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Há quem esteja disponível para dar centenas de dólares por um convite para entrar na Bluesky

NurPhoto via Getty Images

Há quem esteja disponível para dar centenas de dólares por um convite para entrar na Bluesky

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Um céu azul pelo pássaro azul? A Bluesky quer competir com o Twitter, mas ainda é "mais pequena do que muitas cidades"

Para entrar no céu azul é preciso convite. Descrita como descentralizada, a rede social Bluesky é apontada como alternativa ao Twitter. Porém, ainda só conta com 50 mil utilizadores.

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Do pássaro azul ao céu azul, o elo de ligação é Jack Dorsey. Quando ainda ocupava a posição de CEO, em 2019, anunciou que o Twitter iria financiar uma “pequena equipa independente de até cinco arquitetos, engenheiros e designers de código aberto” para “construir um padrão aberto e descentralizado” para as redes sociais. O objetivo era que a plataforma acabasse por integrar esse padrão.

Isso não se veio a concretizar. Se a Bluesky começou como um projeto dentro do Twitter, no início de 2022 estabeleceu-se como uma “empresa independente”. Quando o interesse de Elon Musk na compra dessa rede social foi tornado público, a plataforma do céu azul sentiu a necessidade de esclarecer que a Bluesky era “propriedade da própria equipa, sem qualquer participação detida pelo Twitter”.

Com 13 milhões de dólares angariados para garantir que conseguia ter a “liberdade e experiência” necessárias para começar a “pesquisa e o desenvolvimento” do padrão, a Bluesky contou com ajuda do passado para conseguir começar a levantar voo. Um antigo engenheiro de segurança do Twitter juntou-se à equipa da empresa, que contava já com a presença de Jack Dorsey na administração (um lugar que ainda hoje em dia ocupa).

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Apesar de o cofundador do Twitter apoiar a Bluesky, o seu poder é limitado e não “unilateral”. A garantia foi dada pela CEO Jay Graber, que esclareceu que é quem detém o “maior controlo” na “empreitada” de desenvolver uma plataforma que, nos últimos meses, tem chamado a atenção daqueles que não concordam com a administração de Musk.

Acho que vale a pena reiterar aqui que Jack [Dorsey] está no nosso board, mas não é o nosso dono, o Twitter não é o nosso dono”, salientou a líder da Bluesky numa sequência de tweets partilhada em abril do ano passado, três dias após a empresa ter esclarecido a sua ligação com a plataforma que Musk viria a comprar.

A Bluesky, descrita como descentralizada, de acesso gratuito e com um aspeto semelhante ao Twitter, encontra-se ainda em testes (a chamada fase beta). Atualmente, segundo estimativas da data.ai, conta com cerca de 50 mil utilizadores ativos, mas a aplicação já foi descarregada mais de 375 mil vezes. A discrepância entre o número de utilizadores e os downloads pode ser explicada pelo facto de todas as pessoas poderem descarregar a aplicação, mas nem todos têm conseguem entrar.

A “corrida” aos convites e a porta fechada para chefes de Estado

Neste céu só entra quem recebe convite. Quer seja após várias semanas na fila de espera (como acontece atualmente com o Observador, que aguarda há mais de 15 dias), quer seja porque um amigo que está na plataforma o enviou. Os utilizadores recebem um código a cada duas semanas para convidarem outros a juntar-se, os perfis com mais destaque têm acesso mais frequentemente. A CEO afirmou que este sistema de exclusividade visa impedir que contas de spam tenham acesso à Bluesky e garantir que a plataforma cresce “organicamente”.

A aguardar pela chegada de um convite encontram-se quase dois milhões de pessoas. Contudo, nem todos parecem estar dispostos a esperar. Há quem se mostre disponível para dar centenas de dólares para ter acesso a um código. Nos leilões concluídos no eBay existem códigos que foram vendidos por valores que rondam os 200 e os quase 400 dólares. A revista Fast Company escreve que a ‘loucura’ pelos convites leva a que existam preços ainda mais inflacionados, com um vendedor a pedir 999 dólares. A compra não é aconselhada, uma vez que podem estar a ser vendidos códigos falsos.

