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Portugal é, inegavelmente, um país de vocação turística. Só no ano passado, a atividade turística representou 15,8% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional — tornando-se num dos países do mundo em que o turismo tem maior peso na economia. E, em grande medida, Portugal é um dos países do mundo com maior capacidade para atrair turistas devido ao clima ameno, ao mar e à natureza propícia ao turismo balnear. |
Aliás, a estratégia turística do Governo português não esconde que o “clima e luz”, o “mar”, a “natureza” e a “água” são alguns dos ativos fundamentais que tornam Portugal um destino turístico, a que se juntam outros elementos como a “história, cultura e identidade”, a “gastronomia e vinhos” ou o “bem-estar”. Mas há um problema: são também elementos turísticos totalmente dependentes da realidade ambiental e climática. E, num clima em profunda mudança, tudo isto pode estar em risco. |
Num estudo recentemente publicado pelo Joint Research Centre da Comissão Europeia, um grupo de investigadores que inclui dois cientistas portugueses procurou justamente responder às perguntas centrais neste contexto: como é que as alterações climáticas afetam a procura turística na Europa? Como se mede a relação entre as condições do clima e a atratividade turística de um lugar? E como é que as mudanças climáticas se vão traduzir na procura turística no futuro? |
As conclusões do estudo, sobre as quais pode ler no artigo em destaque nesta newsletter, são claras: quanto mais expressivo for o aquecimento global, mais se vai acentuar uma deslocação da procura turística do sul para o norte da Europa. No cenário mais pessimista (um aumento de 4ºC até 2100 em relação ao período 1850-1900), o Algarve e o Alentejo contam-se entre as regiões europeias mais afetadas, devendo perder mais de 5% dos turistas que recebem anualmente, já que as condições do clima se deverão tornar demasiado desconfortáveis para a atividade turística. Em contrapartida, prevê-se um aumento significativo da procura turística nos países do norte da Europa, para onde se deverão deslocar os climas mais amenos. |
Por outro lado, também se prevê uma alteração significativa nos padrões de sazonalidade: os meses de julho e agosto tornar-se-ão provavelmente demasiado quentes para a prática do turismo, registando-se uma diminuição na procura nesses meses e um aumento em meses como abril e setembro. |
Tudo isto pode colocar em risco a sustentabilidade económica de regiões do mundo excessivamente dependentes do turismo ligado à praia, ao sol e ao mar. Num país como Portugal, em que o turismo tem um peso de 15,8% na economia, é mais um dos muitos impactos que as alterações climáticas terão nas próximas décadas. A solução para o problema, como disse ao Observador o geógrafo João Viljoen de Vasconcelos, que tem estudado a relação entre as alterações climáticas e o turismo em Portugal, passa por diversificar a oferta do turismo: os visitantes têm de querer vir a Portugal por outras razões além da praia. |
Finlândia prepara-se para enfrentar incêndios no futuro com a ajuda de Portugal |
Ainda assim, a movimentação da procura turística para latitudes mais elevadas, acompanhando a deslocação dos climas mais quentes, está longe de ser o principal efeito da subida das temperaturas a nível global. Os desastres naturais associados ao aquecimento global também poderão tornar-se mais frequentes em regiões do mundo em que, atualmente, são mais raros. |
Por exemplo, sabe qual é o país europeu com maior percentagem de território coberto de floresta? É a Finlândia, cujo território é 73,7% floresta, de acordo com dados do Banco Mundial. Mas, apesar de ser o país europeu com maior percentagem de floresta, ao longo da história, a Finlândia não tem enfrentado grandes problemas com incêndios florestais. |
Em 2021, porém, a Finlândia enfrentou um incêndio florestal de dimensões históricas, que foi notícia na imprensa internacional. Em julho daquele ano, perto de 300 hectares de floresta arderam numa área remota do país. Foi o segundo maior incêndio da história da Finlândia, superado apenas por um fogo, no mesmo local, 51 anos antes. Para comparação, segundo dados da Pordata, entre 1980 e 2022 arderam, em média, 115 mil hectares por ano em Portugal. Em 2017, o ano ainda marcado na memória coletiva dos portugueses pelos trágicos incêndios de junho e de outubro, arderam 540 mil hectares no país (uma área semelhante à do distrito da Guarda). |
O susto de 2021 levou a Finlândia a começar a preparar-se para um futuro em que os incêndios florestais poderão tornar-se mais comuns. No ano seguinte, um contingente de bombeiros finlandeses esteve na Grécia ao abrigo do Mecanismo de Proteção Civil da União Europeia durante a época dos incêndios: o objetivo era ajudar os bombeiros gregos no combate aos fogos, mas também aprender com os profissionais de um dos países da Europa mais afetados pelo drama dos incêndios. |
Este ano, um grupo de bombeiros finlandeses esteve em Portugal com a mesma missão. “O principal objetivo é, naturalmente, apoiar as autoridades portuguesas”, explicou à Lusa um responsável do Ministério da Administração Interna da Finlândia. Mas a ideia é também que a presença dos bombeiros finlandeses em Portugal este verão seja “uma oportunidade de aprendizagem”. |
“Queria trazer a equipa para Portugal, porque sabia que as táticas e as técnicas [de combate aos fogos] estão muito bem desenvolvidas”, disse ainda. “Queremos estar preparados e queremos aprender com países que têm experiência.” |
Quando, em 2022, o realizador finlandês John Webster leu num jornal que o seu país ia enviar uma delegação de bombeiros para a Grécia, começou a interessar-se por esta previsível consequência das alterações climáticas. Agora, Webster encontra-se em Portugal a realizar um documentário sobre os incêndios e o aquecimento global, com o objetivo de mostrar aos espectadores finlandeses a realidade de um país gravemente afetado pelos fogos florestais. |
“Setenta e cinco por cento da Finlândia está coberta por floresta, mas até agora o maior incêndio que registámos consumiu pouco mais de 200 hectares. A razão pela qual estão a formar esta unidade especial [finlandesa] é que, com as alterações climáticas, esperamos ter grandes fogos florestais no futuro” diz Webster. “Estas filmagens estão a ser feitas em Portugal porque Portugal está muito avançado nas alterações climáticas e os bombeiros portugueses são bastantes experientes e têm muito para ensinar aos outros.” |
O documentário Burnt Land (ou “Terra Queimada”, em português), produzido numa parceria luso-finlandesa, deverá estrear-se em 2025. |