790kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

i

Mario Tama/Getty Images)

Mario Tama/Getty Images)

Super Tuesday. Na terça-feira mais importante da vida do Partido Democrata, as contas estão longe de estarem feitas

Chegou a Super Tuesday, dia do "vai ou racha" para os democratas que querem derrotar Trump. Disputam mais de mil delegados em 14 estados. Sanders lidera, mas Biden e Bloomberg ainda podem mudar tudo.

Ou vai ou racha.

Em bom português, esta pode ser a maneira de resumir o espírito da muito americana Super Tuesday. Não é por acaso que se dá o epíteto de “super” a esta “terça-feira”: é nesta data que, por tradição, o maior número de estados votam nas eleições primárias que antecedem as presidenciais.

Os números falam por si: são 14 estados que vão a votos, levando a jogo 1.1357 delegados para a convenção do Partido Democrata em julho, onde será oficialmente nomeado o candidato a quem caberá disputar as presidenciais contra Donald Trump. Nesta Super Tuesday em concreto será decidido o destino de mais de um terço do total de delegados, o que pode marcar de forma decisiva a escolha do Partido Democrata para as eleições de 3 de novembro.

Nesta altura, ter uma uma boa prestação no maior evento eleitoral antes das presidenciais é o melhor dos combustíveis para uma campanha conseguir angariar mais fundos, motivar mais voluntários a dedicarem tempo e trabalho em ações locais e, se tudo correr bem, alargar a base eleitoral. Ter uma má prestação é o inverso de tudo isto: é a prova dada de que simplesmente não se tem caminho aberto para a Casa Branca.

É, por isto tudo, um dia enorme na política norte-americana — e pelo qual os políticos mais bem colocados anseiam fervorosamente e os menos favorecidos temem mais do que tudo. Neste último caso, não é pois de estranhar que tenham desistido à beira da Super Tuesday deste ano três candidatos das primárias democratas: Pete Buttigieg, que chegou a vencer no Iowa, mas não somou qualquer triunfo desde então; a senadora Amy Klobuchar, sem vislumbre de vitória nem no próprio estado; e o bilionário Tom Steyer, que depois de subir ao pódio na Carolina do Sul achou melhor desistir.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Restam agora quatro principais nomes nesta campanha: o senador Bernie Sanders, a senadora Elizabeth Warren, o ex-vice-Presidente Joe Biden e o ex-mayor de Nova Iorque Michael Bloomberg.

Nas próximas linhas, traçamos o percurso de cada um na atual campanha — e o que a Super Tuesday poderá dar e tirar a cada um deles.

Bernie Sanders, o Tea Party da esquerda

(ASTRID RIECKEN/EPA)

Ninguém chega à Super Tuesday tão bem colocado quanto Bernie Sanders. Com 58 delegados e vitórias em dois dos primeiros quatro estados que foram a votos (sendo que, no primeiro, Iowa, ficou muito perto do primeiro lugar, ocupado pelo entretanto desistente Pete Buttigieg; e no Nevada conseguiu ficou em primeiro com mais do dobro dos votos do segundo, Joe Biden), nunca alguém com as ideias de Bernie Sanders tinha chegado a esta posição de destaque nesta fase da corrida.

Ele próprio que o diga: em 2016, quando concorria contra Hillary Clinton, foi amplamente derrotado pela sua adversária nos estados do Super Tuesday. Agora, com as sondagens a sorrirem-lhe em estados de grande dimensão, como a Califórnia ou o Massachusetts, é quem está em melhor posição de conseguir mais delegados na Super Tuesday nas eleições primárias de 2020.

Impera a pergunta: o que mudou de 2016 para 2020?

Bernie Sanders não foi, de certeza. “Ele não só não mudou a mensagem que tinha há quatro anos, como também não mudou de mensagem nos últimos 40 anos”, atira, entre alguns risos, o estratega democrata Ed Kilgore, numa entrevista ao Observador. “Mas é precisamente isto que leva a que algumas pessoas, cada vez mais, gostem dele”, acrescenta.

E se os EUA tivessem um presidente socialista?

