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"A música dele sempre foi natural ao mesmo tempo que era genial", diz o bailarino do vencedor do Festival da Canção 2019
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"A música dele sempre foi natural ao mesmo tempo que era genial", diz o bailarino do vencedor do Festival da Canção 2019

PEDRO PINA

"A música dele sempre foi natural ao mesmo tempo que era genial", diz o bailarino do vencedor do Festival da Canção 2019

PEDRO PINA

As histórias sobre Conan Osiris contadas por quem o conhece: "Sempre sofreu bué por não abdicar do que é"

Conan Osiris é também Tiago Miranda - ou "ganda" para o círculo mais chegado. Do bailarino à ex-patroa na sex-shop, seis testemunhos em discurso direto sobre a vida incrível do vencedor do Festival.

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Quando sai à noite com colegas, Conan Osiris pede leite nos bares. Não discute habitualmente sobre música com os amigos.  E quando percebeu que começou a ter algum sucesso, comentou com o bailarino que o acompanha nas atuações: “Já percebeste que as pessoas estão a ficar malucas?” Mesmo os que não percebem o êxito do vencedor do Festival da Canção não ficam indiferentes à sua postura em palco, às sonoridades menos óbvias, e à excentricidade com que brinda o público. Por detrás de Conan Osiris, o músico de 30 anos que surge com máscaras e anéis a fazer lembrar garras, está Tiago Miranda. Seis pessoas que o conhecem bem descrevem-no na primeira pessoa.

“Era muito divertido para mim depois de um dia de trabalho ter aquela personagem ali a fazer aquelas figuras”

Sara Peixinho, dona da sex shop onde Conan Osiris trabalhava

“Eu conheço o Tiago já há muitos anos. Era muito novo quando começou a trabalhar comigo, não sei até se terá sido o primeiro emprego dele. Começou a trabalhar connosco devia ter para aí uns 20 anos, mais ou menos, e deixou de trabalhar connosco há relativamente pouco tempo. Deixou de trabalhar no ano passado, porque as coisas já estavam a ficar inconciliáveis, ele já estava a viajar muito, já tinha vários espetáculos marcados, já não conseguia conciliar isso com o trabalho.

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No início, ele explicou-me logo que tinha esses projetos musicais, que era uma coisa que ele gostava de fazer, que despendia algum tempo naquilo, e se nós conseguíamos fazer ali um horário que fosse compatível com a vida dele. Eu disse-lhe que sim, que arranjávamos aqui uma maneira e tal, e fomos sempre gerindo as coisas. Porque o Tiago é uma pessoa com quem é muito fácil conviver, é uma pessoa extraordinária. Eu não digo isto por ele ser também meu amigo, e por termos uma relação pessoal… Mesmo a nível profissional o Tiago é uma pessoa muito metódica, muito trabalhadora, muito disciplinada, é extremamente inteligente e extremamente sensível. É uma pessoa com quem é fácil chegar a entendimentos razoáveis. E, portanto, logo desde o início ele teve da minha parte todas as facilidades para poder ir trabalhando na música dele, naquilo que ele gostava de fazer. Foi cozinhando aquilo que ele é hoje ao longo desse tempo, com a total liberdade e flexibilidade de horários que nós lhe proporcionámos.

"Então às vezes encontrava-o a fazer aquelas danças sozinho na loja, aquelas danças que não lembram a ninguém, não é… E ria-me imenso porque ele estava sozinho na loja, punha lá uma música qualquer, mas era hilariante vê-lo a dançar sozinho."
Sara Peixinho

A sex shop ContraNatura existe há mais de 20 e tal anos, e o Tiago se calhar está entre os 5 melhores empregados que eu alguma vez tive na vida, e eu já tive muitos. O Tiago era uma pessoa que trabalhava com uma honestidade extraordinária, moral e intelectual também. Era um indivíduo que procurava aprender… Ele é de uma humildade tremenda, ele percebe que tem sempre de aprender, ele estudava as coisas, lia, interessava-se, preparava-se, metodicamente, com bastante disciplina, porque ele tem uma capacidade de se organizar tremenda. Não é uma pessoa muito pontual de manhã, é o único defeito que eu tenho a apontar. Mas isso era perfeitamente compensado.

