Nos últimos anos os partidos de ambos os extremos do espectro político europeu têm dominado a arena política, e as ideologias nacionalistas têm monopolizado cada vez mais os debates a nível interno nos países membro da União Europeia. Uma das causas deste cenário, é a falta de diapasão entre as políticas públicas de austeridade, “obsessivamente” defendidas pelas instituições europeias, e os reais problemas que o cidadão europeu enfrenta no seu quotidiano. Esta sensação de inversão de prioridades tem exacerbado o sentimento de desconfiança do povo em relação às elites políticas. Para a juventude, tem-se multiplicado o medo de estar vivendo o prelúdio de uma Europa sem horizonte, deixando-a imersa num presente repleto de incertezas – o que faz do velho continente, um ambiente propício para o florescer dos extremos, pois, medo e incertezas, são ingredientes sine qua non para a canja populista.

Este fenómeno não é apenas um reflexo de mudanças políticas, mas também de crises sociais e migrações em massa, que têm asfixiado a esperança colectiva de uma juventude europeia cada vez mais depressiva, e que também têm aumentado a polarização política de uma comunidade cada vez mais refém do seu modelo de integração.

As sucessivas recessões económicas tiveram um impacto profundo nas economias europeias, resultando em altos índices de desemprego, uma desaceleração da produção interna, e um consequente aumento da dívida pública. Este contexto económico obrigou os governos a adoptar políticas de austeridade, visando realizar um ajuste fiscal, preferencialmente com cortes de gastos públicos em detrimento de aumento de impostos. Tais condições económicas adversas criaram um terreno fértil para a ascensão de partidos de extrema direita, que frequentemente culpam os imigrantes pela falta de empregos e pela pressão sobre os serviços sociais.

Por outro lado, a globalização e a crescente interconexão mundial têm levado a mudanças culturais rápidas, e esta transformação do mundo em uma aldeia global, para alguns grupos sociais, é percebida como uma ameaça à identidade nacional. Este sentimento de perda de identidade, é baseado na incapacidade das instituições europeias de materializar a essência do Sonho de Schuman. Este sentimento é também fruto da percepção de que, em grande parte, o elevado número de imigrantes que todos os dias atravessam as fronteiras europeias, tem contribuido para a  redefinição da noção de nação, que muitos julgam ser a mais assertiva para os países membro da União Europeia.

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A França de Bardella… e Mélenchon

“Hecatombe política” parece-me ser o conceito que melhor define a atualidade de um sistema político que, segundo Emmanuel Macron, “ama a liderança mas quer matar seus líderes”. Os resultados das últimas eleições, simbolizam, mais do que uma derrota eleitoral para o partido no poder, um acto de clarificação e de rejeição total das políticas do governo de Gabriel Attal, o mais jovem primeiro-ministro da quinta república francesa.

França, país onde o macronismo é fruto de uma fração da velha tradição política entre jacobinos e girondinos, talvez este concubinato das elites políticas de esquerda e direita seja a razão pela qual a França, desde os tempos da mais famosa revolução do Ocidente, ainda é uma nação de gauleses refratários à mudança.

Para muitos, Emmanuel Macron é o Mozart das Finanças que não conseguiu fazer do neoliberalismo a ideologia triunfante no continente berço da cultura ocidental. Fundador do partido centrista, En Marche, a quando da sua primeira eleição em 2017, no discurso de Louvre, o presidente mais jovem desde Napoleão prometeu fazer de tudo para que no término do seu mandato os eleitores franceses não tivessem mais motivos para votar em extremos. Passados sete anos, e quase metade do segundo mandato já consumado, os dois maiores partidos de ambos os extremos estão à porta do poder, e carregam na bagagem programas políticos que, uma vez implementados, podem transformar a sétima maior economia mundial em uma miragem de justiça social.

Considerado como o Meteoro da política francesa – dada a sua rápida ascensão nos corredores de Champs-Élysées – a quintessência do poder político da nação dos direitos humanos, porém, com uma Constituição que faz do presidente um quase monarca republicano, Macron não apenas não  conseguiu consolidar o centro, como a sua personalidade jupiteriana acentua cada vez mais a clivagem social no país, fazendo com que semanas depois das eleições legislativas que sucederam à derrota dos macronistas nas eleições europeias, o país ainda não tenha um novo primeiro-ministro. E enquanto Paris acolhe os  Jogos Olímpicos, o primeiro-ministro cessante, Gabriel Attal, continuará a gerir os assuntos quotidianos.

Pela primeira vez na quinta república francesa, por algumas semanas, pairou no ar a hipótese de Matignon – sede do governo francês – ter como inquilino, um primeiro-ministro de 28 anos, vindo da extrema direita. Hipótese esta que, por algum momento, pareceu muito provável… e para muitos a mais viável.

Assim como os naipes de cordas carregam a melodia principal da Sinfonia, se Jordan Bardella chegar a Matignon, pode tornar-se no expoente da consonância na onda de expansão social dos extremos que, cada vez mais, emergem no cenário político europeu, e ameaçam pôr fim ao Sonho de Schuman, o de uma Europa unida, solidária, e acima de tudo, vanguarda dos valores universais.