O Ensino Universitário desempenha um papel fundamental no desenvolvimento de um País. Primeiro, porque forma a elite política, económica e cultural de um país. Segundo, porque forma o conhecimento e os cientistas que fazem a investigação e desenvolvimento. Terceiro, porque é a que cria e dinamiza todo o processo de desenvolvimento do sistema de ensino e do capital humano. Existe me Portugal pouco conhecimento de como se classificam as universidades portuguesas no contexto internacional. Como se classificam de uma forma agregada, ou seja, como centros de ensino, apoio à investigação, criação de conhecimento e de impacto na sociedade e economia. E, quais as áreas em que excele a nível nacional e mundial. Este conhecimento deve servir de base à definição de políticas de educação a nível do ensino superior.

Existe mais de uma dezena de rankings das universidades, e que muitas vezes são manipulados pelas instituições para atrair alunos ou professores, conforme a sua conveniência. Vamos utilizar duas das fontes mais importantes para o estudo desta matéria, que são o Times Higher Education (THE) e a Academic Ranking World Universities (ARWU) da Universidade de Shangai (Shangai). Também queremos frisar que o contexto da nossa análise é o mundial, e não o Europeu ou qualquer outro agrupamento geo-político. Como veremos, no ranking do Times, Portugal não tem nenhuma universidade nos primeiros 350 lugares a nível mundial, tendo havido uma deterioração generalizada entre 2012 e 2022, à exceção da Universidade Católica Portuguesa. Depois desta está a Universidade do Porto. Uma análise por departamentos/faculdades identifica que vários conseguem estar entre os lugares 151 e 250, a nível mundial. Os piores vetores são a qualidade de ensino e da investigação e o melhor a internacionalização. Na classificação de Shangai as universidades do Porto e de Lisboa são as mais bem classificadas no grupo entre 201-300, tendo o Porto passado à frente de Lisboa entre 2019 e 2022. Por área, o ranking atribui as melhores classificações à engenharia civil e química em diversas universidades, gestão à Nova e medicina ao Porto.

Depois de analisarmos estes dois rankings, veremos um estudo recente sobre a validade estatística de rankings feito pela Universidade de Chicago, do qual resulta o último lugar para Lisboa, entre 150 universidades. A secção 4 faz uma extrapolação simples do ranking das universidades para a qualidade do ensino superior por país, que colocam a Suíça e Suécia no topo e Portugal em 20º lugar entre 42 países. Não existem testes tipo PISA para indivíduos ao nível do ensino universitário, pelo que a secção 5 utiliza uma base de dados pouco explorada em que se avaliam os alunos universitários de diferentes países à entrada nas pós-graduações nas universidades americanas. Como veremos, os alunos portugueses têm tido uma boa performance. A secção 6 conclui.

1 Ranking do Times Higher EducationWorld University

Os rankings da Times Higher Education World University avaliam a performance dual do ensino-investigação das universidades nas suas principais missões: ensino (30%), investigação (30%), citações (30%), abertura internacional (7,5%) e transferência de conhecimentos (2,5%), utilizando 13 indicadores. Estes indicadores referem-se a cada área: ensino (ambiente de aprendizagem), investigação (volume, rendimento e reputação), citações (influência da investigação) abertura internacional (em termos de alunos, professores e investigação) e receitas da sua produção, medido pelo rendimento captado pela instituição em consultadoria, patentes e outros.

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Portugal não tem uma única universidade entre as 350 melhores do mundo, segundo o Times Higher Education Rankings de 2022/2023. A Universidade portuguesa mais bem qualificada neste ranking é a Universidade Católica Portuguesa no grupo das 351-400, seguida pela Universidade do Porto (no grupo das 401-500) e depois pela Universidade de Lisboa (no grupo das 501-600). No total tem 9 universidades nas top 1000 (Figura 1).

Por áreas de especialização, alguns departamentos/faculdades conseguem estar classificados entre as 250 melhores a nível mundial: Medicina na Católica, Direito nas Universidades de Coimbra, Lisboa e Nova de Lisboa; Economia e Gestão na Nova de Lisboa; Artes e Humanidades em Lisboa e na Nova e Educação em Lisboa, Nova e Porto.

Figura 1

O Times Higher Education faz o ranking das diferentes dimensões de avaliação das universidades, numa escala de 0 a 100 (melhor). Analisando estas dimensões para as universidades portuguesas (Figura 2) verificamos que de todas, a dimensão em que pior se classificam é na qualidade do ensino. A dimensão de investigação e citações também é insatisfatória, sendo Lisboa a melhor em investigação e a Católica em citações. Já em termos das receitas próprias, os melhores lugares são alcançados pelo Minho e Nova. Finalmente, em termos de internacionalização, onde todas as universidades têm um score superior a 50, está à frente a Nova.