Há tantas, tantas histórias engraçadas… Nós temos câmaras de vigilância na loja e eu via as câmaras imenso, às vezes chegava a casa, e ligava para ver se estava tudo bem. Então às vezes encontrava-o a fazer aquelas danças sozinho na loja, aquelas danças que não lembram a ninguém, não é? E ria-me imenso porque ele estava sozinho na loja, punha lá uma música qualquer, mas era hilariante vê-lo a dançar sozinho. Estava no mundo dele. Isto sempre foi assim, só que há dez anos era uma coisa ainda mais surpreendente, porque se para algumas pessoas ainda é surpreendente (porque ele é de facto original e surpreendente), há não sei quantos anos era ainda mais excêntrico. Só o conseguia ver a dançar de uma forma extremamente eloquente, aquilo era muito divertido para mim depois de um dia de trabalho ter aquela personagem ali a fazer aquelas figuras.

O Tiago é um gajo que não bebe álcool, não fuma, e não vale a pena dizer que ele não se droga, como é evidente. Ele é todo puro nesse sentido. E lembro-me de nós irmos para feiras e irmos sair, e toda a gente pedia isto e aquilo, uns pediam bebidas alcoólicas… E o Tiago bebia leite. Pedia leite nos bares, e era gozado o tempo todo, claro. Nos jantares de natal, e nas saídas que fazíamos em grupo, ele era gozado imensamente porque bebia leite quando toda a gente estava a beber outras coisas.

[Veja no vídeo a atuação de Conan Osíris na final do Festival da Canção]

Depois eram também as excentricidades dele, a forma como ele se vestia. Houve uma altura em que eu comentei com toda a gente arranjarmos uma espécie de uma t-shirt que seria mais ou menos uma farda, mas depois olhei para o Miranda e pensei ‘não, é melhor não, não é?’ e ele ‘ya… não. Deixa ‘tar’. ‘Então pronto, vistam-se lá como quiserem’. No caso dele em particular, há toda uma estética que não é só estética musical. Ele é mesmo assim, as pessoas pensam que aquilo é uma personagem, mas não é. Ele é mesmo assim. Ele é mesmo um ‘granda’ cromo. Claro que se estiver num ambiente mais familiar, está mais descontraído, e há ali nuances que para quem o conhece bem percebe que ele está mais nervoso num determinado momento, ou que está mais tenso. Mas, no geral, aquilo é muito próximo daquilo que ele é realmente.

O Tiago é uma pessoa por quem eu tenho uma grande estima e uma grande amizade. Fico contente com a vitória dele, sendo que não é uma coisa que me surpreenda porque eu sempre achei: ‘Este gajo tem qualquer coisa’. Por isso, até arranjei uma maneira de ele conseguir ter um rendimento extra [quando trabalhava na sex shop], tendo mais tempo para fazer as coisas dele, porque eu achei que se justificava ele investir na carreira dele e fazer a cena dele. O Miranda é uma pessoa muito equilibrada e muito sensata. Mesmo quando aconteciam coisas um pouco mais fora do vulgar, aquilo para ele era tudo normal. Porque o mundo interior dele é muito mais rico do que se possa imaginar. Ele tem um mundo próprio, e esse mundo é muito mais rico do que o nosso. Não há nada que aconteça no nosso mundo que possa realmente surpreendê-lo, a não ser a maldade humana, talvez, ou algumas situações em que isso o chocava… Ele é boa pessoa, ele é realmente uma boa pessoa. Merece todo o sucesso do mundo.”

