A Procuradoria-Geral da República (PGR) já está a investigar os elementos detetados na auditoria preliminar ao negócio de internacionalização da Santa Casa, que a nova provedora disse apontarem para “indícios de irregularidades”. Esses indícios foram comunicados pela instituição à PGR a 18 de setembro.

Essa comunicação só foi conhecida no final de setembro, quando Ana Jorge — que é provedora desde maio — anunciou no Parlamento que os resultados intercalares da auditoria externa à Santa Casa Global, pedida pela ministra da Segurança Social, revelaram “procedimentos que não cumpriam as normas em vigor e indícios de irregularidades“, o que levou a Santa Casa a enviar para a PGR os “elementos disponíveis”. O negócio de internacionalização — iniciado através da empresa Santa Casa Global — que está a ser alvo de uma auditoria externa foi lançado durante a anterior gestão, de Edmundo Martinho.

Auditoria à Santa Casa Global detetou “indícios de irregularidades”, que provedora já enviou à PGR

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Na altura do anúncio de Ana Jorge, o Observador questionou a PGR sobre se já tinha aberto um inquérito aos elementos enviados pela provedora. A resposta chegou esta quinta-feira. “Confirma-se a instauração de inquérito que teve origem em participação da Santa Casa da Misericórdia à Procuradoria-Geral da República. O mesmo encontra-se em investigação no DCIAP e está sujeito a segredo de justiça“, indica fonte oficial da PGR.

Um dos elementos que levantou dúvidas à nova mesa foi o facto de apenas ter sido pedido ao Ministério com a tutela da Santa Casa uma autorização de investimento de cinco milhões de euros numa fase inicial do processo de internacionalização. Quanto aos restantes investimentos, “não há evidência desses pedidos”, disse a provedora, na audição. O entendimento do Ministério da Segurança Social é que essas operações teriam de ter autorização expressa da tutela.

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Na altura, ao Observador, Edmundo Martinho viria a garantir que informou o Ministério sobre os valores dos investimentos previstos para a expansão internacional através dos planos de atividade e orçamento apresentados pela SCML à tutela, documentos que foram sempre aprovados e nos quais os investimentos estariam previstos. Mas reconheceu que “não houve um pedido explícito [da Santa Casa a Ana Mendes Godinho] para esta intervenção aqui ou acolá”. “Não o fizemos porque entendemos que não havia necessidade depois da autorização dada em 2020”, justificou.

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Mas há outros elementos a levantar dúvidas. Segundo apurou o Observador, os dados já apurados na auditoria externa à operação internacional detetaram a existência de compromissos financeiros adicionais que podem recair sobre a Santa Casa. Entre dívidas reclamadas à empresa que explora o jogo no Rio de Janeiro, empréstimos obrigacionistas, bancários e cartas de conforto obtidas junto de bancos, mais os investimentos feitos pela Santa Casa, os valores podem ultrapassar os 50 milhões de euros, mais do dobro do que foi admitido pela provedora em agosto.

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Depois de dois adiamentos pedidos pela auditora, a BDO, os resultados finais da auditoria externa deverão ser entregues ainda este ano. De acordo com informação recolhida pelo Observador, o mais provável é que pelo menos uma parte das perdas tenham de vir a ser reconhecidas nas contas deste ano da instituição. A auditoria em curso pode, também, determinar alterações às contas de 2021 e 2022 que foram apresentadas pela anterior administração e que a tutela se recusou até agora a validar.