Figura 2

Fonte: ver Figura 1

2 Ranking da Universidade de Shangai

Nesta metodologia, a investigação é medida pelas publicações em revistas líderes da especialidade. A qualidade do corpo docente, é medida pelo número de professores e de alumni que receberam os prémios Nobel e medalhas Field e pelo número de citações das publicações dos professores. Cada parte vale metade.

Segundo os rankings da Universidade de Shangai de 2022, as melhores classificadas são as Universidades do Porto e de Lisboa no grupo das posições 201-300 (Figura 3), tendo o Porto subido de grupo em relação a 2019, e Lisboa baixado de grupo. Aveiro e Minho estão no grupo das posições 401-500, tendo a primeira subido de grupo e a segunda mantido a posição. A Nova baixou de grupo estando agora no grupo 501-600, a mesma posição que Coimbra, que manteve a posição em relação a 2019.

As especialidades com classificação no grupo dos top 200 são: engenharia civil no Porto, Lisboa (posição 43º), Minho e Coimbra; engenharia química no Porto, Lisboa e Aveiro; engenharia bioquímica no Porto e Minho; engenharia elétrica em Lisboa; matemática e física em Lisboa bem como engenharia mecânica; economia e gestão na Nova e medicina no Porto.

Figura 3

Algumas áreas estão no top 100: ciências e tecnologias da alimentação no Porto na 15ª posição e no Minho, engenharia dos oceanos em Lisboa na 6ª posição e engenharia civil na 43ª posição na mesma Universidade, Finanças na Nova e engenharia das telecomunicações em Aveiro.

Nos rankings QS, que não são aqui analisados, mas que têm especial informação no que respeita a especialidade, os resultados para 2022 aproximam-se do que já referimos. Para engenharia e tecnologia em geral, o Porto está na 195ª posição e Lisboa na 206ª. Em medicina o Porto está no grupo 151-200 e Lisboa, Coimbra e Nova no grupo 251-300. Em gestão a Nova está na 146ª posição e em economia na 111ª posição. Em informática Lisboa está no grupo 151-200.

3 Evolução dos rankings ao longo do tempo

São relativamente recentes os rankings das universidades portuguesas, mas é interessante analisar como têm evoluído. A Figura 4 mostra os rankings para o período 2016-2023 do Times. Os dados mostram algumas variações anómalas, como a Nova que tem uma melhoria espetacular entre 2020 e 2021 e depois regressa ao valor anterior, ou a Católica que passa de 700 para 350 entre 2019 e 2020, situando-se depois na frente das universidades portuguesas.

Figura 4

Fonte: ver Figura 1

Calculando uma média das classificações das universidades, verificamos (Figura 5) uma deterioração da sua qualidade. (A Figura considera o inverso da média para aproximar a qualidade).

Figura 5

Fonte: ver Figura 1 e cálculos do autor

Os rankings de Shangai gabam-se de ser bastante estáveis, o que é confirmado pela Figura 6 onde se apresentam os rankings para o período de 2016 a 2022. As principais alterações nos últimos anos foi a melhoria da Universidade do Porto e a deterioração de Lisboa, que passaram a ter o mesmo ranking. A Universidade de Aveiro registou uma deterioração entre 2018 e 2019, e voltou a melhorar em 2022, evolução semelhante à da Nova.

Figura 6

Fonte: ver Figura 2

A média das universidades (Figura 7) mostra uma forte deterioração da sua qualidade entre 2017 e 2021, seguida duma acentuada melhoria em 2022.

Figura 7

Fonte: ver Figura 2 e cálculos do autor

4 Do ranking das universidades por país para o ranking do ensino universitário do país

Como passar da qualidade das universidades individuais para a qualidade do ensino universitário?

Se considerarmos os países ordenados pelo número de universidades que estão incluídas nas top 500 do ranking de Shangai (dados para 2014), os EUA é, de longe, quem lidera, com 146 posições, seguido da China com 44, Alemanha com 39 e Reino Unido com 38. Se ponderarmos os grupos pela sua posição, mais uma vez os EUA lideram à distância, mas agora é o Reino Unido quem vem em segundo lugar, seguido pela Alemanha e depois pela China. É importante referir que a China tem tido uma ascensão rápida em todos os rankings, pelo que dados mais atuais poderão colocar já este país em segunda posição.

Esta agregação permite-nos fazer o mapeamento do ranking das universidades para a qualidade do ensino superior por país. A Figura 9 mostra os países ordenados pelo número de universidades no top 500, em que se pondera de 30 (top 20) a 5 (grupo 400 a 500) os grupos em que se encontram. Conforme podemos observar, os EUA têm o ensino universitário de melhor nível mundial, seguidos do Reino Unido, Alemanha e China. Portugal encontra-se na 28ª posição nos 42 países considerados.

Figura 9

Legenda: Soma do número de universidades em cada grupo de 20, 100, 200, 300, 400 e 500, com pesos de 30 a 5.

