Uma imagem de uma peça televisiva, da SIC Notícias, serve a um utilizador do Facebook para colocar uma dúvida sobre a descida do preço dos combustíveis. Na publicação são deixadas várias questões, com o seu autor a sugerir que há uma relação entre uma campanha eleitoral e a redução destes preços..

“Gasóleo desce dois cêntimos por litro e gasolina 1,5”, consta no oráculo da peça televisiva, emitida a 17 de dezembro e que pode ser vista aqui, onde é dito que os preços estão a “diminuir desde outubro” e que esta já é a “oitava descida consecutiva”. Ainda assim, Portugal “é um dos países mais caros da Europa” no que toca a combustíveis, estando na “9ª posição quanto ao preço da gasolina e na 14ª no preço do gasóleo”, consta no mesmo trabalho da SIC Notícias. Sem citar o conteúdo da peça, este utilizador do Facebook questiona: “Afinal já não há guerra? Ou será por causa da campanha eleitoral? Continuem a votar neles…”

A formação do preço dos combustíveis é complexa e depende dos governos numa parte significativa, a dos impostos. Mas não só e, no caso atual, há outros fatores que provocaram este recuo que pode inverter-se em breve, segundo os dados mais recentes. No preço final pesa a cotação diária do petróleo, a taxa de câmbio (o produto é negociado em dólares), o custo do transporte, a descarga e armazenagem do petróleo bruto ou dos produtos derivados de petróleo, a incorporação de biocombustíveis e ainda os impostos.

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Portugal importa petróleo, logo, começa logo por estar dependente da cotação do barril que, por sua vez, é altamente influenciado pela instabilidade nos países produtores. Ora, um terço da produção mundial está concentrada no Médio Oriente, pelo que o conflito entre o Hamas e Israel, que surgiu em outubro, tem colocado pressão nesta matéria pelas possibilidade de afetar a capacidade de fornecimento daquela região. Bem como os ataques a navios comerciais que têm ocorrido no Mar Vermelho por parte dos rebeldes Houthis, a partir do Iémen. Estas questões não só criam pressão direta sobre o preço da matéria-prima, como também podem afetar a parte do transporte da mesma até ao país de destino.

Mar Vermelho. De olhos na situação no Iémen, os Houthis usam Gaza e perturbam o comércio mundial

A situação de instabilidade geopolítica, com a guerra na Ucrânia que começou em 2022, já tinha provocado um aumento dos preços dos combustíveis, com o preço do barril a disparar a partir de março desse ano. Afinal, a Rússia é o terceiro maior produtor mundial de petróleo, atrás de EUA e Arábia Saudita. A União Europeia, por exemplo, aprovou nessa altura um embargo ao petróleo vindo do país, como sanção pela invasão da Ucrânia, o que teve efeitos sobre os preços dos combustíveis praticados na Europa.

Grande parte da volatilidade a que os preços dos combustíveis estão sujeitos é, assim, provocada por fatores alheios à realidade nacional. No entanto, há uma parte de preço dos combustíveis que inclui impostos, o Imposto sobre Produtos Petrolíferos e o IVA, e essa é a única parte em que os governos podem ter influência direta.

Ainda em setembro, perante uma nova onda de subida dos preços, o Governo interveio e voltou a baixar o imposto petrolífero para atenuar a subida do preço dos combustíveis, em dois cêntimos no gasóleo e um cêntimo por litro na gasolina. A fórmula já tinha sido aplicada pelo Executivo de António Costa e passa por devolver, por via do ISP, os ganhos que resultam do aumento do IVA cobrado em marés de combustíveis com preços mais altos — como a dos últimos anos.

Governo volta a baixar imposto para contrariar subida dos combustíveis. Corta 2 cêntimos no gasóleo e 1 cêntimo na gasolina

O peso dos impostos no preço dos combustíveis em Portugal é elevado, sendo mesmo superior ao que existe em Espanha, por exemplo. A Entidade Nacional para o Sector Energético (ERSE) monitoriza esta parcela no seu site, que pode consultar aqui e onde é possível verificar que nas últimas semanas o ISP significou 38,51% do preço final e o IVA 18,73%.

A intervenção do Governo nesta parcela foi anterior à demissão do primeiro-ministro e à decisão de dissolução da Assembleia da República, por parte do Presidente. A crise política começou a 7 de novembro, ao passo que a medida do Governo surgiu no final de setembro. Mas mesmo essa medida provoca um efeito imediato e o preço dos combustíveis continuou a baixar depois disso, fruto de fatores externos e da própria desaceleração da economia internacional que afeta a procura. De qualquer forma, na altura em que o Governo caiu, os preços já estavam a baixar desde o final de outubro — estão neste momento a cair há oito semanas consecutivas.

A tendência pode vir a inverter-se em breve, tendo em conta que o preço do petróleo tem estado a subir nas duas últimas semanas, com o valor do barril a disparar. Um dado que não será alheio à situação no Mar Vermelho que está a afetar muito diretamente o transporte marítimo, o que tem influência sobre o preço final dos combustíveis.

Conclusão

O utilizador que escreveu esta publicação sugere que a baixa do preço dos combustíveis nas últimas semanas tem relação com o momento de campanha eleitoral. A campanha oficial ainda não começou, embora o país já viva o ambiente de pré-campanha próprio da antecipação das legislativas para 10 de março. Ainda assim, a ação do Executivo sobre os preços dos combustíveis é anterior à sua queda e à entrada num clima eleitoral. Os governos podem afetar diretamente o preço dos combustíveis, através de medidas fiscais, no entanto, esses preços estão sujeitos a vários outros fatores que estão fora do âmbito nacional.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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