Tal como há quatro anos (ou antes), Bernie Sanders encabeça aquilo a que já se pode chamar de movimento a favor do “socialismo democrático” (como ele próprio diz), defendendo medidas como um sistema nacional de saúde pago através de impostos (o que implicaria a abolição do atual sistema, altamente dependente de seguros privados) ou o fim das propinas no ensino superior, que, de acordo com os números mais recentes, variam entre uma média de 23.091 mil dólares anuais no público (20.712 euros) e 40.925 mil dólares por ano no privado (36.709 euros). Estas medidas, especialmente a referente às propinas, garantem-lhe o apoio do eleitorado mais jovem.

“Ele não só mudou a mensagem que tinha há quatro anos, como também não mudou de mensagem nos últimos 40 anos. Mas é precisamente isto que leva a que algumas pessoas, cada vez mais, gostem dele."
Ed Kilgore, estratega do Partido Democrata

Geoffrey Kabaservice, diretor de estudos políticos do think tank Niskanen Center, aponta que aquilo que mudou nos últimos quatro anos foi, em vez de Bernie Sanders, a “base do Partido Democrata”, que “atualmente está muito mais à esquerda”.

Para este investigador, que é também autor do livro “Rule and Ruin: The Downfall of Moderation and the Destruction of the Republican Party, From Eisenhower to the Tea Party”, onde traça o percurso do Partido Republicano de um conservadorismo moderado para aquilo que ficou conhecido como o movimento do Tea Party, é agora a vez de o Partido Democrata demonstrar uma trajetória semelhante.

“Sanders é o Tea Party da esquerda, há muitas características entre os dois”, diz. “A ideia de que o establishment do partido é corrupto e quer deter qualquer vitória aos mais puros, a rigidez ideológica ou a certeza de que será sempre melhor arrasar os adversários internos e externos do partido em vez de chegar a um acordo com eles são tudo características que o Tea Party e Sanders partilham.”

Volvidos quatro anos, Bernie Sanders tem demonstrado melhores números junto do eleitorado latino (o que lhe garantiu uma vitória expressiva no Nevada, com 40,5% dos votos, mais do que o dobro dos 18,9% do segundo, Joe Biden), mas ainda não conseguiu subir significativamente nas escolhas dos afro-americanos.

"Se Sanders for o nomeado do Partido Democrata, pode apostar que o Partido Republicano vai canalizar mil milhões de dólares para retratá-lo como um traidor e um comunista."
Geoffrey Kabaservice, diretor de estudos políticos do think-tank Niskanen Center

Em 2016, na Super Tuesday, Bernie Sanders perdeu para Hillary Clinton em todos os estados com uma fatia considerável de eleitores afro-americanos. Desta vez, as contas não serão tão difíceis para o senador, muito em parte porque ainda há vários nomes na corrida. Mas os resultados na Carolina do Sul (Sanders ficou em segundo lugar, com 19,9%, muito atrás dos 48,4% de Joe Biden), onde 60% do eleitorado nas primárias democratas é afro-americano, demonstram que o senador do Vermont ainda tem muito terreno para conquistar junto daquele segmento essencial para vingar no Partido Democrata e onde, por agora, perde sistematicamente para Joe Biden.

Geoffrey Kabaservice prevê ainda um caminho mais difícil para Bernie Sanders caso, num futuro próximo, as eleições primárias comecem a cair ainda mais para o lado do senador do Vermont.

“As pessoas tendem a esquecer que, apesar de Sanders aparecer bem colocado nas sondagens contra Trump, as investigações feitas pela oposição contra ele nunca foram publicadas. Em 2016, Hillary Clinton não quis tocar muito nisso, mas, se Sanders for o nomeado do Partido Democrata, pode apostar que o Partido Republicano vai canalizar mil milhões de dólares para retratá-lo como um traidor e um comunista”, diz aquele investigador.

Para sustentar a sua ideia, Geoffrey Kabaservice conta que ele próprio viu a versão impressa de toda a pesquisa que as equipas do Partido Republicano fizeram com os “podres” de Bernie Sanders. Na Newsweek, um jornalista que teve acesso a esses ficheiros disse que a grossura desses dossiers quase chegava aos dois pés de altura — ou seja, 61 centímetros.