Bluesky, convites no eBay

Os convites que estão à venda no eBay

Para além das vendas no eBay, há vários meses que no Reddit surgiu uma página onde as pessoas podem colocar pedidos de códigos. Ao longo dos últimos dias, à medida que o interesse aumenta, ganhou vida e vários são os indivíduos que publicam mensagens a questionar se alguém tem convites para “dar”. Porém, não parecem existir muitas histórias de quem tenha conseguido beneficiar das ofertas de estranhos.

Personalidades como a congressista norte-americana Alexandria Ocasio-Cortez, o realizador James Gunn, o CEO da Ford, Jim Farley, e a modelo Chrissy Teigen têm conta na plataforma. O Presidente norte-americano, Joe Biden, e outros chefes de Estado poderão ter que esperar para ter acesso. A Bluesky explicou que, enquanto estiver na fase de testes, que começou no final de fevereiro, não conseguirá “acomodar” líderes. Além disso, numa nota oficial, citada pela revista Fortune, agradeceu o “entusiasmo de todos em enviar convites”, mas pediu que os indivíduos avisassem a equipa antes de convidarem figuras “proeminentes”.

Para Carolina Are, investigadora em administração de plataformas no Centro para os Cidadãos Digitais na Universidade de Northumbria (Reino Unido), a decisão de restringir o acesso de Presidentes e outros líderes à plataforma pode representar o fechar de uma porta que poderia servir para atrair mais utilizadores. “Se mantiverem uma plataforma mais pequena e se não permitirem políticos haverá menos dores de cabeça de moderação”, afirmou, ao Observador.

Por outro lado, a especialista que tem conta na Bluesky considerou que “se uma plataforma for muito grande, com muitas contas para seguir”, poderá correr o risco de perder o interesse dos utilizadores, se estes deixarem de ver os seus amigos e as pessoas que escolheram seguir em primeiro lugar. “Torna-se uma experiência bastante dispersa”, que, defendeu, é o que tem acontecido com o Instagram e o TikTok.

“Se mantiverem uma plataforma mais pequena e se não permitirem políticos haverá menos dores de cabeça de moderação."
Carolina Are, investigadora em administração de plataformas no Centro para os Cidadãos Digitais na Universidade de Northumbria

Afinal, como funciona a Bluesky?

Uma vez recebido o convite é possível começar a usar a aplicação. O primeiro passo é escolher o servidor com que quer aceder e o seguinte o nome de utilizador que pretende utilizar. Assim que forem concluídas essas duas etapas é necessário personalizar o seu perfil: colocar uma fotografia, uma imagem de capa e os seus dados biométricos. Na Bluesky, as publicações, que podem ter até 256 caracteres e incluir imagens, têm o nome de skeets e são apresentadas na skyline, que é o nome dado à timeline.

Tal como acontece no Twitter, no céu azul é possível responder, compartilhar e colocar gosto nos posts de outros utilizadores, bem como ativar as notificações e fazer pesquisa de determinadas palavras ou perfis. Apesar disso, escreveu a Forbes, atualmente a plataforma (que ficou disponível para iOS no final de fevereiro e para Android em abril) ainda não suporta vídeos, mensagens diretas ou hashtags. A rede social tem dois feeds distintos na página inicial, um que é cronológico e onde aparecem as publicações de pessoas que segue; e outro que é algorítmico, que se chama “What’s Hot” e onde são exibidos posts populares (parecido ao “For You” do Twitter).

A especialista Carolina Are, que recebeu o convite de uma amiga para se juntar à Bluesky, acredita que a plataforma é semelhante ao Twitter, embora ainda não tenha detetado “muito abuso”, nem “muito trolling“. Porém, confessou que isso pode ser porque não tem usado com frequência a plataforma, que, apesar de só recentemente ter começado a chamar mais a atenção, tem utilizadores “com um número imenso de seguidores”. “Adivinho que haverá imensos bots.”

