A política é uma esfera complexa, onde interesses, ideologias e valores se entrelaçam na procura do bem comum. No entanto, a coerência das ações políticas tem sido frequentemente questionada, levando a um dilema que afeta a confiança dos cidadãos nos seus representantes. Não é incomum observar políticos que condenam determinados comportamentos de outros, mas, posteriormente, se aliam a eles se isso lhes convier. Esta aparente incoerência pode minar a integridade do sistema político e alienar os eleitores.

Os cidadãos muitas vezes se sentem-se perplexos diante dessas contradições. Como é possível que políticos que um dia foram considerados personas non gratas na política, possam, de repente, fazer parte da mesma lista? Não me estou a referir a divergência de opiniões ou estratégias, estou a referir-me a situações que arriscam ser consideradas crime. Essa mudança de posição causa desconfiança e ceticismo no eleitorado, levando-os a questionar a sinceridade e a moralidade dos políticos envolvidos.

Alguns políticos argumentam que essa flexibilidade é uma característica fundamental da política, uma habilidade necessária para construir alianças e alcançar objetivos políticos. No entanto, para muitos cidadãos, essa flexibilidade é vista como falta de coerência e princípios. A política, para eles, deveria ser uma arena onde a honestidade e a integridade prevalecessem sobre interesses pessoais ou partidários.

Um exemplo recente dessa falta de coerência pôde ser observado nas eleições para o 41.º congresso do PSD. Em Lisboa, Carlos Moedas liderou uma lista que agregou elementos sob suspeita da justiça devido ao caso “Tutti Frutti” e outros que se apresentavam como combatentes dessas más práticas políticas.

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Mas há vários exemplos dessa falta de coerência e podem ser observados na forma como alguns governantes pretendem normalizar os atos menos lícitos. Por exemplo, quando se recusam a afastar os governantes indiciados de crimes, ou apenas sobre suspeita, respaldando-os com a célebre frase “à justiça o que é da justiça”. Ou, simplesmente, quando se predispõem a constituir ou liderar listas internas dos partidos que agregam elementos sob suspeita da justiça. O problema começa logo na forma pouco criteriosa como se elaboram as listas de candidatos, seja para cargos internos, seja para escrutínio público. Esses comportamentos, em que a busca pelo poder, ou pela manutenção do poder, parece sobrepujar a honestidade e a integridade, levanta questões sobre os valores fundamentais que devem guiar a política. Mas não sou só eu que digo ou penso assim!

O filósofo Michael Sandel argumenta que a política deve ser pautada por princípios éticos sólidos. Ele defende que os políticos não devem sacrificar a ética em nome do pragmatismo político, pois isso mina a confiança do público e enfraquece a democracia. Sandel salienta a importância de os políticos se manterem fiéis aos seus valores e princípios, mesmo quando isso pode ser politicamente inconveniente.

Recuando mais no tempo, Aristóteles, abordou a importância da virtude na política. Para Aristóteles, a virtude é fundamental para a ação política e os líderes devem agir de maneira virtuosa em todas as circunstâncias. Isso implica agir de acordo com a coerência e a integridade, independentemente das conveniências políticas momentâneas.

Ao final do dia, a falta de coerência nas ações políticas tem sérias implicações para a democracia. Quando os cidadãos percebem que os políticos estão dispostos a abandonar os seus princípios na procura do poder, a confiança no sistema político erode-se. Por esse motivo, creio que seja fundamental que os políticos se lembrem de que representam não apenas os seus partidos, mas também os interesses e valores dos cidadãos. A política deve ser clara e inequívoca na condenação de atitudes pouco sérias ou suspeitas, para que a democracia possa prosperar com base na integridade e na honestidade.

Os políticos devem ser exemplos de virtude e ética, colocando os princípios acima da conveniência política. Somente assim a política poderá cumprir o seu papel de promover o bem comum e servir verdadeiramente aos interesses da sociedade.