Entre aqueles documentos, escreveu o jornalista Kurt Eichenwald, estarão vários relatos negativos de Bernie Sanders. Exemplo: o conto alegadamente escrito por Bernie Sanders aos 31 anos, onde descreve como uma mulher gostou de ser violada por três homens; o passado de desemprego do senador do Vermont até a meados dos seus 30 anos, tendo chegado a fazer uma puxada de eletricidade do vizinho; a lei que Bernie Sanders aprovou, segundo a qual o lixo nuclear do seu estado seria enviado para uma zona pobre, maioritariamente hispânica, no Texas; detalhes sobre a sua lua-de-mel em Moscovo, ainda no tempo da União Soviética; tal como de uma visita à Nicarágua, da qual haverá um vídeo que mostra Bernie Sanders num comício de Daniel Ortega onde se gritava pela morte dos “ianques”.

“A informação que o Partido Republicano tem de Bernie Sanders é para lá de enorme, não tem comparação absolutamente nenhuma com a de Hillary Clinton”, diz Geoffrey Kabaservice. “Pode muito bem vir a ser isso que o vai destruir.”

“Terá de haver uma altura em que ele vai ter de falar menos de uma revolução política e de insurgência para começar a concentrar-se em como pode derrotar Donald Trump.”
Ed Kilgore, estratega do Partido Democrata

Também Ed Kilgore aponta o percurso e o discurso de Bernie Sanders como as suas maiores fragilidades a médio prazo. “Terá de haver uma altura em que ele vai ter de falar menos de uma revolução política e de insurgência para começar a concentrar-se em como pode derrotar Donald Trump”, diz aquele estratega. “As pessoas à volta de Sanders têm de ser muito racionais, encontrar em verdadeiros caminhos para uma maioria e deixar de beber o seu próprio kool-aid.”

Elizabeth Warren. “Eu tenho um plano”

(Chip Somodevilla/Getty Images)

Elizabeth Warren, que chegou a ser dada como favorita nas primárias do Partido Democrata, tem centrado a sua campanha num slogan: “Eu tenho um plano”. Porém, houve algo que lhe parece ter falhado nas contas: como conseguir votos.

A senadora do Massachusetts entrou nas primárias democratas com o objetivo de encabeçar a ala progressista do partido (onde Bernie Sanders colhe a maior parte dos votos) e fazer frente aos moderados, como Joe Biden e Michael Bloomberg.

Nos últimos dois debates, no Nevada e na Carolina do Sul, foi especialmente dura com o ex-mayor de Nova Iorque, acusando-o de sexismo e de querer comprar as eleições — arrancando com isso boa imprensa entre os meios mais liberais e uma avalanche de reações positivas nas redes sociais. Na Wikipedia, houve até quem tivesse editado a página de Michael Bloomberg, dizendo que ele já não era vivo e que a causa da morte era a “Senadora Elizabeth Warren”.

Apesar de tudo isto, Warren não tem descolado em nenhuma ida às urnas. No Iowa ficou em terceiro lugar. No New Hampshire e no Nevada desceu para quarto. E na Carolina do Sul foi empurrada para quinto lugar. Agora, nos 14 estados da Super Tuesday, é muito improvável que consiga passar o limiar de 15% necessários para conseguir delegados. Nem no seu próprio estado, o Massachusetts, as sondagens a colocam em primeiro — surge em segundo, atrás de Bernie Sanders.

O que tem falhado a Elizabeth Warren?

Para Ed Kilgore, trata-se de algo que a candidata não controla: “É o género dela”.

