Escrevia George Orwell em 1945, no seu livro que em Portugal se intitulou O Triunfo dos Porcos, que “os animais são todos iguais”, a que mais para o final do livro foi acrescentado “mas uns são mais iguais que outros”.

É esta mesma a história da nossa democracia! A estranha história de um país onde em poucos anos se subverteu tudo o que poderia ter levado a um Portugal de sucesso, onde todos pudessem viver dignamente. Mas não, conseguiu-se em poucos anos, muito poucos, transformar uma ditadura de caraterísticas moderadas, numa “democracia” corrupta, brejeira, em que, partindo de leis feitas à medida, se consegue fazer valer como certos e legais os mais condenáveis atos. Com a assinatura de quem os cria, com a conivência de quem deles também espera usufruir e com a complacência e com o medo de quem os aceita naquela de “O que se há-de fazer?! As coisas sempre foram assim…”.

Ainda há dias vi um vídeo em que uma professora mostra uma pasta verde aos alunos presentes na sala e lhes pede para, quando entrasse o próximo aluno atrasado, todos responderem à sua pergunta sobre a cor da pasta dizendo que é vermelha. Todos assim fazem e quando ela finalmente pergunta a cor da pasta ao visado atrasado ele acaba por responder também que a pasta é vermelha… A convicção de alguns, a sua influência, a opinião generalizada, limita-nos e faz com que vamos atrás do que quer que seja e que tudo permitamos. Temos receio de ser diferentes e de por isso sermos postos de lado. Queremos estar na mó de cima e apoiar os fortes na esperança de assim, por contágio, também sermos considerados importantes. Temos medo de perder aquilo que muitas vezes já nem sequer temos. Quem nunca assistiu a uma briga entre cães? O que é que acontece quando outro cão chega ao pé? Toma o partido e vai defender o mais forte, o que está a ganhar! Também nós somos assim, mesmo sendo gente, temos um comportamento perfeitamente comparável.

E isso possibilita que, de forma ardilosa, os que para isso estão motivados, se organizem e pervertam com alguma facilidade o tal sistema a que continuamos a chamar democracia. O tal sistema que Churchill dizia ser “o pior dos regimes, à excepção de todos os outros”.

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Chegámos assim a um estado de coisas – não melhor do que o “estado a que chegámos“ de que falava Salgueiro Maia na noite do 25 de Abril – tão enredado que nos sentimos confusos, de tal modo que por vezes nem conseguimos reagir, por incompreensão. Já nada faz sentido.

Falei de Salgueiro Maia e penso como se sentiria ele se agora visse, mais ainda do que já se passava quando morreu há 30 anos atrás, que o tal “estado a que chegámos” é muito mais intrincado e preocupante do que aquele que ele viveu há quase 50 anos.

Então como se pode exigir que gente que ficou sem nada em resultado da crise de 2008 e anos seguintes, ou até agora com a pandemia e a guerra na Ucrânia, tenha de se desenrascar como quiser e pagar dívidas às Finanças, à Segurança Social, aos Bancos e às financeiras para evitar que corram atrás de si tentando penhorar os bens que há muito se foram ou usurpando o parco ordenado que por vezes já mal chega para os gastos essenciais de cada mês?!

Por tudo isto alguns se fartam e têm atitudes de indignação, protesto e revolta não bem orientadas, assumidas da forma mais fácil ou mais à mão, contribuindo para a rápida propagação de tendências radicais que todos devíamos banir.

Esta minha análise surge agora obviamente em resultado do que se passou ultimamente na TAP e no Governo, mas enquadrar-se-ia perfeitamente e também muito bem noutras situações passadas, recentes e certamente futuras, relacionadas com pessoas individualmente ou com Bancos e outras empresas públicas ou privadas. Fosse este caso único e nem sequer faria sentido estar aqui com tantas considerações e desânimos.

E não está aqui em questão se se trata do partido A ou do partido B, isso é aqui completamente irrelevante. O que está em causa e o que nos deve preocupar é o sistema que está montado e que permite estes casos.

Mas tudo esquecemos e em pouco tempo estaremos de novo prontos para levar com mais uns roubos, umas burlas, com os mesmos ou com outros autores. E assim lá vamos continuando a ser alegremente enganados.