Gostaria de abordar o conceito de bem-estar animal sobre o qual não vi nunca nada escrito, nem nenhum protesto o que não deixa de ser estranho, ou talvez não… refiro-me ao bem-estar dos milhões de animais de companhia que vivem nas grandes cidades. Tenho a noção do politicamente incorrecto do que vou escrever, mas como não tenho ambições políticas e creio ter idade para manifestar a minha opinião livremente, faço-o usando da pouca liberdade que ainda vamos tendo neste país.

Começo por aclarar que, embora considere que os piores maus tratos em animais são aqueles que acontecem nas grandes cidades com os animais de companhia, nunca me passaria pela cabeça querer proibir fosse o que fosse.

O aumento de animais de companhia nos lares dos países ocidentais foi de 21% desde 2005. Para 2021, o planeta dedicará cerca de 20% dos seus recursos para cobrir as necessidades dos animais de companhia. Estamos a falar de mais de 30 mil milhões de euros no negócio na Europa. Com estes recursos cobrir-se-iam as necessidades e carência sanitárias e de alimentação para paliar as necessidades do ser humano no chamado Terceiro Mundo. Podia continuar com inúmeros registos absolutamente assustadores, mas nem vou por aí.

Os animais de companhia sempre foram, isso mesmo, de companhia e uma realidade bastante salutar, diria mesmo necessária, numa sociedade contemporânea em que cada vez as pessoas vivem mais isoladas e podem sentir um conforto muito útil nessa companhia.

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O que irei descrever a seguir não é de nenhuma maneira dirigido aos cidadãos que têm animais de companhia e respeitam as várias opções de relacionamento homem/animal e, obviamente, mesmo não gostando das touradas, as respeitam como parte da cultura portuguesa. Dirijo-me sim, àqueles que vociferam contra as touradas e depois levam o seu animal de estimação pela trela para, “comodamente”, o instalarem nos seus 70 metros quadrados (encarcerados).

Mas esta antropomorfização sistemática dos animais está em franca oposição com a tourada que, pelo contrário, se baseia no respeito da animalidade do toiro.

Aconteceu um processo de homologação assombroso. Parece, que se não se tem um cão e não se cumprem as pautas sociais caninas que imperam, já não se é cool.

O excelente escritor Carlos Ruíz Villasuso afirma que a adoração pelos animais de companhia não é uma simples moda. É mais um sintoma do mal-estar da nossa cultura: o cão permite uma relação sem riscos, onde o “outro” não nos pode prejudicar moralmente, nem exerce uma liberdade que não se controla.

O cão dá-nos afecto sem complicações, sem o tecido dramático próprio das relações humanas. É a solução perfeita para esta crise antropológica que vivemos. O cão é o perfeito interlocutor light num mundo de ideais light. Acreditamos que nos dá o que já não encontramos nas pessoas. É um sucedâneo de humanidade bastante simpático e confortável.

Atenção, pessoalmente sinto uma grande simpatia por cães e sempre os tratei com ternura e afecto. Quem me conhece sabe que os tenho e como os trato: sempre em liberdade; mas considero que nem o cão está concebido para completar o ser humano, nem o nosso coração está feito para conformar-se com um fiel animal. Pelo menos o meu (coração).

Se um animal de companhia e o ser humano devem ser iguais em tudo, se há gente que tenta e trabalha para conceder-lhes direitos civis como quer determinado partido, se não deve haver diferenças entre ambos… não é um contrassentido decidir, como ser superior, castrar um cão? Se somos iguais e não deve haver descriminação por razão de espécie, afinal quem dota de autoridade moral um ser humano para decidir castrar outro ser vivo?! Acaso a castração massiva de milhões de gatos, gatas, cães, cadelas e outros animais de companhia que existem, não supõe um acto de mando e superioridade do ser humano frente às raças animais? Claro que é. Um ser humano dono de um animal de companhia decide o que ele come, onde, como, quando e onde caga, mija, passeia, onde pode cheirar outro animal semelhante e … além de tudo isso, decide que jamais irá reproduzir-se em toda a sua existência! E isso não é maltratar?

O que chamam interactividade não passa de uma imoralidade, que consiste em perverter uma linguagem no intuito de convencer os cidadãos que algo que é reprovável moral e humanamente, não só não é perverso, mas que ainda por cima beneficia o animal e é pelo seu bem-estar! Para evitar condutas indesejáveis!!  Francamente!

A esta situação ainda se acrescenta o mau estar de um animal que só irá à rua fazer as suas necessidades fisiológicas à hora que o seu dono(a) possa fazê-lo, ou lhe apeteça fazê-lo e, ainda por cima, preso por uma trela! Esse é um problema que os toiros bravos seguramente não têm. Julgo que um cão de cidade é um ser novo: um animal desenhado através de uma manipulação genética/clínica. Não penso, é que é mesmo assim! Objectivamente, é assim! Não creio que os naturistas, biólogos ou ecologistas cientistas possam afirmar o contrário. Objectivamente, castrar massivamente é um atentado massivo contra o equilíbrio natural do planeta, uma rutura com o natural e com a natureza nas relações entre as espécies. A minha ética reprova esse acto massivo. Mas atenção, jamais tentaria impor, ou legislar, ou proibir esses actos pela minha visão ética particular, ou por uma visão natural dos animais.

E é por tudo isto, que considero vergonhoso, imoral, obsceno, bárbaro e sectário sentir, observar que aqueles que defendem esta evidência de mau trato, aqueles que actuam como amos de uns seres vivos que jamais viverão como lhes dita a sua espécie ou raça, escondam a sua imoralidade e anti-naturalismo, acusando as tauromaquias de mau trato animal.

A esses, aconselho que quando pensem vociferar contra as touradas, que respirem fundo três vezes, metam a mão na consciência e nos deixem em paz.

O toiro bravo não pensa, mas dá que pensar… aqui desde o campo, neste confinamento que está de moda, reforçado com outro confinamento de uma intervenção cirúrgica, pensei muito e vieram-me à cabeça outros pensamentos sobre esta sociedade que necessita urgentemente de uma transfusão verdadeira, um “chuto” de realidade, uma dose dupla de rebeldia. Aqui a erva só é erva se há água, se chove, sim quando chove que é, segundo vaticinam os noticiários de todos os meios de comunicação, quando “vem aí o mau tempo, vem aí a chuva!!” Num país em que se mede a excelência do tempo pela possibilidade de pormos os corpos ao sol, mas que no Verão se consome em chamas! Que asco, que bando de trogloditas! Uma sociedade em que esconder a morte é melhorar a vida; esconder o sangue é esconder a ferida! Fizemos um país sombra. País de silêncio de borregos. De cidades em que não nos olhamos olhos nos olhos! De cidades em que os pássaros estão enjaulados. Aqui, no campo, somos parentes e netos de avôs que sentiram as chuvas e as geadas nos ossos e das avós que amassaram o pão com as suas mãos gretadas e rudes.

Muitos dos partidários da proibição das touradas, pedem-na pelo simples prazer de proibir prazeres alheios. “Parecem padres do antigamente…” Imbecis!