminal -, os juízes referem que os titulares dão o consentimento à conservação dos seus dados apenas “na medida do necessário e pelo tempo necessário à comercialização de serviços de comunicações eletrónicas”.

“O que implica, em suma, que esta disciplina não seja mobilizável para efeitos comparativos com o regime em apreço”, salienta o TC, apesar de referir que não se está a pronunciar “quanto à viabilidade constitucional de acesso pelas autoridades de investigação criminal a dados conservados pelas operadoras em cumprimento de outras normas legais”.