Partiu o telemóvel e partiu aquilo tudo: a final do Festival, canção a canção

“Nós estamos ligados sem trocar nenhuma palavra”

João Reis Moreira, o bailarino que é um dos “irmãos” desde os tempos de escola

“Desde ontem que tenho estado a pensar nisto tudo. O Tiago estudava com a minha irmã na escola, eles eram muito amigos e, apesar da diferença de idades, sempre tivemos uma relação muito próxima. Ele é o ‘Ganda’. A alcunha mais antiga é essa. Ele tinha um ‘ganda’ cabelo e como desde puto que usou o cabelo comprido, era o ‘ganda’. Essa ficou até agora. Éramos quatro irmãos, com o Ruben [o stylist de Conan Osíris]. Eu enquanto criança tinha um fascínio por pessoas sete anos mais velhas, era uma realidade que não podia alcançar mas eles receberam-me e valorizaram-me, mesmo sendo eu uma criança ainda.

"Dançava sozinho com medo do que os outros pudessem pensar e nessa festa eu vi o Tiago a dançar e eu percebi que a forma como ele se mexia, as imagens do corpo dele a dançar ficaram na minha cabeça para sempre"
João Reis Moreira

Houve um dia marcante na minha relação com ele: a passagem de ano (nem me lembro bem do ano, foi marcante mas não pela data, julgo que foi de 2007/2008) em que vi o Tiago dançar. Eu dançava sempre sozinho, trancado, com vergonha de toda a gente, até da minha irmã com quem tinha uma relação muito próxima. Não via mais ninguém dançar, então não me aceitava a mim próprio, dançava sozinho com medo do que os outros pudessem pensar. Nessa festa vi o Tiago a dançar e a forma como ele se mexia, as imagens do corpo dele a dançar ficaram na minha cabeça para sempre, e sem dúvida que moldaram o meu corpo. Naquele dia eu percebi que não precisava de me esconder, não precisava de ter medo e vergonha do que queria fazer, porque estava ali uma pessoa mais velha que eu admirava tanto a mostrar-me que era possível. Ele é a pessoa que eu conheço que dança melhor e foi mesmo lifechanging.

Conan Osíris com o bailarino que o acompanha nas atuações Créditos: Instagram Conan Osiris

Naquele dia estava tudo em festa e nós os dois a exagerar. Foi como se ele me tivesse dado um abraço e tivesse dito: ‘Ok, podes fazer sempre o que quiseres, sem te preocupares’. É que o Tiago  sempre foi o que foi e sofreu bué por ser o que é, por não abdicar do que é, foi sempre ele próprio mesmo levando essa porrada quase diária. Nesse dia ele viu-me e foi como se dissesse: ‘Podes ser o que quiseres e eu estou cá’. Foi bué importante!

Nessa altura [em 2007], eu ainda não me dava muito com ele e já ouvia a música que ele fazia. Ele tinha uma banda com a minha irmã, os Bodylamb, que era ele que produzia. O meu mp3, que tinha para aí 1gb, estava cheio de músicas dele e depois para aí três músicas que eram as mais recentes, que eu ia mudando. Todos os dias ia para a escola, no 6º/7º ano, a ouvir as músicas dele e isso influenciou-me bué. As músicas dele foram mudando e foram sempre ficando um passo à frente e eu acompanhei essa evolução. Antes de lançar os álbuns já me mandava as músicas, já me perguntava o que é que eu achava, porque também tínhamos uma ligação próxima com a dança, gostamos dos mesmos artistas. Dentro do nosso grupo de amigos somos os que temos o gosto musical mais próximo, temos uma irmandade musical, estamos sempre atentos, é uma coisa que nos dá gosto.

A conversa sobre música e sobre dança sempre esteve muito presente em nós e no dia em que saiu o álbum “Música, Normal” [em 2016], dois dias depois eu já sabia as letras todas de cor. A música dele sempre foi natural ao mesmo tempo que era genial. Eu já conhecia algumas músicas mas não conhecia todas, porque ele gosta de manter sempre o mistério até para os amigos e então lembro-me de que com a “Música, Normal” ele mandou-me o álbum direto para eu ouvir e foi outro dia marcante. Fui para a rua com os phones a ouvir o álbum e andei por Lisboa a chorar e a mandar-me para o chão a rir. Mas a rir à gargalhada e a chorar no chão de joelhos, mas normal, não no sentido comum mas de aceitável: esta música está certa. O raciocínio e a emoção estão num equilíbrio perfeito. É quase como se fosse sublime mas a um nível normal… Não sei explicar, mas para mim é genial.