Se visualmente as duas plataformas são parecidas, as semelhanças parecem ficar por aí. A equipa de nove pessoas da Bluesky é ativa na plataforma, mas não da mesma forma de Musk, que utiliza o Twitter para partilhar pensamentos e/ou conquistas da Tesla e da SpaceX. Kylie Robison, jornalista da revista Fortune que passou duas semanas na rede social e que dá conta da existência de um falso Papa Francisco por lá, explicou que os funcionários do céu azul respondem em minutos aos utilizadores que tenham dúvidas acerca da plataforma ou àqueles que encontrem qualquer bug.

Ao contrário do que acontece com o pássaro azul, a Bluesky é descentralizada e encontra-se a construir um “Authenticated Transfer Protocol (ATP), uma nova base para redes sociais que permite aos seus criadores ter independência das plataformas, aos programadores liberdade para construir e aos utilizadores escolha na sua experiência”. Os dados dos utilizadores são, desta forma, armazenados em servidores independentes em vez de servidores pertencentes à empresa, indicou a Forbes.

"Se não gostas da forma como mostramos as publicações ou moderamos a tua experiência podes trocar de servidores sem perderes amigos ou dados."
Jay Graber, CEO da Bluesky

A rede social pretende que diferentes servidores interajam através de um padrão aberto, apesar de cada um ter os seus próprios sistemas de moderação. O exemplo que o The Verge utiliza para explicar como é que isto funciona é o email: pode ter uma conta no Gmail e, mesmo assim, conseguir enviar mensagens a pessoas que têm apenas conta no Outlook.

Na Bluesky, os utilizadores podem criar os seus próprios servidores e alternar entre os que quiserem, sem perderem os seus dados. A indicação foi dada pela CEO Jay Graber numa nota partilhada no blog da empresa: “Se não gostas da forma como mostramos as publicações ou moderamos a tua experiência podes trocar de servidores sem perderes amigos ou dados; ou trocar o feed ou moderadores através de um ecossistema de plug-in“.

O problema com a nudez, que a Bluesky teve de resolver

Antigos utilizadores do Twitter, vozes da comunidade negra e as que representam a comunidade transgénero, bem como trabalhadores do sexo consideram que a plataforma é acolhedora. Principalmente por causa deste último grupo, escreveu o Engadget, as publicações ficaram estranhas, rapidamente. E os utilizadores começaram a queixar-se da nudez que lhes aparecida nos feeds, principalmente no “What’s Hot”.

Quando as críticas começaram a chegar, a Bluesky mudou a sua abordagem e começou a impedir que publicações que continham nudez fossem apresentadas nesse feed, que tem por base um algoritmo. A revista Wired denotou, porém, que por padrão, os utilizadores terão a opção de “mostrar nudez” ativada e, se não a alterarem, vão ver essas imagens na página que apresenta publicações dos perfis que seguem (se esses partilharem esse tipo de conteúdo).

Para Carolina Are, a decisão tomada pela Bluesky levanta questões, nomeadamente acerca das imagens que serão classificadas como nudes (uma fotografia em topless, por exemplo, conta?): “Eu acho que a escolha de moderar desta forma espelha a moderação de outras plataformas, mas, ao mesmo tempo, mostra como é que isto pode ser explorado ou tornar-se um problema controverso sobre o que é que conta como uma nude“.

Ao Observador, a investigadora em administração de plataformas no Centro para os Cidadãos Digitais na Universidade de Northumbria considerou que os criadores cujos posts não aparecerão na página “What’s Hot’ vão crescer menos na plataforma. Então, disse, esta é uma forma de “shadow banning” que atinge aqueles que “publicam este tipo de conteúdo desde o início”.

É estranho que tenham decidido remover esse conteúdo totalmente da página ‘What’s Hot’, sem outras opções”, como, por exemplo, colocar um botão que avise que uma publicação contém nudez e deixar ao critério dos utilizadores se a querem ou não ver.

