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Patti Smith, Soundwalk Collective e um palco para o som alucinante da poesia

“Correspondences”, a performance que completa a exposição imersiva “Evidence”, juntou Patti Smith ao Soundwalk Collective, no sábado em Lisboa e no domingo em Braga. Estivemos na primeira noite.

A base do espetáculo são os sons trazidos para estúdio por Crasneanscki (Soundwalk Collective), a partir de várias viagens, da Rússia à Índia, combinadas com a poesia que Smith escreve à mão
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A base do espetáculo são os sons trazidos para estúdio por Crasneanscki (Soundwalk Collective), a partir de várias viagens, da Rússia à Índia, combinadas com a poesia que Smith escreve à mão

Rita Carmo

A base do espetáculo são os sons trazidos para estúdio por Crasneanscki (Soundwalk Collective), a partir de várias viagens, da Rússia à Índia, combinadas com a poesia que Smith escreve à mão

Rita Carmo

Björk, de visita a Lisboa, foi das primeiras a chegar no sábado ao Centro Cultural de Belém, perto das 18h00, uma hora antes da esgotada performance de Patti Smith com o Soundwalk Collective, disfarçada num fato dourado com um véu. No dia anterior, a cantora islandesa também já tinha marcado presença na apresentação da exposição Evidence, o pretexto da sacerdotisa do punk para este regresso a Portugal.

A exposição imersiva, inaugurada na sexta-feira, 22 de março, e no MAC/CCB Museu de Arte Contemporânea até 15 de setembro, foi criada originalmente em 2022 para o Centre Pompidou, em Paris, onde esteve quatro meses. A instalação sonora foi feita pela cantora com o Soundwalk Collective de Stephan Crasneanscki, uma espécie de viagem sonora de auscultadores, acompanhada por imagens e objetos, e inspirada por três emblemáticos poetas franceses, Antonin Aurtaud, Arthur Rimbaud e René Daumal. Na exposição, interessa-lhes, sobretudo, explorar as passagens dos autores por lugares longínquos como o planalto abissínio da Etiópia, a serra Tarahumara, no México, ou o topo dos Himalaias indianos, por onde Crasneanscki viajou e recolheu uma coleção de sons.

Correspondences, a performance que completa a exposição como uma cereja no topo do bolo, é a evolução do trabalho que Patti Smith tem feito com Crasneanscki, o fundador do coletivo, desde que os dois se conheceram numa viagem de avião e perceberam o universo que tinham em comum, da arte à política, do ambiente ao cinema, sem esquecer os ídolos literários.

Nos visuais, uma das componentes mais importantes da performance, há uma narrativa intensa, feita com imagens do cineasta português Pedro Maia

Rita Carmo

Em 2016, Patti Smith ofereceu-se para dar voz à poesia de Killer Road, de Crasneanscki, um tributo à cantora e atriz alemã Nico, sua amiga, que evoca a sua morte de bicicleta numa estrada em Ibiza no verão de 1988. Entre 2017 e 2021, os dois artistas juntaram-se em estúdio para criar Perfect Vision, um tríptico de álbuns alimentado pelas vivências de Artaud, Rimbaud e Daumal e pelas suas experiências transcendentais, como as alucinações de Artaud com peiote, no México, igualmente retratadas na exposição.

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Sem peiote, a performance Correspondences, que surge na sequência dos quatro álbuns, é por si só uma viagem alucinante pela poética crescente de Smith, aqui de regresso às suas raízes de spoken word, em sincronia com as paisagens sonoras do Soundwalk Collective.

“Evidence”: a viagem sonora e visual de Patti Smith e do Soundwalk Collective

Nos visuais, uma das componentes mais importantes da performance, há uma narrativa intensa, feita com imagens do cineasta português Pedro Maia, de animais embalsamados num museu a stencils de veados, de lobos de olhos penetrantes a caminhar na neve a explosões no fundo do oceano.