Conan Osíris ficou em primeiro lugar no Festival da Canção, tanto no voto do público como no voto do júri

PEDRO PINA

Sempre foi uma dúvida para mim como é que este gajo faz esta música e isto era só para os amigos. De repente aparecia alguém do Porto ou das Caldas da Rainha que dizia que conhecia, mas basicamente aquilo era para os amigos e para algumas pessoas. Depois lança o “Adoro Bolos”, o hype começou e as pessoas começaram a ouvi-lo, a ouvir o meu amigo. Foi muito estranho ter as pessoas a falar dele e isso é muito bom. Finalmente! Eu acho muito importante que as pessoas oiçam a música dele, que eu acho que é de facto importante. As pessoas começaram a dar muita atenção ao álbum, a escrever muito sobre ele e quando começaram os convites para as apresentações foi ideia dele, do master, convidar-me.

Subimos ao palco a primeira vez na Galeria Zé dos Bois, depois de termos ido à televisão [Canal Q]. Antes disso, ele disse: ‘já percebeste que as pessoas estão a ficar malucas?’ e eu: ‘yah, estão mesmo’. E ele: ‘convidaram-me para ir à TV, e eu estava a pensar fazer assim: eu canto e tu danças, ‘bora lá fazer alguma cena’. E eu: ‘claro, estamos cá’. Uma das cenas que eu mais curto fazer na vida é dançar, a cena que eu mais curto dançar sem nenhuma dúvida é aquilo que tu fazes. Estás a convidar-me para fazer uma coisa que eu amo, só posso ajoelhar-me e dizer: ‘yahhhh, perfeito’. De repente foram umas coisas atrás das outras. Eu só faltei a dois shows: num tinha uma coisa mesmo inadiável, no outro fui a Amesterdão casar a minha irmã, senão não tinha faltado.

Nós não temos coreografias, de todo. Não nos identificamos. Então cada espetáculo é um espetáculo, a música é a mesma, mas a interpretação vai ser diferente, porque ele canta sempre diferente, exatamente como eu danço sempre diferente. Não vais estar igual em maio como no verão ou no inverno, naquela noite ou naquela tarde. A coreografia é uma coisa que não é a nossa cena.

O que é a nossa cena é estarmos sempre ligados. Tipo ritual de espetáculo: estamos aqui bué juntos e vamos lá começar: 1, 2, 3, bora lá. Nada disso. Nós estamos ligados sem trocar nenhuma palavra. Ele a aquecer a voz, eu a aquecer o corpo e estamos a fortificar uma ligação e quando subimos ao palco ele está à minha frente mas está a olhar para mim e fazemos aquilo com a consciência um no outro. Às vezes até parece coreografia. Lembro-me de que em Braga nós estávamos cada um numa extremidade do palco e começámos a correr ao mesmo tempo e saltámos no meio do palco ao mesmo tempo. Parecia uma coreografia e eu vi o vídeo e aquela merda está do caralho, mas aconteceu naquele momento e não tínhamos pensado em nada. É só consciência.

Conan Osíris: Tonicha, o analgésico e a felicidade porque “finalmente as pessoas estão a entender-me um bocadinho”

Mais uma das coisas que eu admiro imenso no Tiago é a capacidade que ele tem de ao mesmo tempo ter a consciência no mais alto que eu alguma vez vi alguém ter e depois tem os dois pés enterrados na terra e sabe manter a naturalidade das coisas. Não há deslumbramento e não mete o pé fora da realidade, podes estar fora mas com conta peso e medida. Nós agora temos uma equipa maior, porque precisamos e é útil, mas o nosso processo mantém-se e vamos ser sempre as mesmas pessoas, é o que nós queremos fazer e o que ele definiu enquanto génio desta máquina e aquilo que definimos em conjunto enquanto espetáculo que se apresenta às pessoas.

Desde que percebi que isto ia acontecer não estou a conseguir pensar em nada. A vitória marcou uma viragem para uma direção que eu ainda nem percebi bem qual é, mas foi super bonito e emocionante. Foi tudo estranho, psicologicamente e até fisicamente.”

