A proposta de “revisitar” a lei do preço fixo do livro, inscrita no programa do Governo, é vista com expectativa tanto pela Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) como pela Rede de Livrarias Independentes (RELI). Trata-se de uma “medida estruturante para os desequilíbrios do mercado”, diz Pedro Sobral, da APEL.

“Revisitar a Lei do Preço Fixo do Livro, promovendo mecanismos de apoio a livrarias e editoras independentes”, inscreve o Governo de Luís Montenegro no programa divulgado esta quarta-feira.

A alteração à lei do preço fixo do livro, uma lei que limita a 10% os descontos que as livrarias podem fazer nos primeiros 24 meses após a publicação de uma obra, não constava no programa eleitoral da Aliança Democrática (AD), mas era uma proposta da Iniciativa Liberal e do Livre nos seus programas. Se no primeiro se argumentava que “os preços dos livros devem ser formados em mercado concorrencial”, o segundo sublinhava que os moldes desta lei geram uma “concorrência desleal entre as grandes superfícies, redes livreiras e livrarias independentes”.

Horas depois da divulgação do programa do novo Governo, Pedro Sobral, presidente da APEL e do grupo Leya, assumia estar “expectante” com a notícia sobre aquela que considera ser uma “medida estruturante para os desequilíbrios do mercado”. “A última alteração foi claramente insuficiente e na altura a APEL referiu-o publicamente”, lembra ao Observador. A última mexida na lei do preço fixo do livro foi em 2022, alargando para 24 meses o prazo de proteção das novas edições, em vez de 18, uma mudança que não colheu grande entusiasmo no setor, que a considerou insuficiente. “A APEL há muito que andava a pedir uma atualização e uma reforma. Com o anterior ministro estávamos a começar a preparar esse trabalho”, adianta ainda. Sem querer divulgar as “propostas muito concretas” da APEL, Pedro Sobral diz que aguarda a possibilidade de diálogo com o ministério tutelado por Dalila Rodrigues.

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Já Rosa Azevedo, da livraria Snob e da direção da RELI, diz ser “positivo que [o assunto] esteja em cima da mesa” no programa do Governo de Luís Montenegro, mas considera “vago” o que é resumido a “uma linha” no documento.

“O objetivo é um país em que o livro tem um preço justo”, ambiciona a responsável, que explica que “a RELI acredita numa Lei do Preço Fixo do Livro mais igualitária para toda a gente, como existe em França, por exemplo”, em que a existência de um preço comum tem protegido as livrarias independentes da concorrência. “É vantajoso incluindo para o cliente que sabe qual é o preço do livro”, crê.

Questionada pelo Observador sobre as propostas da RELI em concreto sobre esta matéria, a porta-voz da Rede de Livrarias Independentes escolhe não as explicitar, remetendo para um diálogo “em sede própria com o Governo”.

Medidas de combate à destruição de livros “não é medida estruturante”, diz APEL

Outra das medidas do programa do novo Governo esta quarta apresentado propõe “avaliar a criação de isenções fiscais relativas à tributação do valor dos livros em armazém, de modo a minimizar a destruição de livros devolvidos às editoras”. Esta também não é uma medida original da AD, mas sim uma medida do programa eleitoral do Partido Socialista. “Um futuro Governo do PS”, lia-se então no documento dos socialistas, prometia “equacionar isenções fiscais relativas à tributação do valor dos livros em armazém, prevenindo a destruição de livros devolvidos às editoras”.

Para o presidente da APEL, porém, esta é uma questão menor. “Não nos parece que seja uma medida estruturante”, diz Pedro Sobral. “[Destruir livros] não é uma coisa massiva nem é algo que os editores façam de bom grado ou amiúde. Quando os editores necessitam de destruir livros é uma medida de fim de linha. Até chegar ao abate de livros passam-se por muitas etapas”, comenta.

Ainda no que respeita aos livros, o programa do Governo pretende “reforçar os meios da Rede Nacional de Bibliotecas Públicas, da Rede Nacional de Bibliotecas Escolares e das bibliotecas de investigação”, e “promover a tradução e a internacionalização da produção literária nacional, estabelecendo protocolos específicos com o Brasil e os países lusófonos”, lembrando a importância de “assumir a língua portuguesa como um património de valor identitário e global, no contexto de uma estratégia nacional e internacional”, em articulação com o Instituto Camões.

Por último, não sendo diretamente sobre o setor livreiro, mas sobre os hábitos de leitura, o programa de Luís Montenegro frisa uma vontade de “proporcionar o contacto da comunidade escolar com escritores nacionais, incentivando nos jovens um maior gosto pela leitura e pela escrita”, tal como constava no programa eleitoral da Aliança Democrática — resta saber de que forma.