Temos assistido, nos últimos tempos, a crises graves, no nosso pequeno País. Umas de dimensão política, como a decisão alegadamente mundana sobre a localização de um novo aeroporto em Lisboa; outras económicas, como o aumento da inflação e das taxas de juro dos empréstimos bancários, que afetam a vida de todos os portugueses, com particular gravidade naqueles que se encontram em situação financeira mais precária; umas fiscais, como o peso enorme dos impostos, que se sente diariamente no bolso de muitos portugueses; outras mais sociais, como a crise das urgências hospitalares, da alegada falta de capacidade de resposta da emergência médica pré-hospitalar e o anunciado aumento da mortalidade em Portugal, comparativamente ao período pré-pandemia e em relação ao outros países europeus. E agora os incêndios florestais, uma vez mais, devastadores.

O custo, de qualquer uma destas crises é, mais ou menos diretamente, humano. Perdem-se empregos, casas, colheitas, fecham-se empresas, aumenta a fome e a miséria e… morre-se.

Mas parece que qualquer um destas crises, e das suas consequências, importa pouco. Não se vai ao fundo da questão. Não se analisam as causas, não se tiram lições futuras. E tudo começa porque não se assume qualquer responsabilidade. Nega-se, cria-se uma comissão ou abre-se um inquérito. Em qualquer dos casos, sem nenhum resultado concreto. E encerra-se assim o assunto. Num aparente embotamento afetivo que contagia a própria comunicação social, e assim alastra por toda a sociedade, que perde o interesse momentâneo que teve ou que lhe foi transmitido, e segue para outro, mais recente, igualmente efémero…

 A crise na Saúde é disto um exemplo paradigmático. As urgências de diferentes especialidades continuam a encerrar (ou a abrir?) intermitentemente, obrigando os doentes (urgentes e emergentes) a deslocarem-se por distâncias maiores, com eventuais consequências para a sua situação clínica. Foram anunciadas duas ou três medidas para resolver este assunto (nomeação de uma comissão e publicação de um decreto-lei que permitia contratações e aumentava o valor das horas extraordinárias dos médicos). Resultou? Qual foi a causa da crise? Há alguém responsável? Como se pode evitar no próximo ano? Já não interessa…

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Aparentemente Portugal tem tido um excesso de mortalidade nos últimos meses, comparativamente com o que seria expectável, por comparação com outros anos e tendo um pior desempenho que os outros países europeus. Porquê? O que falhou? Como se pode evitar? Talvez ainda mais importante: quem está a morrer a mais do que seria suposto? Estará o sistema a negligenciar grupos específicos de cidadãos? É obrigatório interrogarmos se serão ou não os mais frágeis e vulneráveis que estão a morrer mais do que seria expectável…. Serão os idosos? Serão os socialmente mais desfavorecidos, com menores rendimentos, que apenas dependem da assistência social e dum SNS em dificuldades? Quem está a morrer e porquê? Não haveria nada que pudesse ter sido feito para evitar estas mortes? O que falhou? Quem é responsável? Como poderemos evitar que isto continue ou se agrave? Já pouco ou nada interessa… o País está a arder…

Reparem, se são, efetivamente, os mais frágeis e vulneráveis da nossa sociedade que estão a contribuir para este excesso de mortalidade, é todo um sistema que está a falhar… É, também, uma opção ideológica dogmática de “apostar tudo” no SNS que poderá estar, eventualmente, em causa… E se se comprovar que são estes, os que o “Estado-Providência” se comprometeu a “salvar”, que estão a ficar para trás, os mais desfavorecidos, é, aparentemente, toda uma politica que está errada, com consequências que não nos poderão deixar indiferentes.

É fundamental ter essa informação (e outras) mais detalhada.

É exigível que se apurem eventuais responsabilidades, nos diferentes níveis.

Não podemos continuar a fazer “zapping” em assuntos desta gravidade.

Não podemos deixar-nos embrutecer emocionalmente, tornando-nos insensíveis ou indiferentes para com o nosso próximo, ainda por cima quando esse nosso semelhante é um ser humano frágil e vulnerável. É obrigatório tudo fazermos e tudo exigirmos que seja feito, para os proteger.

Urge recuperar a sensibilidade social. Urge centrar a preocupação da sociedade no bem-comum.