“Não é que os eleitores sejam sexistas, mas eles acham que os eleitores nos swing states são sexistas. Entre todas as razões que levaram à derrota de Hillary Clinton, muitos eleitores democratas acreditam que o género dela é uma das principais razões. E por isso os democratas têm muito medo de nomear uma mulher.”
Ed Kilgore, estratega do Partido Democrata

“Esse é o maior problema dela, estou mesmo convencido disso”, diz, para depois explicar que se trata de uma questão de elegibilidade e do trauma democrata de 2016, em que a primeira mulher candidata à presidência, Hillary Clinton, foi inesperadamente derrotada por Donald Trump. “Não é que os eleitores sejam sexistas, mas eles acham que os eleitores nos swing states são sexistas. Entre todas as razões que levaram à derrota de Hillary Clinton, muitos eleitores democratas acreditam que o género dela é uma das principais razões. E, por isso, os democratas têm muito medo de nomear uma mulher.”

Geoffrey Kabaservice aponta-lhe também alguma inconsistência ideológica. “Ao início, Warren tentou vender-se como uma espécie de Bernie Sanders mais inteligente e com um plano melhor. E agora já está a tentar passar a ideia de que ela pode ser uma espécie de ponte entre a ala moderada e os progressistas do Partido Democrata”, aponta. “Estes vai-vem não a têm ajudado em nada.”

Joe Biden

(JUSTIN LANE/EPA)

Joe Biden tem feito o jogo da paciência — e foi mesmo isso que pediu aos seus apoiantes quando, no início destas eleições primárias, tudo lhe parecia correr mal.

Primeiro foi o Iowa, onde Joe Biden ficou em quarto lugar, com apenas 13,7%. Depois foi o New Hampshire, que correu ainda pior ao ex-vice-Presidente: quinto lugar, com apenas 8,4%. Foi aí que Joe Biden fez um pedido, já com algum desespero, à sua base de apoiantes: “Quero que pensem todos no seguinte número: 99,9%. É essa a percentagem de eleitores afro-americanos que ainda não tiveram a oportunidade de votar na América”.

O tempo veio a dar-lhe razão. Depois do Iowa e do New Hampshire, dois estados onde o eleitorado branco está acima dos 90%, veio o Nevada. Ali, onde o eleitorado é mais diverso, Joe Biden conseguiu ficar em segundo lugar (com 18,9%, atrás dos 40,5% de Bernie Sanders) muito graças a ter conseguido 39% dos votos dos afro-americanos daquele estado. E, depois, a Carolina do Sul veio dar razão aos seus pedidos de paciência: naquele estado onde 60% do eleitorado das primárias democratas é afro-americano, o ex-vice-Presidente conseguiu a maior vitória desta corrida. Conquistou o primeiro lugar com 48,4% dos votos, muito graças a ter conseguido 61% das preferências do eleitorado negro daquele estado.

Nesta Super Tuesday, é precisamente nos estados com maior percentagem de eleitorado afro-americano que Joe Biden espera vencer. Na véspera das eleições, a média das sondagens publicada pelo site FiveThirtyEight (que podem até pecar por tímidas no caso de Joe Biden, já que a maioria foi feita antes da vitória na Carolina do Sul) colocam-no como favorito em estados como o gigante Texas e os mais pequenos, mas ainda assim importantes, Virgínia, Tennessee, Alabama, Oklahoma e Arkansas.

“Joe Biden não tem particularmente nada de entusiasmante por si só no que diz respeito a medidas e ideias. E ele próprio sabe disso. Porque a ideia dele mais ou menos assumida é a de continuar o legado de Obama.”
Geoffrey Kabaservice, diretor de estudos políticos do think-tank Niskanen Center

“O eleitorado afro-americano tem por norma expectativas relativamente baixas em relação a políticos brancos e, para eles, Joe Biden não é pior do que qualquer um dos outros”, começa por dizer o estratega Ed Kilgore. Mas, depois, vem o nome em que Joe Biden mais se ancora: Barack Obama. Apesar de o ex-Presidente ter estado cuidadosamente silencioso durante as primárias do Partido Democrata, o facto é que Joe Biden é de todos os candidatos a jogo o que tem um percurso mais ligado ao primeiro Presidente negro dos EUA, de quem foi vice durante oito anos.

“Joe Biden não tem particularmente nada de entusiasmante por si só, no que diz respeito a medidas e ideias”, aponta Geoffrey Kabaservice. “E ele próprio sabe disso. Porque a ideia dele mais ou menos assumida é a de continuar o legado de Obama.”