Mas neste ordenamento, quanto maior é o país maior será o número possível de universidades, pelo que nos parece razoável fazer a normalização daquele índice pela população. Os resultados encontram-se na Figura 10, que colocam a Suíça e Suécia no topo e Portugal em 20º lugar entre os 42 países. Os EUA descem para a 14ª posição e o Reino Unido para o 9º lugar.

Figura 10

Fonte: Universidade de Shangai, 2014 e cálculos do autor

Este gráfico tem implicações muito importantes em termos geo-políticos. Primeiro, a União Europeia, considerada no seu conjunto, tem uma posição mais importante do que a simples análise por países e número de universidades conferiria. A China já tem uma posição de liderança entre os países em vias de desenvolvimento e aproxima-se de alguns países desenvolvidos, sobretudo se considerarmos dados mais recentes. A Rússia está numa posição inferior. Mas o que é dramático é o avanço que a China leva em relação à India que é também dos países mais populosos e com quem concorre geoestrategicamente.

5 Comparação da performance dos estudantes universitários a nível internacional

Não existem testes tipo PISA para alunos ao nível do ensino universitário, pelo que vamos utilizar uma base de dados pouco explorada em que se avaliam os alunos universitários de diferentes países à entrada nas pós-graduações nas universidades americanas. Os testes têm a vantagem de ser estandardizados e são iguais para todos os países, o que lhes conferem um certo nível de comparabilidade. O problema é que não constituem uma amostra aleatória.

A média dos resultados obtidos nas áreas verbal, quantitativa e analítica, para o período de 2014 a 2021, encontram-se na Figura 11.

Figura 11

Estes testes medem as aptidões ao nível do nosso mestrado, que é geralmente o grau que os alunos portugueses atingem, antes de se candidatarem a um curso de mestrado ou doutoramento no estrangeiro. É natural que o grupo de alunos que se candidata a um doutoramento numa universidade americana esteja entre os melhores, mas esta qualificação aplica-se a qualquer país.

Os alunos de países que tiveram melhores resultados forma a Nova Zelândia, Austrália e Reino Unido, seguidos da China e Suíça. Portugal está na 19ª posição, ligeiramente abaixo da média. Um dos problemas que este teste tem é que para os alunos em que o inglês não é a primeira língua, as qualificações obtidas no teste verbal e analítico são em geral inferiores. Este problema é sobretudo notório para os alunos asiáticos. Note-se que os resultados em matemática para os chineses, coreanos, japoneses e turcos estão bastante acima dos obtidos naqueles testes. Para os portugueses e europeus em geral, o desequilíbrio não é tão grave.

Estes resultados confirmam que o ensino universitário português, antes da pós-graduação, está numa posição próxima do obtido nas secções anteriores.

6 Conclusões

Segundo os rankings da Time não temos nenhuma universidade no top 350 a nível mundial, mas com nove universidades no top 1000. Os rankings de Shangai são mais favoráveis, ao colocar as universidades do Porto e Lisboa no top 300, mas apenas seis no top 1000. Comparando em termos agregados por países, e usando os rankings de Shangai, Portugal está no 20º lugar a nível mundial, posição que é confirmada com os resultados dos testes GRE. Esta posição é melhor do que a que Portugal ocupa em termos dos rankings de competitividade (32º a 36ª posição) ou mesmo de PIB per capita (segundo dados do Banco Mundial para 2020 e utilizando o PIB per capita em USD e em PPC, Portugal estava na 39ª posição). Porém, muitos dos países de dimensão média e de rendimento per capita semelhante ao nosso têm pelo menos uma universidade mais bem qualificada que Portugal. Assim, como base de uma política educacional para as próximas duas décadas deveríamos ter pelo menos uma universidade no top 100 a nível mundial.

Apesar desta situação mais rósea dos rankings de Shangai, era importante investigar porque é que o ranking da Times dá uma deterioração significativa dos rankings de quase todas as universidades, e em particular, da Nova. Excluindo a Católica, Porto, Lisboa e Nova, as restantes universidades têm em geral departamentos de baixa qualidade.

Em termos departamentais, assinalamos o baixo nível geral das ciências puras como Matemática, Física e Química, que são a base do conhecimento científico. Também áreas em que o país deve melhorar são a educação e ciências computacionais, por falta de pelo menos um departamento com elevadas classificações em todos os rankings.

Em termos dos vetores de qualificação é de notar uma grande necessidade de melhorar os níveis e métodos do ensino e da investigação, em todas as universidades, bem como as receitas próprias que estão ligadas ao impacto da universidade na economia.

Faltam certas áreas cruciais para o desenvolvimento do país, como uma boa escola de políticas públicas, como Harvard/MIT, Princeton e Columbia têm assim como uma escola de Altos Estudos de Administração Pública.

Um indicador que falta nos rankings anteriores e que é largamente utilizado, por exemplo, no ranking dos cursos de MBAs são as remunerações pós conclusão de estudos obtidos pelos alumni, para os diferentes departamentos das universidades.