“Ele é capaz de ser o único músico que eu conheço que não fala de música”

Rita Moreira, amiga de infância de Conan (e irmã do bailarino, João Reis Moreira)

“Sou quase como irmã do Tiago, conhecemo-nos com 15 anos. Fomos colegas de turma desde o 9.º até ao 12.º ano, na escola Gama Barros, no Cacém, e ficámos melhores amigos desde então. Tenho histórias engraçadas, mas são tão non-sense… E também já está tudo a ficar um bocadinho desmistificado. Uma coisa fixe é que ele no secundário ouvia Sigur Rós, em certas alturas da vida dele. Ele tanto ouvia Sean Paul como ouvia Sigur Rós – dependia um bocado do mood em que ele estava na altura. E ele fez uma cena fixe, que foi virar os álbuns de Sigur Rós ao contrário (ouvir de trás para a frente), porque é como se desse um álbum novo, mas bué interessante na mesma, bué bonito. Então ele fez aquilo para ter mais música, porque a música fica diferente. Pensou assim: ‘Olha, tenho este álbum de Sigur Rós para ouvir, e tenho mais este, que é tipo o mesmo, mas invertido’ e assim tinha mais música para ouvir.

"Ele é basic, tanto curte um churrasco normal, como curte uma cena bué gourmet. O Tiago não gosta de uma coisa específica, ele gosta mesmo é de comida, no geral"
Rita Moreira

Por acaso, ele é capaz de ser o único músico que eu conheço que não fala de música. Os músicos estão sempre a falar de música, e sobre outros artistas e álbuns, sobre como fazer música… Mas a cena de ele ter crescido como músico sozinho, não se ter dado muito com outros músicos (a não ser se calhar o pessoal da label dele, mas mesmo assim não passava o dia-a-dia com eles)… Ele é um músico um bocado estranho, um bocado à parte, parece que só faz mesmo por ele.

Rita Moreira com o Conan, na sex-shop. Foto de Ana Amaro

O que entusiasma? Comida entusiasma-o bué. Ele é basic, tanto curte um churrasco normal, como curte uma cena bué gourmet. O Tiago não gosta de uma coisa específica, ele gosta mesmo é de comida, no geral. Por isso, uma conversa bué prazerosa para ele é essa… Se ele não tiver fome. Se tiver fome, ele zanga-se (risos).

Andámos os dois na mesma turma, mais o Ruben Osório. Nós somos tipo os três maninhos, desde aí não nos separámos. Durante a escola estávamos sempre juntos, entretanto na faculdade eles foram os dois para Castelo Branco, e eu para a Covilhã, mas também como era perto, passávamos bue fins-de-semana juntos. Considero-o como um irmão porque já não é uma questão de… É mesmo família, não é um amigo que eu possa escolher. É para a vida, é uma coisa que já está demasiado consolidada.”

“Apercebi-me de que o Tiago já estava a dar o salto quando fui às Finanças: a funcionária gostava da música”

Raquel Bravo, ex-colega na sex shop e road manager de Conan Osíris

“O Tiago já disse publicamente que trabalhava numa sex shop e, no dia em que ele foi à entrevista de emprego, eu já trabalhava lá há mais tempo e estava no escritório e apercebi-me de que morávamos ambos nos Olivais e foi nesse dia que o conheci. Mais tarde comecei a ouvir a música dele, na página do Soundcloud, onde ele tem os álbuns anteriores. Não tenho bem a certeza do ano, mas eventualmente entre 2009 e 2010, e foi assim que comecei a ouvir a música dele, com a qual criei uma conexão grande, porque também gosto muito de dançar. A música que ele faz é para ele gostar, para dançar, porque ele também dança muito bem, mas a música dele leva-nos para uma coisa que vem de dentro: ou se gosta ou ao início é muito estranho.