Neste momento, a moderação de conteúdos na plataforma é ainda uma detalhes se conhecem. A equipa da Bluesky permite que os utilizadores personalizem o nível de moderação que desejam: desde “ocultar”, “avisar” ou “mostrar” conteúdos como discursos que incitem o ódio, spam ou publicações de pessoas a fazerem-se passar por outras.

"O que é sensível para uma pessoa pode não ser para outra."
Andrew Selepak, professor assistente na Universidade da Florida

Numa publicação feita no blog da rede social, a CEO Jay Graber indicou que o objetivo é que “qualquer pessoa” possa “criar rótulos de moderação” ou “assinar aqueles que foram criados por terceiros”. “Qualquer serviço ou pessoa na plataforma pode escolher como esses rótulos são usados para determinar a experiência final do utilizador”, detalhou.

A forma como a plataforma pretende fazer a moderação de conteúdo ainda não é “muito clara”, no entender de Andrew Selepak. O coordenador do programa de mestrado com Especialização em Redes Sociais e professor assistente do Departamento de Produção de Media, Gestão e Tecnologia na Universidade da Florida disse que, neste momento, são os utilizadores que decidem que tipo de publicações são permitidas ou não, o que levanta “um problema”: “O que é sensível para uma pessoa pode não ser para outra.”

Além disso, em declarações ao Observador, acrescentou que é necessário entender que a Bluesky não tem as infraestruturas que outras redes sociais maiores — como o Instagram, o Facebook e o Twitter — têm para fazer a moderação de conteúdos. Nem os mesmos recursos para ter trabalhadores que se dedicam exclusivamente a decidir o que é ou não permitido. No caso do céu azul, o processo é, atualmente, “simples”: são os utilizadores que olham para “o conteúdo e decidem se é algo que viola os termos de serviço, mas o que não está também claro é o que é ou não permitido nesses termos”.

Twitter Headquarters in San Francisco

Poderá ser demasiado cedo para perceber se a Bluesky será ser uma alternativa real ao Twitter

Anadolu Agency via Getty Images

Pode mesmo ser uma alternativa ao Twitter?

Sem os milhões de utilizadores que outras redes sociais têm e ainda não estando disponível para todos os cidadãos é demasiado cedo para perceber se a Bluesky poderá ser uma alternativa real ao Twitter. Ou se poderá, daqui a uns meses, entrar para o leque de plataformas que tiveram popularidade durante algum tempo, mas que depois acabaram por cair no esquecimento.

No cemitério das redes sociais há ainda quem tente ressuscitar

Andrew Selepak mostrou-se cauteloso quanto ao potencial de uma “plataforma que é mais pequena do que muitas cidades”, em termos de número de utilizadores (tem atualmente 50 mil), poder tornar-se numa rede social com influência “global” e capaz de substituir o Twitter. Desta forma, apontou que a diferença entre outras redes sociais que surgiram como possíveis alternativas ao pássaro azul — desde o Mastodon à Truth Social de Donald Trump — é que a Blusky foi “desenvolvida por uma mão cheia de engenheiros do Twitter” e tem “a participação de Jack Dorsey”. “Foi desenvolvida como o Twitter”, apontou o professor norte-americano.

Entre “toots” e “boosts”, pode o Mastodon ser mesmo uma alternativa europeia ao Twitter?

Por sua vez, no entender de Carolina Are também não é possível prever se a Bluesky vai ser uma alternativa ao Twitter, uma vez que é necessário “ver como é que evolui” e perceber se não comete o erro que “outras plataformas cometeram ao tornarem-se demasiado moderadas ou demasiado exclusivas”. Para a investigadora é “interessante que Dorsey esteja a apoiar esta rede social porque isso mostra que as pessoas ainda estão famintas por uma alternativa ao Twitter” e que “não estão felizes com a forma como Elon Musk administra o site”.

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