Na minha terra conta-se a história de um senhor que foi tentar melhor sorte para a capital e proferiu a frase do título, convicto que a ida para Lisboa o distanciaria do país que o viu nascer. A história que se conta, com tom de graçola, tem muito de verdade. Na época, ir para Lisboa era como ir para o estrangeiro. Deixar a aldeia pequena e perdida no meio do interior onde só havia uma televisão, no café, e poucas ou nenhumas oportunidades de emprego, era um salto tão grande que parecia que se mudava de país.

Lisboa, que só para que conste, não é no papel a capital oficial do país, tornou-se um epicentro num país pequeno, com 308 municípios e 3092 freguesias.

Quando se fala em descentralizar, fala-se em transferir poderes do estado central para as autarquias. Fala-se timidamente e, muitas vezes, no âmbito de atos eleitorais, especialmente em autárquicas onde todos os eleitores contam.

Claro está, que quando se fala em descentralizar tem, obrigatoriamente, de se encetar um processo. Não é algo que se faça com um ato legislativo.

Esta centralização é, em primeiro lugar, um problema cultural e histórico. Antes da idade média já estavam fixas as nossas fronteiras, e a capital defenida há séculos. Tudo isso determinou um país muito concentrado no seu estado central e isso tem, desde logo, efeitos negativos na equidade de representação política sobre o desenvolvimento do país.

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Será este um modelo que faz sentido no século XXI?

Digamos que é um tema pouco querido pela classe política. Faz parte daquele lote de políticas de longo prazo que não dão votos no imediato. O burburinho que se gerou sobre a mudança do Tribunal Constitucional para Coimbra é sinónimo do quão inconveniente é tomar este tipo de medidas.

Já estávamos em setembro de 2021 quando se percebeu que o governo de António Costa tinha deixado derrapar a meta da descentralização, o programa que foi a votos dizia: “aprovar até junho de 2021 as novas competências autárquicas”. Ora, quem foi eleito em outubro de 2021 não conheceu ainda essas ditas novas competências.

Fará sentido igualar competências nos diferentes municípios? Não será benéfico tratar de forma diferente o que é diferente? Cada município tem as suas especificidades, não só culturais, como económicas e sociais. Claro que há pontos de convergência. Porém, também há competências que servem melhor determinados pontos do país do que outros.

Sabe-se que o poder local é complexo intricado e pouco eficaz. Precisa-se de uma reforma na sua forma operacional. Veja-se que nós votamos em três boletins para as autárquicas (Camara Municipal, Assembleia Municipal e Assembleia de Freguesia). Tornar mais ágil e mais autónomo o poder local é, talvez mais perene e mais eficaz que mudar um edifício do terreiro do paço para um outro município.

São os autarcas quem conhece as suas gentes, os seus territórios. Há medidas que se tomam no estado central que não se adequam a todo o país, pequenas adaptações das mesmas criariam um fosso menor.

Quem conhece as florestas do país? Não é o poder central é o poder local.

Quem conhece as necessidades dos idosos? Não é o poder central, que lê relatórios. É o poder local que conhece o nome, o rosto e as causas da solidão…

Quem sabe quais são os problemas da escola do município? É o poder local.

Depois de uma pandemia onde todos deixamos “ir a Lisboa reunir” não haverá coragem política para avançar com este tópico? Tratar da desertificação não é dar 500 euros pelo nascimento de uma criança no interior é potencializar as mais valias desse local, para que haja um futuro, e não apenas um presente. Precisamos que a Assembleia trate deste tema o mais rápido possível, pois Portugal não é apenas Lisboa.