Em conversas dizia-lhe que ele devia estar noutra cidade, por exemplo em Berlim, porque aqui não tinha capacidade para crescer. Aquelas visões que temos como jovens, que já foi há algum tempo… Entretanto, tirei um curso na Restart onde conheci o Luís Viegas, que é agora o agente do Tiago e fiz algumas festas minhas, coisas pequenas e convidei o Tiago para vir passar música. Ele disse-me sempre que não era DJ mas lá participou numa delas, com uma produção dele, que criou propositadamente. Depois estive fora uns meses numa viagem e quando regressei estava a trabalhar num evento de uma Passagem de Ano e ouvi uma música do Tiago e achei estranho. De repente estava num evento com n pessoas e fiquei com aquela sensação: ‘isto está a tornar-se mais público do que o grupo que conhece o Tiago e que o segue nas páginas onde ele divulga a música.’

Eu estava novamente a pensar produzir uma outra festa minha, em Março [de 2018], que coincidiu logo a seguir ao concerto na Galeria Zé dos Bois. Eu não tinha noção das repercussões que isto poderia tomar e queria divulgar a festa e com o hype que o álbum dele estava a ter queria divulgar ainda mais o trabalho do Tiago. Como ele já tinha ido ao Canal Q, eu perguntei-lhe se queria ir ao 5 Para a Meia Noite, se surgisse a oportunidade. Mandei mensagem à Filomena [Cautela], que conhecia, e perguntei-lhe se era possível e foi basicamente o primeiro concerto do Tiago ao vivo, num programa de televisão em direto, e percebi que isto podia ganhar outra dimensão e que era preciso começar a formar uma equipa. Pensei: ‘tenho que te apresentar às únicas pessoas que conheço e confio, com um trabalho excelente’, e falei com o Luís [o agente de Conan Osiris], que é o que faço sempre quando vejo algum artista que se diferencie.

"Ele é um génio que se tiver material ao dispor, ele cria. É impressionante, mas é verdade."
Raquel Bravo

Entretanto, passou um ano e todo o mérito é do Tiago. Somos uma equipa, estamos sempre ao lado dele e as coisas foram-se construindo. Eu nunca tinha sido road manager, estou a aprender bastante, mas tudo se construiu passo a passo. Nunca se planeou nada, fomos fazendo, de concerto para concerto, gradualmente. A naturalidade com que o Tiago coloca as questões e a simplicidade com que vê as coisas faz-nos voltar à terra. Nós estamos tão formatados para ver as coisas de uma maneira que depois já não conseguimos ver outras. Mas não há maneira? É preciso isso tudo? Mas isso é tão simples? E isso é bom e faz com que de alguma forma o trabalho seja mais orgânico, é mais simples…

O Tiago faz tudo sozinho. A única vez que ele teve num estúdio grande foi no Brasil, numa residência artística e ele parecia um bebé que sabia mexer em tudo mas não sabia os nomes técnicos. Ele é um génio que se tiver material ao dispor, ele cria. É impressionante, mas é verdade. Para tocar ao vivo tivemos que fazer ligeiras mexidas mas foi sempre com ele a dizer como queria e como não queria.

Quando me apercebi de que a música do Tiago já estava a dar o salto, em termos mediáticos, foi quando há pouco tempo fui às Finanças e a senhora que lá trabalhava gostava da música dele. Eu acho que são sempre aquelas pessoas que estão muito chateadas e nos deixam ansiosos e de repente estava a ouvir uma versão da Telemóveis e quando a senhora sorri e expressa uma emoção positiva eu fiquei: ‘há pólos diferentes a gostar da música dele’. A música do Tiago chega das pessoas mais novas até aos mais velhos. A minha mãe gosta da música dele e durante todos os concertos que já fizemos, em que pude olhar para o público, analisar, perceber as reações vi: ‘o Tiago não tem um público-alvo, é um bocadinho toda a gente e isso torna-o especial’.

