As eleições estão “mesmo à porta” e, por isso, Pedro Soares dos Santos quis ser “contido” nas palavras. Questionado sobre os possíveis resultados das legislativas, o presidente do conselho de administração da Jerónimo Martins sublinhou que “sem boa gestão não há resultados”. E defendeu que “seria bom alguma mudança”.

“Neste momento, a fraca qualidade dos nossos políticos obriga-nos a pensar se não devemos mudar enquanto sociedade”, começou por dizer, na conferência de apresentação dos resultados da dona do Pingo Doce, que revelou esta quarta-feira lucros de 756 milhões de euros. Soares dos Santos considerou que o problema do país não é a falta de dinheiro mas antes “a falta de qualidade e a falta de gestão das pessoas”.

“Se os nosso políticos, nos últimos 20 anos, tivessem sabido responder às necessidades do país, Portugal tinha crescido e não tinha estagnado”. Face a isto, conclui Soares dos Santos, “acho que seria bom alguma mudança”.

Questionado sobre o que deveria mudar, em concreto, Soares dos Santos acrescentou apenas que “cada um tem de refletir se gosta ou não do que está a viver. Ou a sociedade como um todo entende que vale a pena mudar, ou se não entende não se muda. É um problema da sociedade como um todo, não é de pessoas. Se acham que é preciso mudar que tenham coragem de assumir e lutar por essa diferença”.

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Vendas de 30 milhões? “Nunca pensei que fosse possível”

Na análise aos resultados do grupo, apresentados esta quarta-feira, Soares dos Santos destacou o valor das vendas, que ultrapassou pela primeira vez os 30 mil milhões de euros. “Nunca pensei que fosse possível”, admitiu o CEO. “É um número fantástico que prova o que é a Jerónimo Martins nos mercados em que opera”, sendo a Polónia “o objetivo principal”. O EBITDA (lucro antes de impostos, juros, apreciações e depreciações) ultrapassou os dois mil milhões de euros, um indicador “muito bom”. As taxas de crescimento têm sido “sempre constantes e é isso que faz a sustentabilidade do negócio, ir galgando de forma constante e segura” e não por “picos”.

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Tal como já tinha antecipado na apresentação dos resultados ao mercado, a Jerónimo Martins espera um 2024 mais “difícil” do que 2023, devido à deflação alimentar e à inflação de custos, nomeadamente com salários e rendas. “Agora celebramos o que conseguimos em 2023 mas não escondemos que com o aumento de custos que estamos a sentir, sabemos que vamos ter um ano complicado”, sublinhou a administradora financeira do grupo, Ana Luísa Virgínia. “Quando a inflação não contribuir para as nossas vendas”, como aconteceu em 2023, “vamos ter de lutar ainda mais pelos volumes”.

Na apresentação dos lucros do de 2022, Soares dos Santos admitiu que a inflação tinha ajudado as contas do grupo, mas que era um “imposto perígossíssimo” para as empresas. O grupo mantém essa posição. Segundo Ana Luísa Virgínia, as margens do grupo “não subiram” apesar do aumento dos preços, porque a escolha foi ter preços mais concorrenciais. O que vai continuar a acontecer, corroborou Soares dos Santos.

Inflação “ajudou” resultados da Jerónimo Martins mas é “imposto perigosíssimo” que “destrói sociedades e empresas”, diz Soares dos Santos

“Vamos continuar a investir em ter preços mais concorrenciais e que não ponham em causa o balanço da companhia. Esse esforço tem de se fazer. A margem, nos últimos 5 ou 6 anos, está permanentemente a baixar. Se o consumidor não beneficiar desse equilíbrio nós não ganhamos. Preferimos volumes, eu prefiro vender mil caixas a 1 euro do que 100 caixas a 10 euros. Vamos fazer o que for possível, tudo o que recebermos do mercado vamos passar para o consumidor”, sublinhou o líder máximo da Jerónimo Martins. “Vamos atravessar dois anos, se calhar,  não com os crescimentos que tivemos até aqui. Há ciclos bons e ciclos menos bons”, previu. O que não vai mudar é a subida dos salários dentro do grupo, assegurou.

“Todos os operadores vão sentir pressão nos custos. Para diluir essa pressão são precisas mais vendas, [os concorrentes] vão ter de investir em preço. O mercado vai sentir uma pressão nas margens pelo aumento dos custos e pela concorrência a lutar pelas venda para diluir esses custos”, acrescentou a administradora financeira.

Dona do Pingo Doce fecha 2023 com lucros de 756 milhões de euros, um aumento de 28%

Pingo Doce abre 50 restaurantes para ser “maior cadeia de Portugal”

Jerónimo Martins investiu, em 2023, mais de 1,2 mil milhões de euros. “Somos talvez o maior investidor português neste momento”, sublinhou Soares dos Santos. E conta manter o ritmo este ano. Além das aberturas e remodelações de lojas e da entrada na Eslováquia, em Portugal uma das apostas será na rede de restaurantes dos supermercados. O grupo fechou 2023 com 190 espaços, revelou Isabel Ferreira Pinto, CEO do Pingo Doce. E prevê abrir mais 50 em 2024. “Contamos terminar 2024 como a maior cadeia de restauração em Portugal”, adiantou a gestora.

Essa é uma das estratégias do grupo para enfrentar a concorrência crescente. “O está a acontecer em Portugal não é novo”, afirmou a gestora, questionada sobre o aumento da concorrência com o crescimento de cadeias como a Mercadona. “Estamos habituados a operar num mercado competitivo e encaramos isso com naturalidade. Nesse sentido, a “proposta de preço” e a “atividade promocional” continuará a ser o “centro da estratégia” do grupo.

“Eu gosto de concorrência, sem concorrência as companhias não se modernizam. A concorrência obriga-nos a trabalhar melhor e mais, e as pessoas ganham com mais concorrência”, complementou Soares dos Santos.

Joaninha voa para a Eslováquia

Uma das novidades da Jerónimo Martins este ano será a entrada na Eslováquia, naquela que será a quarta geografia do grupo depois de Portugal, Polónia e Colômbia. Nenhum dos responsáveis da administração quis adiantar grandes pormenores sobre a operação. Será uma internacionalização da Biedronka, a marca da ‘joaninha’ que a JM tem na Polónia e que é conhecida na Eslováquia. “Há muitos consumidores da Eslováquia que passam a fronteira para ir à Biedronka, conhecem a marca, conhecem a proposta de valor”, destacou Luís Araújo, CEO da Biedronka, que será responsável pela operação eslovaca.

Apesar disso, será nomeado um CEO próprio, polaco, que está há 20 anos no grupo. A base da operação ficará nesse país, que representa 70% das vendas da Jerónimo Martins. Apesar de a palavra “biedronka” não ter o mesmo significado em eslovaco que tem em polaco (joaninha), os “ativos poderosos” que a marca detém na Polónia e a “questão emocional” pesaram na escolha.

O número de aberturas previstas não foi revelado, apenas que já “está desenhada a logística que suportará a operação” e que o objetivo é “alavancar o que construímos na Polónia”. Haverá um “trabalho de adaptação do sortido” e estão “asseguradas as primeiras lojas, que contamos abrir no final do ano”. As aberturas “serão algumas este ano e no próximo”. Luís Araújo garantiu ainda que  a entrada na Eslováquia “não compromete os objetivos” para as outras geografias, nomeadamente na Colômbia, onde o grupo detém a Ara.