A base do espetáculo são os sons trazidos para estúdio por Crasneanscki de várias viagens, da Rússia à Índia, combinadas com a poesia que Smith escreve à mão — apesar de toda a tecnologia que domina a performance, a artista de 77 anos utiliza pouco ecrãs e prefere escrever nos seus cadernos. “Ele [Crasneanscki] vai pelo mundo e bebe da natureza”, explicou Smith numa entrevista este mês na Feira de Música de Guadalajara, no México, por onde “Correspondences” também passou. “Traz-me de volta o barulho do vento, o murmúrio das folhas, os barcos no rio, o canto das mulheres, os sinais de rádio ou o oceano e isso evoca em mim histórias.”

Quem foi ao CCB para ouvir sucessos foi ao engano. Só no fim houve "People Have The Power"

Rita Carmo

A construção é feita por “camadas”, continua Smith. Primeiro com som, depois com a linguagem e referências à biografia dos três poetas que conduzem a viagem e, por fim, através da parte visual, que hipnotiza a plateia ao longo de mais de uma hora.

Medeia foi um dos primeiros momentos a serem criados para a performance, embora no espetáculo, só surja mais para o fim, com o palco já repleto de folhas A4 que Smith vai deitando para o chão depois de ler.

Os sons que compõem o poema foram recolhidos pelo Soundwalk Collective em dois meses de barco pela costa do Mar Negro. “Do you remember me?”, pergunta Smith. “I am Medea. I almost remember myself.” Em pano de fundo, e em perfeita sincronia, estão imagens de Medeia, filme de Pasolini de 1969, com Maria Callas, material inédito que não foi usado pelo realizador, e foi cedido à artista e ao coletivo pela Fundação Pasolini.

O polémico realizador terá direito, aliás, a vários momentos de homenagem durante a performance, com imagens também dos seus últimos dias de vida, retratados no filme de 2014 de Abel Ferrara, protagonizado por Willem Dafoe. Outro dos realizadores homenageados é Tarkovsky, um dos favoritos de Smith, através de Andrey Rublev, de 1966. Crasneanscki recolheu sons dos mosteiros por onde o pintor Rublev terá passado. Para colorir a paisagem, foi o próprio filho de Tarkovsky que os deixou usar e editar filmagens antigas inéditas.

“Às vezes, o que fazemos é simplesmente traduzir isso numa obra de arte e dar isso às pessoas para ajudá-las a ser mais conscientes do que se está a passar", disse Patti Smith

Rita Carmo

A performance resulta também de uma colaboração com a associação sem fins lucrativos TBA21 Academy, com uma reflexão sobre a exploração desmesurada de petróleo – “Oil, oil, oil”, repete Smith – e o impacto dos canhões pneumáticos sísmicos e de outras intervenções humanas nos oceanos. “Há tantas coisas a acontecer no mundo injustas para a natureza e para a humanidade e às vezes sentimo-nos impotentes para mudar”, disse Patti Smith na mesma entrevista deste mês no México. “Às vezes, o que fazemos é simplesmente traduzir isso numa obra de arte e dar isso às pessoas para ajudá-las a ser mais conscientes do que se está a passar.”

O momento político mais óbvio da noite aconteceria já no encore da performance. Depois de ser aplaudida de pé, Patti Smith regressou ao palco para cantar duas canções, desculpando-se por estar com tosse e a sua voz não estar no seu melhor. Com ela, veio a filha, Jesse Paris Smith, ao piano, para tocar Wing, tema do álbum Gone Again, de 1996, que dedicou às “crianças” do nosso “amado, mas problemático mundo”.

Da plateia, alguém gritou “Free Palestine” e a cantora responderia na música seguinte, a famosa People Have The Power, dedicada às “pessoas de Rafah”, que pôs toda a gente de pé a cantar.

Quem foi ao CCB para ouvir sucessos foi ao engano. Só no fim houve esta pista daquilo que irá acontecer a 7 de julho, quando Patti Smith regressar a Portugal com a sua banda (o guitarrista Lenny Kaye, o baterista Jay Dee Daugherty, o baixista e teclista Tony Shanahan e o seu filho, o guitarrita Jackson Smith) para o festival Jardins do Marquês, em Oeiras.

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