Conan Osíris escreve, produz e mistura as suas próprias músicas

PEDRO PINA

Eu sei que a melodia é um bocadinho difícil. Não é o que estamos habituados a ouvir e custa um bocado, mas quando se pára e se ouve, se as pessoas estiverem abertas a isso, conseguem entender a mensagem que ele quer passar. Perceber o que está ali. Eu ainda estou a assimilar o que aconteceu ontem [final do Festival da Canção, onde público e júri deram a vitória a Conan Osíris]. Estamos no Algarve há muito tempo e a televisão é um aquário, parece que estamos ali dentro e ainda não tive oportunidade de falar com amigos e família, só agora é que o vou começar a fazer. Ainda não tive o choque com a realidade, parece que tivemos só numa certa dimensão. Agora vamos a Berlim, vai ser o primeiro concerto num país que não fala português e vamos ver a reação do público, que certamente será diferente. Não devem ter visto o Festival da Canção, digo eu…

Este caminho que fizemos até agora: desde o dia em que apresentei o Tiago ao Luís [o agente] e só passou um ano e tudo o que fizemos tem sido tão bom e tão tranquilo que eu acho que vou adotar essa postura e vamos passo a passo e com consciência do que estamos a fazer. Perceber como construir e ir fazendo sem nos precipitarmos sem estarmos a pensar o que vamos fazer se qualquer coisa. Vai tudo acontecendo e isso tem sido uma aprendizagem: as coisas têm um espaço e um tempo certo e não vale a pena estarmos a precipitar-nos. As coisas ganham forma e dimensão que é o que se está a ver: uma ascensão super natural. O Tiago nunca disse ‘votem em mim’ e isso diz muito sobre a personalidade, mas também sobre a carreira dele.”

“A primeira coisa em que pensámos quando ouvimos a música dele foi ‘O que é isto?’”

Luís Viegas, o agente de Conan Osíris

“Conhecemo-nos através da Raquel, a road manager dele, que já tinha uma relação próxima connosco. Já tínhamos estado, eu enquanto formador, ela enquanto aluna, na mesma escola. Ela, entretanto, também já tinha tido uma colaboração pontual com a Sul do Mundo [a agência de Conan]. Há um dia em que a Raquel nos contacta a dizer que queria estar connosco, que tinha um amigo e colega de loja, a sex shop, e que nos queria apresentá-lo para saber se nós nos interessaríamos em trabalhar com ele – disse que via ali um artista diferente e com uma linguagem revolucionária em montes de aspetos. E assim foi. Nós ouvimos e ao início também não estávamos preparados, portanto a primeira coisa em que pensámos foi ‘O que é isto? O que é que se passa aqui?’.

Tiago Miranda tem atualmente 30 anos

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Nós já trabalhamos com música há algum tempo e trabalhamos com mais artistas, mas a música do Conan causou-nos, de facto, impacto. Mais tarde, fizemos um almoço com o Tiago já presente e começámos a dar os primeiros passos juntos. De lá para cá, temos tentado o mais possível ajudar a transformar e a canalizar aquilo que ele faz para os melhores palcos e para ter uma difusão e uma divulgação quer ao vivo, quer na parte do digital – em que também o ajudámos, juntamente com a Sony Music, que faz a distribuição, ao divulgar a música dele e o repertório que ele tem editado. E tem sido uma viagem.

"Se me perguntassem há um ano, eu não adivinhava. E continuo a não adivinhar o que é que se vai passar daqui a um ano"
Luís Viegas

Nos palcos por onde tem passado, o Tiago tem conseguido fazer a sua coisa, tem sido muito bem acolhido pelo público, tem feito, na esmagadora maioria dos casos, salas cheias, esgotadas mesmo. Portanto este caminho que agora aqui chega… Se me perguntassem há um ano, eu não adivinhava. E continuo a não adivinhar o que é que se vai passar daqui a um ano. Entretanto, já falámos depois da vitória. Temos a noção de que há desafios, de que lhe vai exigir uma disponibilidade e uma disciplina, se calhar principalmente até da minha parte e da parte de todos, e uma grande coordenação”.

“O vídeo da atuação dele é o mais visto de sempre no Canal Q”

Joana Barrios, a pessoa que o fez estrear-se na televisão

“Eu já tinha ouvido a música dele em desfiles. Lembro-me de que o ouvia naquelas plataformas de streaming, no Soundcloud. Quando lançou o Adoro Bolos já tinha uma série de coisas para trás, umas coisas mais ou menos tipo mixes. Ouvi-o num ModaLisboa e aquilo ficou-me na mente. Depois uma amiga, a Sara Martins, quando saiu o Adoro Bolos, enviou-me o link [do disco] e lembro-me de pensar ‘Ah! ok! Outra vez este rapaz!’

