Dois amores construíram duas cidades, disse o santo de Hipona.
Nós podemos acrescentar que dois liberalismos constroem duas cidades bem distintas.
Temos dois partidos a concorrer a estas eleições que se dizem liberais, e no entanto são muito diferentes.

O Iniciativa Liberal (IL) defende um individualismo absoluto afirmando que “todo o indivíduo tem o direito de dirigir a própria vida”.
E no seu programa político defende “A liberalização na legislação sobre direitos individuais e costumes. Com liberdade de autodeterminação e identidade individual; forte e efetivo combate a todos os tipos de discriminação; a garantia legal da liberdade de decisão sobre o fim da vida; e a legalização da cannabis e regulação da prostituição.”

Isto significa em palavras simples que cada pessoa pode fazer consigo próprio o que entender, mesmo as coisas mais abstrusas.
O indivíduo apresenta-se como senhor absoluto, sem limites para o que se faça dele, desde que consinta.

Sabemos que essa liberdade absoluta é ilusória e autodestrutiva, porque não reconhece os limites que a Natureza impõe ao ser humano.
E termina na prática por escravizar os mais débeis, porque lhes retira protecções legais.
Se se legaliza a prostituição, desprotegem-se mulheres que nunca fariam tal coisa se não estivessem debilitadas económica ou psiquicamente.
Ou se se legaliza a eutanásia, que protecção vão ter os idosos que se tornaram um peso para os familiares
Se não há proteção legal, como se vai evitar que alguém realize uma operação cirúrgica que deforma o seu corpo irremediavelmente, e da qual se pode arrepender pouco depois?

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Por outro lado temos o Aliança, que defende “os princípios e valores do personalismo com o respeito pela vida, pela pessoa e pela sua dignidade”, “a dimensão espiritual da pessoa humana, rejeitando uma visão utilitarista, materialista ou egoísta do ser humano” e “o papel da família enquanto célula estruturante da sociedade”.

O que distingue estes liberalismos são os limites que colocam à liberdade.

O Aliança coloca claros os limites: o respeito pela vida, pela pessoa e pela sua dignidade.
O IL não coloca limites, e a consequência lógica será o atropelo, mais tarde ou mais cedo, da vida, da pessoa e da dignidade de que cada ser humano deveria gozar.

O Aliança assume os limites próprios da Natureza dos seres humanos, nas suas dimensões espiritual e corpórea, membros de uma célula familiar e ao mesmo tempo da Família Humana.
O IL quer que cada um redefina a sua própria natureza, como se estivessemos mal feitos, e a natureza do indivíduo fosse irrelevante para a construção da Sociedade.
Curiosa fé, que acredita que conseguimos refazer-nos melhor do que a Natureza nos fez.

E então o resto?
Não são parecidas as ideias sobre a liberdade económica, poucos impostos, um Estado colocado no seu lugar?
Essas medidas podem ter um enunciado parecido, mas a sua concretização prática depende do conceito que se tem de ser humano.
Num caso tornarão as pessoas mais centradas em si e descuidadas dos outros, a começar pelos mais débeis: será a lei do mais forte.
No outro, a liberdade potenciará a solidariedade e o sentimento de pertença a uma Sociedade que temos de construir juntos, mesmo com os débeis.

Estes dois liberalismos vão construir cidades bem diferentes.

Professor de Física na Universidade do Minho