Nesta altura, depois do empurrão que recebeu no Nevada e sobretudo na Carolina do Sul, Joe Biden é o candidato da ala moderada mais bem colocado para fazer frente a Bernie Sanders — uma dinâmica reforçada pela desistência pré- Tuesday de Pete Buttigieg e que poder tornar-se ainda mais real caso Joe Biden consiga vingar nos seus maiores feudos e Michael Bloomberg fracasse, abrindo ainda mais espaço ao centro.

Porém, mesmo que tudo isto venha a confirmar-se, Joe Biden não deixará de ter um problema em mãos: ele próprio. É para aí que aponta Geoffrey Kabaservice, que aponta várias fragilidades a Joe Biden enquanto personalidade política.

“Os três principais candidatos são muito velhos e Joe Biden até é o mais novo entre eles, por uma questão de meses. Mas a ideia que passa é que Biden é muito mais velho”, diz o investigador do Niskanen Center. “Às vezes, dá a ideia de que o cérebro e a boca dele não comunicam entre si.”

Esta é uma alusão à longa lista de gaffes de Joe Biden durante a campanha, que geralmente têm origem nas vezes em que, em comícios, decide contar histórias sobre o seu passado político.

“Sou uma máquina de gaffes. Mas, meu Deus, é muito melhor isto quando comparado com um tipo que nem consegue dizer a verdade”, disse, em alusão a Donald Trump.
Joe Biden, ex-vice-Presidente e candidato à presidência dos EUA

A mais recente foi quando, em campanha na Carolina do Sul, recordou que, numa tentativa de visitar Nelson Mandela na África do Sul, na década de 1970, acabou por ser detido pelo regime do apartheid — história que teve de admitir mais tarde que era falsa, no que à detenção diz respeito. Antes desta, e apenas no que diz respeito às gaffes que surgiram durante a atual campanha, Joe Biden já se apresentou como “candidato a senador”, trocou cidades onde ocorreram tiroteios (falou em Houston em vez de El Paso, ambos no Texas; em vez de Dayton, no Ohio, falou vagamente no estado do Michigan), confundiu Theresa May com Margaret Thatcher, entre outras de uma lista considerável.

Não é, porém, nada que o próprio não tenha já reconhecido. “Sou uma máquina de gaffes, disse, assumindo a alcunha que lhe é atribuída há vários anos. “Mas, meu Deus, é muito melhor isto quando comparado com um tipo que nem consegue dizer a verdade”, disse, em alusão a Donald Trump.

Michael Bloomberg. 410 milhões para ganhar a Super Tuesday

(Drew Angerer/Getty Images)

O ex-mayor de Nova Iorque é o oitavo homem mais rico do mundo — e a campanha que tem levado a cabo é mesmo prova disso. Depois de um anúncio tardio de que também ele era candidato às primárias democratas (tão tardio que, quando o fez, tomou a decisão de simplesmente ignorar os quatro primeiros estados das primárias, onde o seu nome nem aparecia nos boletins), Michael Bloomberg decidiu apostar todas as fichas nos estados da Super Tuesday. Por “todas as fichas” entenda-se 410 milhões de dólares (equivalente a 368,5 milhões de euros) em anúncios maioritariamente televisivos, só nos 14 estados que vão a votos esta terça-feira.

É normal que 410 milhões de dólares, por si só, pareça um número sem particular significado, embora indiscutivelmente alto. Mas ele ganha outra dimensão quando visto à luz da análise da Advertising Analytics, citada pelo The New York Times: é uma quantia superior a todo o dinheiro gasto em anúncios de televisão por Hillary Clinton e Donald Trump somados, durante as eleições primárias e depois presidenciais. E isto é apenas o que Mike Bloomberg gastou em quatro meses. Ou seja: de onde aqueles 410 milhões de dólares vieram há muito mais.

Bloomberg gastou 410 milhões de dólares em anúncios nos estados da Super Tuesday — uma quantia sem precedentes. Num deles, mostra imagens de arquivo ao lado de Barack Obama. Agora, 26% das pessoas acreditam que o ex-Presidente o apoia, o que é falso.