Eu pus aquilo no Instagram, uns clips nas stories e comecei a segui-lo. Eu e o André Teodósio [ator e encenador, colega de Joana no Teatro Praga], quando fazíamos o Super Swing [programa do Canal Q], estávamos sempre à procura de pessoas fixes para cantarem nos nossos programas. Tínhamos meios muito reduzidos, o Canal Q não tinha um estúdio de música profissional e levar um músico era algo que causava muitos nervos. Do ponto de vista técnico e de produção não podíamos proporcionar umas condições incríveis para as pessoas se apresentarem. Mesmo assim mandei o disco ao André — ele até estava de férias nas Caraíbas — e disse-lhe ‘Temos de levar este rapaz ao nosso Super Swing, agora quando voltarmos.’

[Veja no vídeo a estreia de Conan Osíris na televisão]

Passado um tempo ele respondeu logo a dizer ‘Ok, incrível, contacta-o já!’ Eu enviei-lhe uma mensagem por Instagram, ele acabou por me dar o número de telefone e começámos a trocar mensagens normais. Fiz-lhe um namoro tal que o consegui convencer de que vir ao nosso programa seria uma coisa boa. Ele não estava muito recetivo, tinha acabado de lançar o disco, nunca tinha ido à televisão, nunca tinha feito nada dessas coisas… Eu e o André acabámos por conseguimos criar ali uma teia qualquer para ele se sentir à vontade e ele acabou por aceitar. Só me perguntou se podia levar a crew dele: um bailarino, o João, e um stylist, que é o Rúben. Eu disse-lhe que podia levar quem quisesse, aquilo era como estar em casa, muito simples.

Conan Osíris na primeira atuação na televisão Créditos: Foto cedida por Joana Barrios

Nesse programa tínhamos como convidada a Ana Bola e ele, que era mega fã dela, ficou super starstruck a pensar ‘Wow, que fixe. Venho à televisão e está lá a Ana Bola!’ Ele achava que eu e o André éramos super-ricos, super-estrelas, super-tudo. Quando saímos do canal disse-nos: ‘Agora vocês vão apanhar os vossos carros e vão para casa.’ Nós dissemos-lhe que não, que íamos de metro tal como ele [risos]. E foi assim. Ele foi, cantou ao vivo e toda a gente ficou muito impressionada porque ninguém o conhecia nem sabia quem ele era. Isto foi gravado a 2 de fevereiro de 2018 e foi passado a 13 do mesmo mês. Há um ano.

" Fiquei muito surpreendida quando o vi mas acho que a música é muito gira e pode realmente fazer uma diferença no contexto do Festival"
Joana Barrios

Ele estava nervoso, era a primeira vez que fazia aquilo e ia ficar gravado para a posteridade. O vídeo da atuação dele é um dos mais vistos de sempre no Canal Q, tem 1.2702 visualizações no YouTube! No outro dia tinha só quase um milhão…

Não fazia a mais pequena ideia de que ir ao Festival da Canção fosse um dos sonhos dele, não sabia mesmo. Fiquei muito surpreendida quando o vi mas acho que a música é muito gira e pode realmente fazer uma diferença no contexto do Festival. Ele tem essa coisa de não conseguirmos definir uma única influência, não tem um género. Isso é algo que eu adoro na música dele.

No caso dele, é tudo muito fora, há muitas coisas juntas. Até aquela parte mais ligada aos videojogos que é super de nicho e longe do domínio comum. Tão depressa se ouvem coisas que parecem samples da Britney Spears como algo de música libanesa… São muitas coisas e todas misturadas. Ele na altura dizia-me a mim e ao André que isso tinha a ver com o facto de ter crescido onde cresceu, nascido onde nasceu e disso tudo fazer parte da vida dele. Acho isso muito fixe, especialmente quando é traduzido para a música. “

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