Sente-se que as birras parecem ser “o assunto” do momento para a maioria dos pais. Não sendo clara, para eles, a forma certa de as gerirem. Reconhecem que “já tentaram tudo”. Saltam de livro em livro, procurando “a fórmula” adequada para lhes fazerem frente. Consultam redes sociais. Seguem mentores e influenciadores. E, nos últimos dias, vimos até uma mãe falar da forma como as resolvia submergindo uma filha (!).

Mas, afinal, o que é uma birra?

Um “erupção” de fúria.

É mau ter birras?

Não; é bom. As crianças só têm birras quando não têm medo da reacção dos pais. Pais assustadores “incentivam” as crianças a ser exemplares. País fragilíssimos “convidam-nas” a não reagir.

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As crianças fazem birras junto de toda a gente?

Não! Só ao pé de quem podem. De quem tem uma paciência interminável. De quem vacila numa birra. De quem se irrita muito facilmente. Ou de quem fica muito assustado, sem saber o que fazer. Mas sempre junto de pessoas da sua máxima confiança.

Birras são sinónimo de “mau feitio”?

Sim… No momento da birra, claro. E no ping-pong de argumentos antes dela “explodir”. Depois de acontecer funciona, num primeiro momento, como um vómito. É impossível pará-lo. Após atingir o pico da gritaria, o choro muda e torna-se de desamparo. Espera que os pais não se assustem com ela ou não decidam “entrar na birra”, fazendo uma maior. E sejam capazes de a parar.

Há uma fase das birras?

Não. Por mais que, por volta dos 2 anos, as crianças pareçam estar nessa “fase”. Porque até aí um criança vai ganhando protagonismo na vida dos pais. Vai-se tornando mais sedutora, mais persuasiva e mais impositiva. E, numa determinada altura, já muito egocêntrica, quando se sente contrariada, e  percebe que não controla os pais, “explode” de raiva.

As birras podem ter formatos diferentes?

Sim. Há birras para fora, que são as mais comuns. Por vezes, acompanhadas de fúrias passageiras, bater de pés e comportamentos agressivos. Birras para dentro, que são os amuos. Birras de silêncio, feitas de atitudes desafiadoras. Birras com espasmos de soluço. Etc.

Porque é que os irmãos são diferentes com as birras?

Porque nunca somos tão iguais com o formato dos nossos nãos como imaginamos com todos os nossos filhos.

Birra é sinónimo de criança à beira dum ataque de nervos?

Mais ou menos. As crianças descritas como “muito nervosas” são “agitadotas” porque sentem que, por falta de regras coerentes e constantes, os pais, hoje, dizem um não ao fim de 9 protestos. Amanhã, ao fim de 20. A seguir, de um ou de dois. Como os pais são animais de sangue quente, quando contam até 100 até se conseguirem zangar, são confusos na forma como dizem os nãos. Hoje, o não é uma coisa. Amanhã, é outra. Os nãos da mãe, do pai e da avó não coincidem. E, para mais, depois de varrerem a sua irritação para baixo do tapete, quando, finalmente, se zangam, os pais fazem-no de forma exagerada e desproporcionada em relação à “porcariazinha” que a desencadeou. E fica tudo ainda mais confuso.

Como se gere uma birra?

Nunca, gastando muito português, num tom doce e compreensivo, porque isso ainda irrita mais uma criança. Poucas vezes, mandando-a para o quarto pensar, porque é como se a castigássemos com um paraíso fiscal. Nem sequer presumindo que ela é muito nervosa e deitando as mãos à cabeça como se não houvesse nada a fazer. E muito menos entrando na birra, fazendo uma maior.

Podemo-nos zangar quando um filho está “com a birra”?

Devemos. Ele precisa de ter só um bocadinho de medo do olhar dos pais porque isso funciona como um semáforo vermelho: “Ele ama-me, mas não deixa que lhe dê uma “canelada” quando me irrito!” Se bem que não adianta que se zanguem diante duma birra e em relação a tudo o resto os pais deixem que uma criança dê um jeitinho muito próprio às regras que lhe pedem. Primeiro, têm regras e limites. Depois, assumem-nas, mais ou menos em “piloto automático”. Finalmente, irritam-se e protestam sem ser preciso fazer birras. Muito menos em formato “XXL”.

Uma vez birrenta, birrenta para sempre?

Nunca! Depois dos pais porem as regras “no lugar” as irritações, as fúrias e as birras esmorecem. Rapidamente. As crianças continuam vivas. Alegres. Mas sem ameaçarem que, a qualquer momento, falar pressupõe ferver em pouca água.

Porque é que, então, as crianças parecem, hoje, fazer tantas birras?

Porque à conta do  medo que têm de ser autoritários, os pais hesitam tanta na sua autoridade que se assustam muito com elas.

Há, hoje, mais birras?

Não. Há menos crianças. E há mais “soluções fáceis” que lhes são apresentadas. O que faz com que a insegurança dos pais tenha mais pressão e menos oportunidades para se resolver.

As birras são um mito urbano?

Não são um mito. Nem são urbanas. São, aliás, muito reais e muito democráticas. Mas é um bocadinho mito urbano esta ideia que as crianças são muito difíceis. Sobretudo quando fazem birras. Por mais que por trás de uma criança difícil estejam sempre pais em dificuldades. E isso vale para todos.