Num desses desses anúncios, Bloomberg aparecia em várias fotografias lado a lado com Barack Obama. E mais: um vídeo e um clip de áudio de duas situações em que o ex-Presidente falava elogiosamente, mesmo que en passant, do agora candidato às primárias. O resultado de tudo isto viu-se numa sondagem da Morning Consult, onde uma maioria de 60% dos entrevistados disse achar, ao contrário do que é verdade, que Barack Obama tinha apoiado um candidato. E qual era o que aparecia à frente? Michael Bloomberg, pois, com 26% — 1% à frente até de Joe Biden, que foi vice de Barack Obama durante oito anos.

Ou seja, os anúncios até fazem qualquer coisa por Michael Bloomberg. Mas será que essa qualquer coisa lhe servirá de alguma coisa?

“O meu palpite é que não”, atira Geoffrey Kabasevice, diretor de estudos políticos do think-tank Niskanen Center. “Michael Bloomberg é um candidato com muitas fragilidades nos terrenos onde o Partido Democrata se situa atualmente.”

O que é preciso para chegar a Presidente? Para o bilionário Bloomberg, custe o que custar

Prova dessas fragilidades foram os temas que os seus adversários escolheram atirar contra ele nos dois debates em que participou. Elizabeth Warren chamou atenção para as histórias que acusam Michael Bloomberg de chamar “gajas gordas” e “lésbicas com cara de cavalo” a mulheres que trabalharam nas suas empresas; Bernie Sanders atacou-o por ter defendido a política de stop and frisk (“pára e revista”, tradução para a medida aplicada pela polícia de Nova Iorque durante os dois mandatos de Michael Bloomberg, que resultou numa percentagem desproporcional de intervenções policiais contra minorias étnicas, sobretudo afro-americanos) e argumentou que essa política afastou aquelas populações do Partido Democrata; e Pete Buttigieg acusou o bilionário de querer “comprar o partido”.

“Bloomberg não tem uma boa relação com o eleitorado afro-americano por causa do stop and frisk, não tem uma boa relação com o eleitorado feminino por causa das histórias de discriminação de género e não tem uma boa relação com o eleitorado progressista porque é bilionário. Ele é tudo aquilo que os progressistas odeiam.”
Geoffrey Kabaservice, diretor de estudos políticos do think-tank Niskanen Center

Para Geoffrey Kabaservice, são demasiadas fragilidades para Michael Bloomberg ter um caminho fácil, ou sequer viável, para vencer as primárias democratas. “Bloomberg não tem uma boa relação com o eleitorado afro-americano por causa do stop and frisk, não tem uma boa relação com o eleitorado feminino por causa das histórias de discriminação de género e não tem uma boa relação com o eleitorado progressista porque é bilionário”, resume. “Ele é tudo aquilo que os progressistas odeiam.”

A Super Tuesday de Michael Bloomberg poderá ser prejudicada ainda pelo facto de os sete estados do Sul que vão a votos este domingo terem uma média 15,8% de eleitores afro-americanos, acima dos 12,5% da média nacional; e 53,2% de eleitores brancos, significativamente abaixo dos 60,4% nacionais. Para compensar, Bloomberg pode ter ganhos significativos na Califórnia, o maior estado da Super Tuesday e um terreno onde investiu 78 milhões de dólares (70 milhões de euros) em anúncios.

Assine por 19,74€

Não é só para chegar ao fim deste artigo:

  • Leitura sem limites, em qualquer dispositivo
  • Menos publicidade
  • Desconto na Academia Observador
  • Desconto na revista best-of
  • Newsletter exclusiva
  • Conversas com jornalistas exclusivas
  • Oferta de artigos
  • Participação nos comentários

Apoie agora o jornalismo independente

Ver planos

Oferta limitada

Apoio ao cliente | Já é assinante? Faça logout e inicie sessão na conta com a qual tem uma assinatura

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.

Assine por 19,74€

Apoie o jornalismo independente

Assinar agora