O Sindicato dos Jornalistas pediu esta terça-feira à Assembleia da República que crie legislação para maior escrutínio dos investidores que entram no capital de grupos de comunicação social, em audição sobre o despedimento coletivo anunciado no Global Media Group.

“O Sindicato dos Jornalistas gostaria de pedir à Assembleia da República que crie legislação para que fundos financeiros não possam entrar nestes grupos de media”, afirmou o vogal do sindicato Augusto Correia, em audição, no parlamento, dos delegados sindicais dos jornalistas das redações do Jornal de Notícias, do Diário de Notícias, da TSF, de O Jogo e do Sindicato dos Jornalistas, sobre o despedimento coletivo no Global Media Group (GMG), por requerimento dos grupos parlamentares do PCP e do BE.

O também jornalista do JN defendeu um maior escrutínio aos fundos financeiros, ou qualquer investidor nos media, para que se assegure a sua idoneidade e a capacidade “para fazer coisas básicas, como pagar salários”.

No dia 6 de dezembro, em comunicado interno enviado no primeiro de dois dias de greve de trabalhadores do grupo, a Comissão Executiva da GMG, liderada por José Paulo Fafe, confirmou que iria negociar com caráter de urgência rescisões com 150 a 200 trabalhadores e avançar com uma reestruturação que disse ser necessária para evitar “a mais do que previsível falência do grupo”.

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No final de julho, o fundo de investimento World Opportunity Fund, com sede nas Bahamas, um chamado “paraíso fiscal”, passou a deter 51% do capital social da Páginas Civilizadas, a qual controla, diretamente e indiretamente, 50,25% da Global Media e 22,35% da agência de notícias Lusa.

“Esta administração está apenas há três meses em funções e entrou como um elefante numa sala de porcelana. Está a provocar inúmeros danos reputacionais e até económicos, com declarações quase diárias do CEO na comunicação social. […] A publicidade já começou a descer”, apontou a delegada sindical Maria Augusta Casaca, da TSF, rádio que esteve em greve, em setembro, pela primeira vez em 35 anos de história.

Os representantes dos trabalhadores disseram ter sido surpreendidos com as referências da administração à má situação financeira do grupo, que usa para justificar os despedimentos, uma vez que contrariam a intenção de investir e fazer crescer os títulos demonstrada nas primeiras reuniões com os delegados sindicais.

“Eu não acredito que uma pessoa competente compre um grupo com a dimensão da Global Media sem perceber todas as dimensões desse grupo, eu só acredito que se gastem milhões de euros depois de se saber toda a realidade financeira de um grupo com esta dimensão”, afirmou o presidente do Sindicato dos Jornalistas, Luís Filipe Simões.

Segundo aquela estrutura, desde a entrada da nova administração, os salários começaram a ser pagos no último dia permitido ou no dia seguinte, o que a empresa justificou com as transferências entre bancos diferentes.

Adicionalmente, o subsídio de Natal não foi pago, estando a administração a tentar impor o pagamento em duodécimos no próximo ano, os salários de outubro dos jornalistas precários a recibos verdes também não foram transferidos e há contratos a termo que não estão a ser renovados.

Os responsáveis sindicais denunciaram ainda o que consideram ser uma postura “hostil” de José Paulo Fafe, chegando mesmo a ler dois emails enviados a delegadas do sindicato.

“[José Paulo Fafe] tem feito declarações que considero até desrespeitosas para com as pessoas, delegadas sindicais, quando faz declarações, geralmente para o jornal Eco”, apontou a jornalista da TSF Maria Augusta Casaca.

Os grupos parlamentares manifestaram-se solidários com a situação daqueles trabalhadores e pediram sugestões aos responsáveis sindicais sobre como pode a Assembleia da República atuar.

Além da legislação para escrutinar a entrada de investidores, o sindicato propôs ainda o modelo nórdico de financiamento estatal aos órgãos de comunicação social ao “bom trabalho jornalístico”, através de candidaturas em que os meios são financiados consoante os seus méritos.

“Nós não temos qualquer problema com financiamento estatal, eu tenho mais medo das pressões financeiras, de jornalistas que não têm dinheiro, do que de jornalistas que recebem telefonemas de políticos. Nós estamos bem preparados para lidar com as pressões, não estamos é preparados para não ter dinheiro ao fim do mês”, defendeu Augusto Correia.

Segundo o sindicato, 19% dos jornalistas do grupo recebe um salário de 820 euros e há trabalhadores que em 20 anos nunca foram aumentados.

O programa de rescisões na Global Media Group termina na próxima quarta-feira, 20 de dezembro, confirmou à Lusa fonte oficial da administração.

A demissão do diretor do Dinheiro Vivo (DV), Bruno Contreiras Mateus, em 14 de dezembro, aumentou para 11 o número de demissões em cargos de direção no grupo, juntamente com as cinco do Jornal de Notícias (JN), duas no jornal desportivo O Jogo e três, em 12 de dezembro, na TSF.

No domingo, os trabalhadores do JN, cujos despedimentos afetarão cerca de 40 pessoas, garantiram que vão recorrer a todos os meios legais e judiciais para defender os seus direitos. No caso da TSF, o número de postos afetados ronda os 30.

Entretanto, o Sindicato dos Jornalistas fez uma exposição à Inspetora Geral da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), solicitando a intervenção da entidade na fiscalização de “várias irregularidades” no grupo de media.