Com uma população de 30 milhões de habitantes e um PIB per capita de 493 dólares, e apesar de todo um manancial de potencialidades, Moçambique é, desde há muito tempo, um país adiado. Com uma extensão de costa de 2500 km, um interior com fauna e flora únicas, um subsolo rico em minério, fosfatos, carvão, ouro, pedras preciosas e uma das maiores reservas de gás natural do mundo, pode ascender, em poucos anos, ao quarto lugar na lista dos maiores exportadores de gás. Dada a urgência da crise climática, e à medida que a União anuncia e negoceia legislação energética sob chapéu do Green Deal, é interessante instituir uma ligação a este, que deve servir também como combustível alternativo na transição energética.

Metade da população vive abaixo do limiar da pobreza, ocupando a nada honrosa posição 180, em 188 países, no Índice de Desenvolvimento Humano. Os seus 800 000 Km2 de superfície constituem um complexo rendilhado de etnias e religiões. A população muçulmana, por exemplo, de maioria sunita, localiza-se a norte, em especial nas províncias de Niassa e Cabo Delgado.

A economia de Moçambique está muito dependente das importações, com forte centralização em Maputo, e das ajudas internacionais. As vias de comunicação são extremamente rudimentares e alvos fáceis de grupos de guerrilha, pelo que o transporte de mercadorias para Centro e Norte do país é demasiado complexo. Os escândalos de corrupção sucedem-se, o que resulta numa intermitência de apoios financeiros de entidades como o Fundo Monetário Internacional, comprometendo a sua credibilidade e a provocando a escassez de divisas estrangeiras como o euro ou o dólar, desvalorizando um metical já de si fraco e sem valor nos mercados internacionais.

No meio de todo este abandono, a Província de Cabo Delgado tem sido alvo de fundamentalistas formados no Sudão, Egipto, Arábia Saudita e Tanzânia, cujas investidas já provocaram milhares de mortos, mais de 700 mil deslocados e 1,3 milhões de pessoas que precisam urgentemente de ajuda para sobreviver. Não estamos perante um conflito de índole meramente religiosa, mas antes de um fenómeno multidimensional que abarca as vertentes económica, social e política.

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Foi com esta realidade que me deparei na recente Missão do Parlamento Europeu a Pemba e Metuge, com a Assembleia Parlamentar Paritária África, Caribe e Pacífico – União Europeia. Uma realidade que não vem nos livros e nenhum relato ou reportagem pode, sequer, descrever um cenário aproximado. Crianças, jovens, homens, mulheres e idosos, deslocados das suas casas, sem segurança, higiene, saúde ou alimentos, sobrevivem dependentes da resiliência das organizações não governamentais e do (ainda) parco trabalho que, com poucos meios, desenvolvem os Governos regionais. Famílias sem capacidade de suprir as necessidades básicas, vítimas colaterais de um conflito até há bem pouco tempo silencioso e sem rosto. A pobreza extrema a 40 km de distância da maior reserva de gás do mundo.

A Europa está agora, e depois de todo um trabalho desenvolvido no Parlamento Europeu, mais atenta a este problema, com medidas de apoio na formação de militares e na ajuda humanitária. Mas estas pessoas esperam muito mais: refeições dignas para os seus filhos, habitação e educação que lhes permita sonhar.

Encurralados neste enclave de interesses, aos moçambicanos deve ser conferida a possibilidade de crescer e maximizar todas as suas potencialidades. Portugal e a União Europeia têm aqui uma inigualável oportunidade – diria até uma obrigação, atentos os princípios no domínio da cooperação para o desenvolvimento que nortearam a constituição da União Europeia — de desenvolver parcerias com Moçambique em áreas como o Turismo, Pescas, Mar e Oceanos e Agricultura. Parcerias que potenciem uma Pesca sustentável, com valorização do produto e devida apropriação do valor acrescentado pelos pescadores locais; um Turismo de qualidade, com mão-de-obra qualificada, com respeito pelo meio-ambiente e inteligente — Moçambique é muito mais que praia –; uma Agricultura que permita a subsistência das comunidades e incremente a exportação de produtos locais. A Europa tem que ajudar a União Africana na concretização de um mercado único africano.

Enquanto Eurodeputados não podemos deixar cair esta causa da agenda europeia. Porque os moçambicanos têm sonhos, compete-nos em cooperação ajudar a desenhar esses mapas de sonhos, para que jovens, crianças e mulheres os possam concretizar.