O Podemos foi uma criação a partir da Universidade Complutense de Madrid, pela mão de Pablo Iglésias, Íñigo Errejón e Juan Carlos Monedero, e que soube cavalgar a onda de descontentamento social que enchia as praças das cidades espanholas, com destaque para a capital. Um partido que aglutinou tendências muito heterogéneas, mas todas assumidamente de esquerda.

Como os principais rostos do Podemos eram fiéis leitores de Ernesto Laclau, a matriz do partido assentou no populismo socioeconómico, que concebe os explorados ou deixados para trás como povo puro e o grande capital, interno e externo, como a elite corrupta.

Que a mensagem inicial colheu junto de uma fatia significativa dos espanhóis não restam dúvidas face aos resultados que o Podemos logrou ao longo de várias eleições gerais, chegando mesmo a alimentar o sonho, nunca alcançado, de ultrapassar o PSOE. Um sucesso que o levaria a fazer parte da ainda vigente coligação governamental e ao qual não foi alheio o protagonismo mediático do seu líder, Pablo Iglésias, que contou com o apoio financeiro de regimes pouco recomendáveis, como o Chavismo venezuelano e o islamismo iraniano.

Um sucesso que, porém, entrou em ocaso, fruto da difícil compatibilização das tendências internas e da luta de egos que levariam ao abandono do partido do número dois, à demissão da direção do número três, com Monedero a acusar o Podemos de estar a fugir às suas origens e a transformar-se naquilo que dizia querer combater, e à substituição de Pablo Iglésias, que cometeu uma espécie de suicídio político quando decidiu candidatar-se a Madrid.

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Por isso, nas mais recentes eleições gerais, realizadas em 23 de julho de 2023, o Podemos concorreu como parte integrante da plataforma Sumar, mas numa condição de inferioridade que apenas lhe permitiu a eleição de 5 dos 31 deputados do projeto liderado por Yolanda Díaz. Um fracasso que não demorou a ter elevados custos internos, a exemplo do que se passou em Portugal, na sequência das eleições que se seguiram ao despiste da geringonça costista, com o partido irmão do Podemos, o Bloco de Esquerda.

Assim, logo no dia seguinte ao ato eleitoral, o Podemos comunicou internamente o encerramento das suas sedes de trabalho em nove comunidades autónomas: Aragão, Astúrias, Baleares, Canárias, Castilla-La Mancha, Cantábria, Galiza, Madrid e Comunidade Valenciana.

Encerramento que faz parte de um Expediente de Regulação de Emprego (ERE) que o Podemos se propõe levar a cabo e que inclui, ainda, o despedimento de cerca de metade dos atuais funcionários do partido, tanto a nível das comunidades, onde serão extintos 45 postos de trabalho, como a nível central, onde o partido conta com cerca de 61 trabalhadores dependentes.

Um processo que o Podemos justifica com a quebra de receitas provenientes da subvenção estatal e as minguadas verbas de que o partido irá beneficiar face ao reduzido número de eleitos, tanto nas eleições gerais, como nas municipais e autonómicas de 28 de maio, sem, no entanto, deixar de garantir às companheiras e companheiros que o partido se irá reorganizar na certeza de que é possível continuar a conquistar novos direitos.

A última frase é mais um exemplo da falta de coerência ideológica do populismo socioeconómico. Na verdade, não se revela fácil falar de novos direitos e, simultaneamente, negar aos seus trabalhadores o direito ao trabalho. Tudo porque um partido que diz ter no capital o seu maior inimigo não pode assumir que, malgrado o seu discurso anticapitalista, se vê obrigado a render-se à lógica de funcionamento do capitalismo.

Afinal, como os espanhóis perceberam, Monedero estava certo quando teve a coragem de assumir a razão que o levava a demitir-se da direção do Podemos.